Em tempos marcados pela falta de dinheiro, é natural que a gestão seja a prioridade.
Ela pode, sem dúvida, ajudar a resolver um problema. Mas será que tem capacidade para preencher uma lacuna?
Uma gestão cuidada pretende, no fundo, fazer com que levemos, mais ou menos, a vida que nos habituámos a levar.
Não será, entretanto, possível ponderar um estilo de vida diferente?
A gestão serve para a conjuntura, mas é insuficiente para nos conduzir à profundidade.
Alguns, como Alain Touraine, fazem apelo ao poder das ideias, invocado, já há décadas, por Isaiah Berlin.
As próprias ideias, hoje, parecem manietadas. Há uma lacuna que, talvez sem darmos por isso, se foi cavando em nós: o esquecimento da alma.
Thomas Moore, célebre psicoterapeuta, apontou esta como sendo a maior doença do século XX. E o início do século XXI ainda não está a constituir a necessária terapia.
Aliás, até na Igreja este esquecimento parece ter entrado. Basta olhar para um pequeno (mas significativo) exemplo.
Quando o sacerdote, antes da comunhão, apresenta o Corpo de Cristo, dizendo Eis o Cordeiro de Deus, a resposta clássica, em Latim, era muito clara: «Domine, non sum dignus, ut intres sub tectum meum: sed tantum dic verbo, et sanabitur anima mea».
«E a minha alma será salva». Entretanto, as traduções passaram a referir e eu serei salvo.
É claro que a alma está na profundidade do eu. Mas, como sabiamente adverte Thomas Moore, a alma é mais que o eu. «Ela é a infinita profundidade de um indivíduo e de uma sociedade, abrangendo os inúmeros aspectos que se combinam para formar a nossa identidade. A alma existe para lá das circunstâncias e concepções pessoais».
Por aqui se vê como o individualismo tem que ver, em grande medida, com o esbatimento da alma.
A alma é a abertura aos outros, ao universo, ao transcendente. Daí que se fale também em anima mundi (alma do mundo).
Redescobrir a alma não é, pois, retroceder no tempo. É crescer na vida. Sobretudo em qualidade de vida.