Obedecer é sempre aconselhável. Mas, em certos momentos, desobedecer pode ser inevitável.
Confesso que até a mim me arrepia a soberana liberdade de Jesus. E assumo que tenho muita dificuldade em imitá-Lo. As convenções são muito fortes. E as pressões acabam por se fazer sentir.
O Evangelho do próximo Domingo (o quinto da Quaresma) descreve-nos uma situação em que Jesus Se demarca nitidamente da Lei.
Prescrevia esta que toda a mulher apanhada em adultério fosse apedrejada. Era a Lei e ponto final.
Como bom judeu, era de esperar que Jesus sufragasse a Lei, embora os Seus coetâneos já palpitassem que a Sua conduta era pautada por outro tipo de referências. Ele não veio para revogar o antigo, mas também nunca Se eximiu a introduzir o novo.
E, uma vez mais, Jesus desconcertou. Não disse que a mulher procedeu bem. Mas não apoiou a condenação.
Era tão fácil dizer: «Cumpra-se a Lei».
Em momentos de crise, desobedecer pode ser uma necessidade, um imperativo. No fundo, obedece-se a uma lei maior: a lei do amor, a única lei.
Daí que o profeta Isaías, que também ouviremos no próximo Domingo, se faça eco da palavra de Deus: «Vou fazer convosco algo de novo».
A novidade de Jesus ainda não está superada. Nem devidamente acolhida.
Urge saber discernir. Se os nossos capitães fossem formalmente obedientes, ainda não estávamos em democracia.
Se Lech Walesa fosse formalmente obediente, a Polónia e o leste europeu ainda estariam sob uma ditadura.
A obediência é, em si mesma, um bem. Mas, em certas alturas, pode haver um bem maior que requeira a desobediência.
Esta liberdade de discernir segundo os ditames da consciência ( o santuário secreto de que fala o Vaticano II) é um dom de Deus. É um sinal de fidelidade ao espírito do tempo e ao tempo do Espírito.