A. Boas — e belas — notícias para as famílias
- Eis que, neste Domingo, somos presenteados com uma bela — e muito profunda — ressonância do Evangelho da Família. Deus também tem boas notícias sobre a família e para as famílias. Deus também tem um projecto concreto para a família.
Neste dia, somos ajudados a responder às duas perguntas fundamentais: «em que consiste a família?» e «porque é que falham tantas famílias?».
- Desde logo, é importante perceber que a família é, acima de tudo, uma invenção de Deus. A Primeira Leitura diz que, para Deus, «não é bom que o homem esteja só» (Gén 2, 18). Isto significa que Deus não nos criou para a solidão, mas para a relação. É pela relação que o homem realiza a sua semelhança com Deus (cf. Gén 1, 26).
O próprio Deus, sendo único, não é um. Deus, sendo único, não vive na solidão, mas em relação. Por conseguinte, a Santíssima Trindade é a primeira comunidade, a primeira família. Pelo que a família humana está destinada a ser a imagem por excelência da família divina.
B. A família que Deus quer
3. O Pai é diferente do Filho e do Espírito Santo, o Filho é diferente do Pai e do Espírito Santo, o Espírito Santo é diferente do Pai e do Filho. E apesar disso — ou, melhor, por causa disso — todos estão unidos, formando uma família: a Santíssima Trindade. Também o homem é diferente da mulher e também a mulher é diferente do homem. E apesar disso — ou, melhor, por causa disso — são por Deus chamados a viver em unidade, em família.
A família não nasce por uma decisão do homem e da mulher; a família nasce, antes de mais, por decisão de Deus. Neste sentido, o matrimónio não é uma questão a dois, é uma questão a três. O matrimónio não é apenas uma questão entre o homem e a mulher; é uma questão entre o homem, a mulher e Deus. É Deus quem os chama porque é Deus quem mais os ama. Nós acreditamos que é Deus que coloca este homem no caminho daquela mulher e esta mulher no caminho daquele homem.
- A última frase da Primeira Leitura torna tudo muito claro: «O homem deixará pai e mãe para se unir à sua mulher e os dois passarão a ser um só» (Gén 2, 24). Ou seja, Deus quer que o homem se una à mulher e que a mulher se una ao homem. Dessa união resulta uma coisa nova, uma coisa bela: a família. Deste modo, a família não nasce do domínio do homem sobre a mulher nem do domínio da mulher sobre o homem; a família nasce da união entre o homem e a mulher.
O homem e a mulher não deixam de ser o que são. A família, no pensamento de Deus, não anula nenhum dos seus membros. A família não elimina, ilumina.
C. O amor entre o homem e a mulher é o amor de Deus no homem e na mulher
5. Jesus Cristo elevou esta união entre o homem e a mulher à dignidade de Sacramento. Ou seja, a união entre o homem e a mulher passa a ser uma expressão do amor de Deus, do amor que Deus é e do amor que Deus tem por cada um de nós. Não espanta, por isso, que São Paulo peça aos esposos que se amem como Cristo amou a Igreja. E como é que Cristo amou a Igreja? Dando-se por ela, entregando-se por ela, oferecendo a vida por ela (cf. Ef 5, 25).
A esta luz, o amor que existe entre marido e esposa não é somente um amor que de um homem e de uma mulher. Trata-se de um amor que, neles, foi depositado por Deus. É por isso que o homem e a mulher não se devem amar apenas como o seu amor. O homem e a mulher devem amar-se sempre com o amor de Deus, com o amor de Deus revelado em Cristo. Foi, aliás, o que nos pediu Jesus: que nos amemos uns aos outros como Ele nos amou, como Ele nos ama (cf. Jo 15, 12).
- Assim sendo, a preparação para o matrimónio e a vivência do matrimónio devem ser, sobretudo, tempos de oração, tempos de escuta. Uma vez que o amor entre o homem e a mulher vem de Deus, então cada homem e cada mulher devem dispor-se a acolher o amor que Deus neles depositou. Na verdade, foi esse amor que os juntou e é esse amor que os faz sobreviver como pessoas e como família.
