O acontecimento de Deus nos acontecimentos dos homens. A atmosfera é sempre alimentada por uma surpreendente Theosfera.

Sexta-feira, 28 de Novembro de 2014

 

  1. Hoje não é (só) hoje.

O presente de cada instante acaba por constituir uma recordação do que já foi experimentado e uma antecipação do que se prepara para ser vivido.

É assim que, nas ondas alterosas da existência, navegamos entre a euforia, a incerteza, a ansiedade, a amargura e a desilusão.

Por muito que nos esforcemos, dificilmente estamos inteiros no momento que passa por nós.

O presente é sempre esquivo, fugidio, apressadamente arrebatador. Deixa rasto, mas o rasto que deixa depressa se transforma em passado.

Daí a insatisfação, a inquietude. Mas daí também a saudade e a esperança. Somos o que recordamos e o que construímos.

A nossa morada raramente está onde vivemos. A nossa morada afectiva está, quase sempre, onde já estivemos e onde gostaríamos de estar.

  1. Hoje não é (só) hoje.

Há quem acentue em excesso o que já passou. Há pessoas para quem o tempo devia parar. No meu tempo é que era bom! — ouvimos, tantíssimas vezes, este lugar comum.

A História, neste caso, é para conhecer, para admirar e para arrumar. Se fosse possível, seria igualmente para repetir.

Não nos apercebemos de que o tempo tem uma direcção. O tempo não estagna nem regride. Avança e prospera.

O passado é para admirar, para integrar e, se for caso disso, para corrigir.

É óbvio que não devemos esquecer o passado. Aliás, o passado sobrevive sempre na nossa memória, na nossa lembrança.

Faz bem rememorar o que nos fez bem e (sobretudo) quem nos fez bem. A gratidão é um dos sentimentos mais nobres mas (infelizmente) mais esquecidos.

Recordar não é apenas uma faculdade da memória. É também um exercício do coração reconhecido.

Mas mesmo aquilo que nos magoa e entristece não deve ser recalcado. Tem de ser permanentemente reencontrado. Afinal, faz parte de nós. Pertence-nos.

Ninguém pode escapar ao encontro com a sua História nem com a História dos outros. Não seríamos aquilo que somos se não tivéssemos sido aquilo que fomos.

Precisamos de uma grande dose de serenidade para encetarmos a viagem pelo no nosso passado sem dramas nem branqueamentos.

A bem dizer, ninguém tem a idade que tem. Todos temos a idade do que nos antecedeu. Desde o início. Em boa verdade, nós temos a idade do Universo.

Tudo foi importante para que nós estivéssemos aqui, hoje. Agora.

  1. Hoje não é (só) hoje.

No hoje de cada momento, o que esteve em gérmen foi sempre o amanhã. A História da Humanidade é a História do futuro.

Em cada época, germinaram grandes depressões e floresceram enormes expectativas.

A espera habitou sempre no coração do Homem. Mesmo — diria sobretudo — nas horas mais complicadas.

Quantas não foram as vezes em que as lágrimas corriam pelo nosso rosto e, ao mesmo tempo, uma esperança se acendia no nosso íntimo!

O hoje de cada momento é uma espécie de chão onde semeamos o que mais acalentamos.

A história bíblica está repleta de dramas e prenhe de esperanças. O cristianismo é, neste contexto, a religião do futuro. Não de um mero futuro que sucede ao presente (e que, frequentemente, se arrisca a repeti-lo). Mas de um futuro que transforma o presente. Que o redime, colmata, coroa e plenitudiza.

  1. Hoje não é (só) hoje.

E é por isso que ele (o hoje) é tão importante, tão central, tão verdadeiro, tão denso e tão intenso. Nenhum hoje enquista nele mesmo. Cada hoje abre-se ao diferente.

Nestes dias, ouvimos falar bastante do fim. Nas igrejas são-nos propostos textos de enorme beleza e soberana dificuldade.

Deixemos as dificuldades para os exegetas e fixemo-nos na proposta. O fim é um convite a que nunca desistamos. O fim é uma bússola para nunca nos perdermos.

Sabemos que os caminhos não são fáceis. Sentimos que os caminhos são, quase sempre, tortuosos. Mas temos, acima de tudo, a certeza de que há caminhos que nos reconduzem ao melhor de nós mesmos.

Não andamos perdidos nem estamos desamparados. «O que importa — disse Gandhi — é o fim para o qual eu sou chamado»! Se, no fim, a felicidade nos espera, por que razão não prepará-la desde já?

 

publicado por Theosfera às 09:47

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