Não é só a crise que é preocupante. É-o também a falta de rumo perante a crise, a falta de confiança que é transmitida aos cidadãos.
E já não é só o presente que está comprometido. É também o futuro que já aparece ameaçado.
O orçamento foi aprovado, mas todos alvitram dificuldades na sua execução.
Há, em suma, uma sensação de impotência na classe política.
Estamos, portanto, numa situação de excepção. E situações de excepção requerem soluções de excepção.
É sobretudo em alturas como esta que há que esquecer interesses de partido e de grupo, para priorizar, de uma vez para sempre, o interesse nacional.
Já chega de instabilidade. Precisamos de estabilidade económica, de estabilidade social e de estabilidade política.
O interesse nacional reclama que os partidos se entendam. É impressionante como, numa hora tão crítica, não falta quem assuma esperar por novas eleições. Mas quem garante que de tal acto eleitoral saia uma solução consistente?
Nenhuma sondagem indica tal possibilidade. Nenhum partido se aproxima da maioria absoluta. E, depois, a poucos parece que o PSD seja substancialmente diferente do PS. Será uma alternância, mas não uma autêntica alternativa.
Penso que, na actual composição parlamentar, ainda é possível vislumbrar um caminho e tentar uma possibilidade. Mas, para isso, é fundamental um acto de humildade dos líderes.
Deviam pedir a personalidades que se destacassem pela maturidade, pela seriedade e pela sensatez que dessem um derradeiro contributo ao país neste momento crítico.
Como, em princípio, o PCP e o BE não pretenderão entrar num acordo de governo, o PS, o PSD e o CDS deviam ser chamados a abrir espaço a uma solução estável.
Antes de mais, deveriam entender-se quanto ao nome do primeiro-ministro. Tendo em conta a sua trajectória e as ligações aos três partidos (foi fundador do CDS, candidato presidencial apoiado pelo CDS e PSD e ministro de um governo PS), o Prof. Freitas do Amaral seria uma possibilidade a ter em conta.
Estou convencido de que esta é a última hora dos fundadores do regime. E Freitas do Amaral é o único sobrevivente, à excepção de Mário Soares, que aliás já desempenhou o cargo de presidente da república.
Recorde-se que Freitas do Amaral seria um nome respeitado lá fora até porque desempenhou, com êxito, o cargo de presidente da mesa da assembleia geral das Nações Unidas.
Fundamental seria, como é óbvio, a escolha do ministro das finanças. Os mercados estão agitados e, pelos vistos, desconfiados em relação a Portugal. É neste sentido que dois nomes me ocorrem: António Borges (que acaba de ser nomeado para a delegação europeia do FMI) e Carlos Horta-Osório (que acaba também de ser nomeado para o Lloyds Bank).
Numa fase em que a credibilidade é tão importante, o sinal que seria dado com qualquer um destes nomes está acima de todo o questionamento.
Se, entretanto, as finanças são importantes, a solidariedade social é decisiva. Num tempo em que tanta gente não tem o necessário para comer, precisamos de alguém com pensamento e dinamismo nesta área. O nome que, imediatamente, me salta à lembrança é o de Alfredo Bruto da Costa. Mas Eugénio da Fonseca também seria alguém a equacionar.
A educação precisa não só de uma acção no curto prazo, mas de uma profunda reforma de médio e longo alcance. Aliás, aqui reside um dos problemas vitais do nosso país.
A educação, sem desdouro por quem tem dado o seu melhor, tem regredido enormemente. Há um excesso de intervencionismo e de controlo, uma insistência desmedida no conhecimento instrumental e um desguarnecimento confrangedor nas humanidades. Ninguém está contente: nem professores, nem alunos, nem famílias.
Nesta área, há dois nomes que fariam certamente um bom lugar. Têm pensamento estruturado e experiência acumulada: António Nóvoa e Nuno Crato.
O ministério da educação devia abranger igualmente a cultura e a investigação, até porque uma das prioridades de um governo em tempo de crise deveria ser a redução do número de ministérios.
Um governo mais pequeno, de resto, poderá ser um governo mais coeso e não menos eficaz.
A economia poderia, neste espírito, envolver a indústria e a agricultura. Julgo que Daniel Bessa não ficaria mal.
Para a saúde, João Lobo Antunes seria uma opção acertada.
No que toca à justiça, António Pinto Leite, um homem íntegro e uma personalidade consistente, poderia espoletar as reformas necessárias.
Já agora, Mota Amaral poderia figurar nos Negócios Estrangeiros, dada a sua reconhecida ponderação. Mas Luís Amado poderia continuar. Um verdadeiro senhor e uma agradável surpresa neste tempo imponderado.
Estes e outros nomes, pela força que têm, estariam em condições de racionalizar a administração central e local, tão heterogénea, ineficaz e dispendiosa.
Tenho, porém, noção de que tudo isto não passa de ficção. Dificilmente os partidos se porão de acordo. E, mesmo que se ponham, as lideranças não quererão ficar de fora.
Com todo o respeito, não creio que as actuais lideranças do PS (a actual e as que já se perfilam), do PSD e do CDS disponham de maturidade suficiente para fazer o que tem de ser feito.
Prestariam um serviço de enorme relevância se abrissem caminho a alguns dos nossos senadores.
Aqueles terão, no futuro, novas oportunidades de mostrar o que valem. Estes dispõem, talvez, do derradeiro ensejo de servir o país. Será derradeiro para eles. Será decisivo para todos nós.
Se soubermos aliar a humildade à inteligência, poderemos ser capazes. Mas receio, sinceramente, que, uma vez mais, falte esse ingrediente: a humildade. A única que nos torna verdadeiramente grandes. «Mais alta que a grandeza - dizia Levinas - é a humildade».