São João Paulo II disse, há muitos anos, que «família que reza unida permanece unida». Pelo que a falta de união começa, quase sempre, pela falta de oração. Inversamente, o reforço da oração contribuirá para o crescimento da união. O tempo para Deus será sempre o tempo mais precioso para a família.
D. Porque é que as famílias falham?
7. Se têm tudo para dar certo, porque é que tantas famílias falham? Acima de tudo, por uma razão: porque as famílias se desligam de Deus. Tal como um viajante pelo deserto desfalece se não encontra uma fonte, a família desmorona-se se não bebe a água pura que lhe chega da parte de Deus. Por muitas ilusões que tenhamos, é importante que percebamos que sem Deus nada somos. De resto, o Filho de Deus preveniu-nos com suma clareza: «Sem Mim, nada podeis fazer» (Jo 15, 5).
Para Jesus, é a nossa «dureza» que estraga tudo. É a nossa «dureza» que conduz à falência da família. É a «dureza» da nossa mente — e do nosso coração — que nos impede de ver a verdade da família e de cultivar a beleza da vida familiar.
- Perante as objecções dos Seus contemporâneos (cf. Mc 10, 2), Jesus recorda o proto-Evangelho da família. A família, no plano de Deus, consiste na união entre um homem e uma mulher (cf. Mc 10, 6-7). É, portanto, esta a família que Deus quer: a família entre um homem e uma mulher, abertos à geração de novas vidas. E se é esta a vontade de Deus, será legítimo que alguém a modifique? Jesus não deixa lugar a dúvidas: «O que Deus uniu, não o separe o homem» (Mc 10, 9).
Ficam, assim, bem vincadas as propriedades essenciais do matrimónio: unidade e indissolubilidade, com a consequente abertura à vida. Não se trata de um mero projecto ideal. Trata-se, obviamente, de um ideal, mas que há-de tornar-se real, que há-de tornar-se realidade em cada dia.
E. Os problemas existem para serem vencidos, não para (nos) vencerem
9. A Igreja recebeu esta mensagem de Jesus, não se sentindo, portanto, em condições de a alterar. A Igreja é serva — não dona — da Palavra de Deus. Ela recebeu o encargo de a difundir, não de a modificar. Mas, então, e os problemas da família? Como lidar com tantos dramas, com tantas separações? Como ajudar tantas famílias que acabam pouco depois de começar?
É claro que a Igreja tem de usar sempre de misericórdia. As portas da Igreja estarão sempre abertas e o coração da Igreja é um coração permanentemente compassivo. Os que estão em maior dificuldade merecerão um maior acolhimento. Os que a vida mais feriu serão envolvidos por um acréscimo de compreensão, de solidariedade e de evangélica compaixão. Enfim, é preciso aproximar a mensagem das famílias e não desistir de aproximar as famílias da mensagem.
- Ninguém deve ser excluído e ninguém deverá ser iludido. Tal como o remédio para a doença não é a eliminação do doente, também a solução para os problemas da família não é a dissolução das famílias. O caminho só pode ser a revitalização da família e o apoio às famílias. Há muitos problemas nas famílias e há famílias com muitos problemas. Uma coisa, no entanto, é certa: os problemas existem não para nos vencerem, mas para serem vencidos por nós com a ajuda de Deus.
Queridas famílias, não comeceis a desistir e nunca desistais de começar. Queridas famílias, não desistais de vós. Maridos, não desistais das vossas esposas; esposas, não desistais dos vossos maridos. Filhos, não desistais dos vossos pais. Netos, não desistais dos vossos avós. Acreditai que aquilo que nos parece sombrio em muitos fins de tarde acabará por ser novamente luminoso ao nascer de uma qualquer manhã. E nunca esqueçais que, como já dizia Santo Agostinho, às vezes, é quando parece que tudo acaba que tudo verdadeiramente começa. A vossa família é muito bela. Não desperdiceis tanta beleza que Deus acendeu no vosso lar, no vosso coração, na vossa vida!