Numa conjuntura, a tentação é ficar pelo conjuntural.
A presente campanha está a ser uma penosa demonstração deste perigo. Que, com lúgubre facilidade, nos atrai.
A vontade é, como dizia Pinto da Costa, desligar o televisor.
Além da encenação e da ausência de ideias, eis que surge a suspeita.
O pressuposto será desmascarar o adversário, aplicar-lhe um golpe letal.
Triste é a estratégia que nisto assenta.
Nada disto convence, tudo isto afasta.
Continuamos à espera de um pouco de dignidade, de um vislumbre de decência e de uma atenção à realidade.
Daí que, nesta conjuntura, traga palavras intemporais do grande António Vieira, reproduzidas, aliás, por Adriano Moreira num jornal deste dia.
«Estais Cegos. Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra, vedes as obrigações, que se descarregam sobre o vosso cuidado, vedes o povo, que carrega sobre as vossas consciências, vedes as desatenções do governo, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos, vedes os respeitos, vedes as potências dos grandes, e as vexações dos pequenos, vedes as lágrimas dos pobres, os clamores, e gemidos de todos? Ou os vedes ou os não vedes. Se o vedes, como o não remediais? E se não remediais, como os vedes? Estais cegos».
Que este sol ofereça um pouco de luz. Para ver o que, para muitos, permanece invisível.