- Sofremos pela ausência, mas conspiramos contra o silêncio.
O livro de Shusaku Endo, levado ao cinema por Martin Scorsese, surge atravessado pela identificação entre o silêncio e a ausência.
- Deus é directamente interpelado: «Senhor, porque Te calas?»
Os clamores são «atirados ao Céu». Todavia, paira «a sensação de que Deus Se mantém de braços cruzados».
- Deus aparece como o supremo responsável pelo sofrimento.
É especialmente para Ele que, nas horas de tormenta, são encaminhadas as culpas: «Porque é que Deus nos impõe o sofrimento?»
- Só que a Sua presumida responsabilidade não está no que faz, mas no facto de não impedir que outros façam.
Quem faz sofrer são os homens. E, contudo, o questionado acaba por ser Deus. Questiona-se mais Deus por (alegadamente) deixar que se sofra do que os homens pelo que (notoriamente) fazem sofrer.
- A suposta inacção divina é mais perturbadora do que a manifesta intervenção humana.
Em permanente conspiração contra o silêncio, temos dificuldade em reconhecer nele não uma ausência, mas uma presença alternativa. Que nem sempre é menos efectiva e que até pode ser mais afectiva.
- Deus não precisa de ruidar para falar. Como percebeu Kierkegaard, Ele «fala mesmo quando Se cala».
O próprio Sushaku Endo conclui que Deus não está em silêncio; sofre ao nosso lado.
- A Sua linguagem não é necessariamente uma linguagem vocal. É sobretudo uma linguagem cordial.
O que Deus diz vem pelo coração sofredor de Seu Filho (cf. Jo 19, 34) até ao coração sofrido de tantos Seus filhos.
- Na Cruz, Deus faz Seu o que é nosso.
A paixão de Cristo revela a com-paixão de Deus pelo nosso sofrimento. Não o evita, mas assume-O.
- Como bem notou São Bernardo, Deus é impassível, mas não quer ser incompassível.
Enquanto impassível, não está sujeito ao padecer. Recusando ser incompassível, mostra que não é incapaz de Se compadecer (cf. Heb 4, 15).
- Em «A Noite», Elie Wiesel avista Deus nos sofredores. O que é feito a eles é o que continua a ser feito a Ele (cf. Mt 25, 40).
Esta é a beleza maior, a única que salvará o mundo. Deus está com os últimos tornando-os primeiros. Os que subvivem na dor sobreviverão, para sempre, no Seu amor!