- Muito dizer nem sempre veicula muito saber.
O que dizemos acerca de Deus diz mais sobre nós do que sobre Deus.
- Como bem frisou Karl Rahner, nem a palavra Deus é adequada para dizer Deus.
Não esqueçamos que a própria palavra Deus é uma criação humana.
- Quando falamos sobre Deus, falamos habitualmente do que os seres humanos têm dito sobre Deus.
Alguém pode garantir que tal dizer sobre Deus corresponde cabalmente ao ser de Deus?
- Sto. Agostinho não alimentava ilusões: «Por mais altos que sejam os voos do pensamento sobre Deus, Ele está sempre mais além».
Por conseguinte, «se compreendeste, não é Deus. Se pudestes compreender, não foi Deus que compreendeste, mas apenas uma representação de Deus».
- Será que, como insinua alguma teologia, o máximo a que podemos aspirar é a saber o que Deus não é?
O certo é que até a Bíblia reconhece que caminhamos em contraluz. Deus é luz (cf. Sal 27, 1), mas surge ante nós como uma luz inacessível, que ninguém vê (cf. 1Tim 6, 16).
- A morada de Deus parece ser a nuvem (cf. Sal 97, 2), que é um manto de obscuridade que se interpõe entre nós e a luz.
Os textos sagrados garantem que Deus vem até nós através da nuvem (cf. Êx 19, 9), falando connosco por entre nuvens (cf. Êx 24, 6; Mt 17, 5).
- E, no entanto, Deus inundou o mundo de luz (cf. Gén 1, 4).
Acontece que os nossos olhos não vêem tudo (cf. 1Cor 2, 9). O essencial permanece-lhes vedado.
- Só vemos Deus quando O vemos com os olhos de Deus.
Só na Sua luz encontramos a luz (cf. Sal 36, 5).
- É por isso que Deus envia o Seu Filho. Ele é a luz de Deus para cada homem (cf. Jo 1, 9) e para todo o mundo (cf. Jo 8, 12).
Como confessamos no Símbolo, Jesus é a «luz da luz». É a luz que vem da luz para acender, em nós, mais luz.
- É possível que tenha chegado o momento de conter a nossa auto-suficiência e de parar algumas das nossas palavras.
Uma Quaresma sem ruído, uma Quaresma na humildade, uma Quaresma de escuta, uma Quaresma de espera depositar-nos-á — transfigurados! — na manhã luminosa da Páscoa!