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A evangelização é o conteúdo da missão. Só cumprimos a missão quando nos comprometemos com a evangelização. A chegada do evangelizador tem de ser, por isso, a chegada do Evangelho. Em síntese, a missão consiste em ir por todo o mundo para que em todo o mundo seja anunciado o Evangelho de Cristo e o Cristo do Evangelho. Nesta tarefa prioritária, temos de nos mobilizar todos e de nos mobilizar sempre. A missão não é só para alguns nem para alguns momentos. A missão é para todos e é para sempre.
- Não se pode ser cristão sem ser missionário. Onde está o cristão, aí tem de estar a missão. O Evangelho não é privilégio de ninguém nem exclusivo de alguns; é dom para cada um e responsabilidade para todos.
O primeiro momento da Missão acontece por dentro: quando nos deixamos interpelar por Jesus Cristo. É por isso que o orante não é inactivo. Dir-se-ia que ele é acrescidamente activo: a partir da base, a partir do fundo, a partir de dentro.
- Os mais activos foram sempre grandes contemplativos. Aliás, duplamente contemplativos: contemplativos na oração e contemplativos na acção. Todos eles souberam encontrar Cristo na oração e reencontrar Cristo na acção.
Habituemo-nos a estar perto de Cristo. Só quem está perto de Cristo estará perto do homem. É que, perto de Cristo, ouviremos o Seu apelo a estar perto de cada homem. A oração é, por conseguinte, a grande parteira da missão. Só quem escuta Jesus Cristo tem condições para seguir Jesus Cristo. Ele está sempre a nossa beira para invadir a nossa vida inteira.
- Não esqueçamos que o maior empreendimento missionário — o de São Paulo — começou com uma forte experiência de oração. Após a conversão, estando em Antioquia, foi quando estava em oração que sentiu o chamamento para a missão (cf. Act 13, 1-3). É, pois, a oração que gera a missão. A oração inquieta, não aquieta. Na oração, a Igreja torna-se missionária, não estacionária.
O lugar do nosso testemunho não há-de ser apenas o púlpito, a cátedra ou a reunião. O lugar primordial do nosso testemunho tem de ser a vida, a nossa vida. Daí que o Papa Francisco proponha: «Fiel ao modelo do Mestre, é vital que hoje a Igreja saia para anunciar o Evangelho a todos, em todos os lugares, em todas as ocasiões». Se, entretanto, tivermos que privilegiar alguém, que sejam «os pobres e os doentes, aqueles que muitas vezes são desprezados e esquecidos».
- Hoje e sempre, «os pobres são os destinatários privilegiados do Evangelho, e a evangelização dirigida gratuitamente a eles é sinal do Reino que Jesus veio trazer». A Igreja não existe por ela mesma. Ela vem de Deus para o homem.
Por conseguinte, Deus é o centro e o homem o caminho. Neste sentido, cabe à Igreja estar de joelhos junto de Deus e de pé ao lado das pessoas. A Igreja tem de ser advento de Deus e evento de humanidade.
- Tudo isto requer mais que o texto, a entrevista ou a tomada de posição. Tudo isto reclama estar no templo e no tempo, no sacrário e na rua. Muitas vezes, é preciso sujar as mãos para manter limpo o coração.
Na missão, gerada na oração, o maior desafio é o desafio da totalidade. Trata-se de um duplo desafio: levar tudo a todos: ou seja, toda a mensagem (cf. Mt 28, 20) a toda a gente (cf. Mc 16, 15). A resposta pode não vir de todos, mas a proposta não pode deixar de chegar a todos. A adesão pode ser parcial, mas a oferta não pode deixar de ser total.
- Não temos faltado à obrigação de procurar chegar a todos. Mas será que temos sabido honrar o dever de oferecer tudo? Onde não há totalidade, não há verdade. Uma meia-verdade não é a verdade. Três quartos de verdade continuam a não ser a verdade.
A verdade está apenas — e sempre — na totalidade. Pelo que renunciar à totalidade é o mesmo que renunciar à verdade. É compreensível que haja acentuações. E a acentuação de um aspecto acarreta, inevitavelmente, algum ofuscamento de outros aspectos.
- Na hora de escolher, os santos não hesitam: escolhem tudo. Assim fez Santa Teresa do Menino Jesus (e da Santa Face): «Meu Deus, escolho tudo». Acontece que, na era das especialidades e na cultura do fragmento, há uma tendência quase instintiva para decompor a mensagem em parcelas. Deste modo, vão-se perdendo as articulações que unem harmoniosamente todas as dimensões da fé.
Há quem aposte na relação com Deus, mas ignore a relação com os outros. Há quem invista na relação com os outros, mas esqueça a relação com Deus. Há quem ponha em oposição a doutrina e a pastoral. Há quem desvalorize a pastoral em nome da doutrina. Há quem deprecie a doutrina em prol da pastoral. Há quem evidencie a justiça ao ponto de subalternizar a misericórdia. E há quem evidencie a misericórdia ao ponto de minimizar a justiça.
- O mal não é tanto cada um achar que está certo. O mal é sobretudo cada um decretar que os outros estão definitivamente errados. Resultado. Os irmãos transformam-se em adversários com as intermináveis disputas entre contemplativos e activos, entre conservadores e progressistas, etc.
Quando compreenderemos que, afinal, um só é o nosso Mestre (cf. Mt 23, 10)? É n’Ele que está tudo o que deve ser oferecido a todos. Por conseguinte, nunca nos podemos aquietar. Sucede que, em vez de ler o mundo a partir do Evangelho de Cristo, parece que nos limitamos a ler o Evangelho de Cristo a partir do mundo. Portamo-nos mais como porta-vozes do mundo do que como portadores do Evangelho no mundo.
- Não percebemos que ajudamos mais o mundo sendo diferentes dele do que mostrando-nos iguais a ele. Se o mundo nos vê como iguais, que necessidade sentirá de nós? Não esqueçamos jamais que o Vaticano II, a par do aggiornamento, teve como grande prioridade a refontalização. Não se trata de voltar ao passado nem de retomar o antigo. Trata-se, simplesmente, de sermos arautos do perene, sabendo que o perene nunca deixa de ser actual.
Voltemo-nos para Maria e peçamos-Lhe o remédio para a nossa participação na Missão. Que, como Ela, ofereçamos tudo por Cristo e ofereçamos Cristo a todos. Que nos deixemos guiar pelo Seu exemplo. E que procuremos viver no tempo o que celebramos, aqui, no templo!Para a Missão, grande modelo é Maria, que encontramos sempre na Eucaristia. Foi — e é — Ela que nos dá o Jesus-Pão que, pela comunhão, desce ao nosso coração. Efectivamente, na missão encontramos o mesmo Cristo que encontramos na Missa. Por conseguinte, nada pode ficar igual depois de termos participado num mistério tão diferente.