A. O caminho d’Ele ou a carreira nossa?
- Jesus apontou-nos o caminho, mas nós, Seus discípulos, andamos, quase sempre, ocupados com a carreira. Em vez do Seu caminho, o que nos (pre)ocupa é a nossa carreira. Daí que as nossas prioridades sejam, muitas vezes, as destes convidados, referidos no Evangelho: os lugares, os primeiros lugares (cf. Lc 14, 7).
A opção de Jesus não é pelos primeiros, mas pelos últimos lugares. O que Ele nos quer dizer é que Deus vem buscar para os primeiros lugares os que estão nos últimos lugares. E coloca nos últimos lugares os que se atropelam pelos primeiros lugares.
- Decididamente e como muito bem percebeu Maria, Deus escreve a história ao contrário. Derruba os poderosos, exalta os humildes, sacia os famintos e deixa os ricos de mãos vazias (cf. Lc 1, 52-53). Os preteridos do mundo são sempre os preferidos de Deus.
Deus não faz discriminação, mas também não fica indiferente. Deus é para todos, mas não é para tudo. Deus é para todos, para que todos se convertam a Ele e deixem os descaminhos que afastam da direcção certa. Deus é para todos, para que todos tenham a possibilidade de optar por Ele.
B. Verdadeiramente grande é quem é humilde
3. É neste contexto que a Liturgia deste Domingo nos exorta sobre alguns valores que acompanham a opção pelo Evangelho: a humildade, a gratuidade, enfim, a ausência de calculismo e ambição.
Na Primeira Leitura, um sábio do século II a.C. recomenda a humildade como caminho para Deus e, consequentemente, para ter êxito e ser feliz. A humildade aparece aparentada com a inteligência e a verdadeira grandeza: «Quanto maior fores, mais deves humilhar-te» (Eclo 3, 19). É por isso que «a desgraça do soberbo não tem cura» (Eclo 3, 21). Está demasiado centrado em si, sem disposição para se centrar nos outros e em Deus.
- A Segunda Leitura convida os crentes instalados numa fé cómoda a redescobrirem a centralidade do Cristianismo. É por isso que insiste em que o encontro com Deus é uma experiência de comunhão, de proximidade, de amor, de intimidade, que dá sentido à vida do cristão.
No fundo, esta reflexão está intimamente ligada ao tema central da liturgia deste Domingo: a humildade. É que a comunhão com Deus alicerça uma vida que exige de nós determinados valores e atitudes, entre os quais avultam a humildade, a simplicidade e o amor.
C. Todos são convidados, ninguém é excluído
5. O Evangelho situa-nos no ambiente de um banquete em casa de um fariseu. Este ambiente serve de pretexto para Jesus falar do «banquete do Reino». A quantos pretenderem participar nesse «banquete», Ele recomenda a humildade, não a encenação.
Ao mesmo tempo, Jesus verbera a atitude daqueles que conduzem as suas vidas numa lógica de ambição, de luta pelo poder e pela carreira, de superioridade em relação aos outros. Jesus não quer nada disso. Jesus quer a humildade, o despojamento, a simplicidade. Só quem for humilde, despojado e simples estará em condições para se esvaziar de si e incorporar em si o Evangelho de Jesus.
- Para este «banquete», todos são convidados, ninguém é excluído nem discriminado. Este texto apresenta duas partes. A primeira (cf. Lc 14, 7-11) aborda a questão da humildade. A segunda parte (cf. Lc 14, 12-14) trata da gratuidade e do amor desinteressado. Ambas estão vinculadas pelo tema do Reino. Isto significa que a humildade e a gratuidade são as atitudes fundamentais para quem quiser participar no «banquete do Reino».
As palavras que Jesus dirigiu aos convidados que disputavam os primeiros lugares não são novidade, pois já o Antigo Testamento aconselhava a não ocupar os primeiros lugares (cf. Prov 25,6-7). O Reino de Deus é uma fraternidade e uma comunhão, pelo que nele têm de prevalecer a partilha e o serviço.
D. Não superiores, mas servidores
7. No Reino de Deus não pode haver qualquer atitude de superioridade, de sobranceria, de ambição ou de domínio sobre os outros. Na vida cristã não deve haver superiores, pessoas que se julguem estar por cima. Não é essa a lógica de Jesus. Superior é, por definição, quem está em cima e Jesus identifica-Se com quem está em baixo.
Os responsáveis pelas comunidades não devem, pois, ser vistos como superiores, mas como servidores. Os responsáveis pelas comunidades não existem para exercer um poder, mas para executar um serviço: o serviço de conduzir para Cristo.
- Assim sendo, quem quiser entrar no Reino anunciado por Jesus tem de fazer-se pequeno, simples e humilde não se julgando mais importante que os outros. Esta foi sempre a lógica de Jesus. Foi isso o que Ele sempre propôs aos seus discípulos. Ele mesmo, na Última Ceia, lavou os pés aos discípulos, constituindo-os em comunidade de amor e de serviço. O apelo foi muito claro: «Como Eu fiz, fazei vós também» (Jo 13, 15)
Na segunda parte deste texto, Jesus recusa abertamente a prática de convidar para o banquete apenas os amigos, os irmãos, os parentes ou os vizinhos ricos. Os fariseus, à semelhança de muitos de nós aliás, escolhiam cuidadosamente os seus convidados para a mesa. Nas suas refeições, não convinha haver alguém pobre ou humilde. Por outro lado, os fariseus tinham a tendência de convidar aqueles que podiam retribuir da mesma forma.
E. Respeito para com todos, proximidade (apenas) com os humildes
9. A questão é que, desse modo, tudo se transformava num tráfico de favores e de influências. Fica bem claro que Jesus não quer nada disto. Para Jesus, o respeito é para todos, mas a proximidade é com os humildes e os simples. Segundo Ele, há que convidar «os pobres, os aleijados, os coxos e os cegos» (Lc 14, 13).
Note-se que os cegos, os coxos e os aleijados eram considerados pecadores públicos, amaldiçoados por Deus e por isso estavam proibidos de entrar no Templo (cf. 2 Sam 5,8). Apesar disso, são esses que devem ser os convidados para o «banquete». São eles os que mais precisam.
- Importa ter presente que Jesus já não está especificamente a falar desta refeição em casa de um fariseu, na companhia de gente distinta. Ele já está a falar do «banquete do Reino». Daí que trace as características do Reino. Ele é apresentado sob a forma de um «banquete», onde os convidados estão unidos por laços de familiaridade e de comunhão.
Para este «banquete», todos, sem excepção, são convidados. Até os habitualmente excluídos são incluídos As relações entre os que aderem ao «banquete do Reino» não serão marcadas por interesses, mas pela doação. Os participantes do «banquete» devem despojar-se de qualquer atitude de superioridade, de orgulho ou de ambição, colocando-se numa atitude de humildade, de simplicidade, de serviço. Eis o que falta. Eis o que urge. Ninguém se considere superior. Consideremo-nos todos apenas — e sempre — como irmãos!