Este é o momento em que as palavras operam a transumância da culpa.
Esta passeia-se da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, empurrada pelo turbilhão discursivo dos líderes (já) em campanha.
E a atenção não pode fixar-se apenas nas palavras ditas ou escritas. Há que não esquecer as palavras insinuadas. As entrelinhas são tão importantes como as linhas.
Quando se diz que vivemos acima das nossas possibilidades, parece que o país é uma entidade homogénea.
Esquece-se que há quem trabalhe muito e receba pouco. Vive-se acima do que se pode ou sobrevive-se abaixo do que se deve?
O problema está nas políticas, sem dúvida. O capital engole o trabalho e quase esmaga as pessoas.
Manuela Silva acertou no ponto quando notou que a troika, parecendo querer mudar tudo, se esqueceu de pôr fim às desigualdades.
A erradicação da pobreza não deveria ser uma prioridade?
Não será que os pobres se vão multiplicar?
A culpa, entretanto, passeia-se. Ninguém a assume.
O mais fácil é dizer que ela é de todos. O mais aviltante é insinuar que é de quem, gastando tudo, não consegue poupar nada. Pela simples e elementar razão de que esse tudo que se ganha (e e logo se gasta) afinal é muito pouco.