1. Quem acompanha minimamente a actualidade nota como se desmorona, a cada passo, a esperança de ver ubiquar o sonho de Platão no mundo.
Defendia o filósofo que o governo devia ser assegurado pela razão. E a razão seria corporizada na pessoa do rei-filósofo. Ou seja, o governante devia ser, fundamentalmente, sábio.
2. Muitos séculos depois, porém, Immanuel Kant desfazia qualquer ilusão a este respeito: «Não é de esperar que os reis filosofem ou que os filósofos se tornem reis, pois a posse do poder corrompe, inevitavelmente, o livre juízo da razão».
Hoje em dia, os sábios já não se candidatam à governação. E, pelos vistos, os governantes já não aspiram à sabedoria.
3. Albert Einstein deu conta: «A tentativa de combinar sabedoria e poder só raramente foi bem sucedida e por pouco tempo».
É uma lacuna grave. Não só política. Mas também cívica.
4. Precisamos, sem dúvida, de competência para gerir esta conjuntura.
Mas do que necessitamos verdadeiramente é de sabedoria para vislumbrar um desígnio comum, um rumo alternativo, uma energia mobilizadora.
5. Estamos apreensivos quanto ao futuro, mas não queremos aprender com o passado.
E já Alexis de Tocqueville alertava: «Desde que o passado deixou de projectar a sua luz sobre o futuro, a mente humana vagueia nas trevas».
6. Tudo vagueia no espaço mediático com grande estrondo. Uma «aurea mediocritas» parece ser o passaporte mais seguro para o êxito imediato.
A sabedoria fica à porta, escondida. Pagaremos um preço cada vez mais elevado pela conivência com uma propaganda com muito ruído e nula substância.
7. Os sábios costumam avisar antes da hora. O poder costuma reconhecer — e pedir perdão — depois do tempo.
A história está repleta deste desencontro estrutural.
8. Não seria possível encontrar uma atitude pautada pela escuta e pelo acolhimento?
A época é o «tempo qualificado», dizia Zubiri. Há propostas rejeitadas que teriam feito a diferença na altura própria.
9. Cedo vem o alerta. Tarde costuma vir a aceitação.
As memórias dos poderosos estão cheias de reconhecimentos de decisões erradas que magoaram pessoas e arruinaram percursos.
10. A sabedoria nem sempre está no poder.
Se, ao menos, estivesse a humildade, não é garantido que todos os erros fossem evitados. Mas, muito possivelmente, muitos deles não seriam repetidos…