O turbilhão de acontecimentos e a crescente insensibilidade pela cultura substantiva fazem com que determinadas ocorrências nos passem ao lado, quedando-se por ligeiras notas de rodapé.
Ontem, faleceu Maria Lúcia Lepecki. Tinha apenas 71 anos e uma obra importante em vastos domínios da literatura.
Nascida no Brasil, era especialista em autores que os portugueses vão remetendo para as bafientas arcas do olvido. Camilo Castelo Branco era um desses autores, sobre o qual, aliás, versou a sua tese de doutoramento.
Pessoa de raciocínio elaborado, impressionava pela extrema simplicidade do seu argumento contra o Acordo Ortográfico: «Eu sempre achei que o acordo ortográfico não é preciso: um brasileiro lê perfeitamente a ortografia portuguesa e um português lê perfeitamente a ortografia brasileira».
Brasileira por nascimento e portuguesa pelo casamento, Maria Lúcia Lepecki merece ser escutada e devidamente atendida.
O seu pensamento é de uma linearidade desarmante. O Acordo não é, obviamente, ilegítimo. Simplesmente não é necessário.
Numa altura em que tantos recursos estão a ser desafectados de áreas essenciais, eis uma despesa que pode ser evitada. A reflexão deve prosseguir.
A posição de Maria Lúcia Lepecki é singularmente pertinente. Trata-se de alguém que, além de competente, está ligada aos dois pólos excruciantes da nossa língua: Brasil e Portugal.