A. A Palavra está unida ao Pão
- De novo, o Pão. Depois do milagre, a explicação. Afinal, ontem como hoje, o Pão está unido à Palavra. É que «nem só de pão vive o homem; mas de toda a palavra que sai da boca de Deus» (Mt 4, 4). A Palavra também alimenta e o Pão também ensina.
Este 18º Domingo do Tempo Comum repete, no essencial, a mensagem do passado Domingo. Assegura-nos que Deus está empenhado em oferecer ao Seu povo o alimento que dá a vida eterna.
- Na Primeira Leitura, a intervenção de Deus não se limita a satisfazer a fome biológica. Deus quer também — e acima de tudo — ajudar o Povo a crescer, a amadurecer, a superar mentalidades estreitas e egoístas. No Evangelho, Jesus vai mais longe. Não só oferece alimentos como Ele mesmo Se apresenta como o alimento. Jesus é, verdadeiramente, pão: o Pão da vida, o Pão para a (nossa) vida. Aos que O seguem, Jesus pede que O aceitem como Pão, isto é, que escutem a Sua mensagem e adiram à Sua proposta.
Como corolário, a Segunda Leitura certifica-nos de que a adesão a Jesus implica deixar de ser homem velho para passar a ser homem novo. Aquele que acolhe Jesus como Pão passa a ser outra pessoa, passa a ter nova vida. O encontro com Cristo deve significar, para todos, uma mudança total. Nada pode ser como dantes.
B. O «outro lado» da realidade
- O episódio que, hoje, o Evangelho nos transmite transporta-nos para o dia seguinte à multiplicação dos pães e dos peixes. A multidão vai «à procura de Jesus» (Jo 6, 24). Eis o essencial de tudo: procurar Jesus, nunca desistir de procurar Jesus, nunca nos cansarmos de procurar Jesus.
É preciso pensar, por isso, em cada dia e no dia seguinte. O dia seguinte é um dia que não pode ser desperdiçado. Jesus espera-nos também no dia seguinte e no «outro lado». De facto, Jesus está à nossa espera «no outro lado do mar» (Jo 6, 25) e sobretudo «no outro lado» das nossas expectativas, no «outro lado» dos nossos interesses. Jesus é o «outro lado» da nossa vida: o melhor lado da nossa vida, o lado da verdade, o lado do bem, o lado da justiça, o lado do amor.
- Na manhã daquele «dia seguinte», a multidão que tinha sido alimentada conseguiu passar para o «outro lado do mar». Mas ainda não tinha conseguido passar totalmente para o «lado» de Jesus. Aquela gente ainda não tinha percebido quem era Jesus e até estava convencida do que Jesus não era. Aquela gente, afinal, procurava Jesus não por causa de Jesus, mas por causa de si.
Jesus faz notar que a multidão estava equivocada. Aquela gente estava com a pessoa certa, mas por razões erradas. A actividade de Jesus não é de natureza biológica, mas teológica. Mais do que encher o estômago, o que Jesus pretende é (pre)encher a vida.
C. Não um Jesus à nossa maneira, mas nós à maneira de Jesus
- Qual é o Pão que Jesus nos oferece? É o Pão do amor, da partilha e do serviço. É este Pão que faz nascer — e multiplicar — os outros pães. Acontece que a tentação do imediatismo não é de agora. Já naquele tempo, o entendimento fixava-se mais no significante que no significado.
Falta perceber que Jesus não é apenas o último recurso. Jesus é, com toda a propriedade, o único percurso. Não basta, por isso, procurar Jesus, embora esse seja o primeiro — e decisivo — passo. Mas é fundamental fazer caminho com Jesus, aderindo à Sua proposta de vida.
- Não podemos procurar Jesus para resolver os nossos problemas. Devemos procurar Jesus para irmos mais além dos nossos problemas. Devemos procurar Jesus para seguir Jesus, para fazer nossa a vida de Jesus. Daí que Jesus nos deixe um aviso: é preciso encontrar não só o alimento para matar a fome dos pães para a vida, mas sobretudo o alimento que permita saciar a fome do Pão da Vida.
