- No seu longo estendal de séculos, a história do mundo está marcada sobretudo por quatro homens e quatro cidades.
Foram eles que, em grande medida, moldaram o nosso pensar e vertebraram o nosso agir.
- Para Karl Jaspers, as figuras mais influentes são Sócrates, Buda, Confúcio e Jesus.
Ainda hoje, continuam a ser os maiores «mestres da humanidade».
- É de tal ordem a sua importância que «seria muito difícil apontar um quinto nome que tivesse a mesma magnitude», alguém que nos «interpelasse com a mesma elevação».
Foi sobretudo a eles que as civilizações foram buscar as suas raízes.
- Quanto às cidades mais relevantes, George Steiner aponta Atenas e Jerusalém.
Xavier Zubiri acrescentou-lhes Roma. E nós poderíamos aditar — ou contraditar — Paris.
- As três primeiras cidades modelaram o nosso perfil civilizacional.
De facto, estamos umbilicalmente estruturados pelo pensamento grego, pelo direito romano e pela religiosidade de Israel.
- Segundo Xavier Zubiri, foi mérito do Cristianismo ter operado uma «unidade radical e transcendente» entre estas três heranças.
Daí que os principais símbolos da nossa identidade sejam o Livro, a Universidade e a Catedral. Aí se projecta iconograficamente a nossa cultura, a nossa arte e a nossa fé.
- Há, entretanto, um momento que consubstancia um profundo abalo em todo este alicerce.
A Revolução Francesa não pretende optimizar o herdado, mas romper completamente com o estabelecido.
- É neste sentido que Paris desponta como a quarta cidade-emblema, a primeira de uma nova época.
Trata-se de uma época que surge em colisão com a autoridade e que se ergue à margem da divindade.
- A liberdade, a igualdade e a fraternidade parecem irredutivelmente asseguradas. Mas nem por isso se têm tornado especialmente visíveis.
Quando o homem se diviniza, tende a divinizar-se sobre os outros homens. Se cada homem se erige em deus para si mesmo (Feuerbach), o mais provável é que se comporte como «lobo» em relação aos outros (Thomas Hobbes). Em tal caso, como podemos ser livres, iguais e fraternos?
- Não espanta que alguns turiferários da Revolução Francesa se tenham convertido nos seus mais desapontados críticos. Perceberam que há tutelas que persistem e vínculos que se vão perdendo.
Como nota D. António Couto, «a fraternidade supõe um Pai». Quando compreenderemos que ninguém nos humaniza como Deus?