- A imperfeição é, obviamente, um problema.
Mas é ela também que nos abre as portas a um mar infindo de possibilidades.
- É por causa da nossa imperfeição que procuramos ir mais além de nós mesmos.
Estamos sempre em saída e encontramo-nos em contínua viagem. Só em nós não somos nós. Como reconhecia Pascal, «viver é ultrapassar-se».
- Se o mundo fosse perfeito, seria divino. Em tal caso, não haveria procura de Deus.
Se nada falta, para quê procurar? Para quê procurar fora se tudo já existe dentro?
- É a imperfeição do homem que excita a procura de Deus. É a perfeição de Deus que excita a procura do homem.
O homem vai ao encontro de Deus do fundo da sua indigência. Deus vem ao encontro do homem desde a plenitude do Seu amor.
- Em Cristo, Deus oferece a perfeição ao homem como um projecto (cf. Mt 5, 48).
No mesmo Cristo, o homem olha para a perfeição de Deus como um dom.
- Deste modo, quanto mais indigentes nos achamos, tanto mais receptivos nos tornamos à presença de Deus.
Jesus Cristo é, verdadeiramente, Emanuel, o Deus-connosco e com as nossas feridas.
- Muito comovente é ouvir Tomé proclamar a divindade de Jesus quando toca as Suas feridas (cf. Jo 20, 27-28).
O apóstolo chega à fé pela «porta das feridas». Alguém conseguirá aderir à fé sem ser pela «porta dos feridos»?
- Como bem notou Tomás Halik, só atinge a certeza da fé quem, «ao tocar nas feridas do mundo, toca em Deus».
Consta que Pascal, estando impedido de comungar, começou a cuidar de um pobre. Era uma forma de continuar a receber o Corpo de Cristo.
- Também se conta que, um dia, Satanás terá aparecido a S. Martinho disfarçado de Cristo.
O santo, porém, não se deixou enganar. «Onde estão as tuas chagas?», perguntou.
- Tirar as chagas de Cristo é o mesmo que desfigurar Cristo. E retirar Cristo das chagas é o mesmo que agravar — ainda mais — as (nossas) chagas.
Uma religiosidade telegénica, que não aterra nas chagas da vida, é por muitos exaltada. Mas será muito exaltante? Tomás Halik não acredita em «religiões sem chagas». Não foi pelas chagas que fomos curados (cf. Is 53, 5)?