É necessário perceber que, mesmo perto de Jesus, podemos não entender o essencial sobre Jesus. Pode acontecer que, mesmo perto de Jesus, queiramos um Jesus à nossa maneira em vez de sermos nós a ser à maneira de Jesus. A multidão, ao preocupar-se apenas com a procura do alimento material, está a esquecer o fundamental: o alimento que dá a vida eterna. Tal alimento é o próprio Jesus (cf. Jo 6, 27).
D. Importante é «comer» Jesus
- O que é preciso fazer, então, para receber esse alimento, para comer desse pão? Esta é a pergunta daquela multidão (cf. Jo 6, 28). A resposta é inequívoca: é preciso aderir a Jesus (cf. Jo 6, 28). É que, no fundo, aquela multidão tinha beneficiado da acção de Jesus, mas mostrava que ainda não estava disposta a seguir Jesus. Não basta comer o Pão; é determinante deixarmo-nos transformar pelo Pão que comemos.
Todavia, os interlocutores de Jesus ainda não estão convencidos de que esse pão garanta a vida eterna. E dão até o exemplo dos seus antepassados, que comeram um pão vindo do céu — o maná — e, mesmo assim, morreram (cf. Jo 6, 31). Custa-lhes aceitar que a vida eterna resulta do amor, do serviço, da partilha. O maná não é o pão que sacia a fome de vida eterna. O pão que sacia a fome de vida eterna é o próprio Jesus (cf. Jo 6, 32-33).
- O importante não são gestos espectaculares, que deslumbram e impressionam, mas não mudam nada. O importante é acolher a proposta que Jesus faz e vivê-la nos gestos simples de todos os dias. É em cada dia que somos alimentados pelo Pão da vida. O Pão da vida é Jesus.
De facto, «Eu sou o Pão da vida» (Jo 6, 35) é uma fórmula de revelação, ou seja, uma afirmação de identidade. Jesus é não só o portador do pão, mas o próprio pão. Só em Jesus saciamos a nossa fome. Ele é a resposta total para a pergunta total. Quem se alimenta de Jesus nunca mais terá fome nem sede (cf. Jo 6, 35). Alimentarmo-nos de Jesus implica escutar a Sua Palavra, acolher a Sua proposta, enfim, incorporar toda a Sua vida.
E. Ninguém envelhece quando está com Jesus
- Tudo se transforma, por conseguinte, a partir de Jesus. Entende-se, pois, que São Paulo nos convide a deixar a vida antiga e os esquemas do passado, para abraçarmos definitivamente a vida nova de Jesus. Para sinalizar esta mudança, Paulo recorre à linguagem do «homem velho» e do «homem novo». O «homem velho» é o homem que ainda não aderiu a Jesus. Trata-se de uma vida marcada pela mediocridade, pela futilidade (cf. Ef 4, 17), pela corrupção e pela submissão aos «desejos enganadores» (Ef 4, 22). Já o «homem novo» é o homem que encontra Jesus Cristo e que aderiu à Sua proposta. É alguém que vive na verdade, na justiça e na santidade verdadeiras (cf. Ef 4, 21.24).
O Baptismo é o sacramento da transformação do «homem velho» em «homem novo». O próprio rito do Baptismo sugere esta transformação: o imergir na água significa o morrer para a vida antiga de pecado; o emergir da água assinala o nascimento de um outro homem, purificado do egoísmo, do orgulho, do pecado.
- Sabemos, porém, que, apesar de renovados pelo Baptismo, continuamos a ceder ao «homem velho». Daí a necessidade de «uma segunda tábua de salvação depois do Baptismo». O Sacramento da Confissão é, como diziam os antigos, uma espécie de «Baptismo laborioso». Quem se confessa mostra que não desiste da renovação da sua vida.
O «homem novo» tem de ser alimentado todos os dias. A conversão não é só para uma vez. É para sempre!