A. Até Deus quis ter mãe
- Qual terá sido a maior invenção de sempre? Segundo Michel Quoist, a maior invenção de Deus foi «a Sua Mãe». E a verdade é que, como notou Tolentino de Mendonça, «a coisa mais parecida com os olhos de Deus são os olhos de uma mãe. São um raio-X infalível. Não ficam apenas a olhar as aparências, antes penetram naquele fundo secreto e silencioso da vida […], respeitando, contudo, e com que delicadeza, o seu segredo».
São olhos — os olhos da Mãe — que sabem a canseiras, a doação, a ternura e a perdão. São olhos — os olhos da Mãe — que vêem e deixam ver. São olhos — os olhos da Mãe — que amam, mas amam a valer. São olhos — os olhos da Mãe — que, mesmo quando já não enxergam, continuam a ver. Os olhos da Mãe vêem tudo, vêem antes, vêem sempre. Vêem o que mais ninguém consegue ver. Porque vêem com amor, só com amor, sempre com amor!
2. Assim, sendo, quem não concordará com Almeida Garrett quando afirma que «a mais bela obra de Deus é a mãe»? Tanto assim que até Deus quis ter uma, até Deus quis ter mãe. Deus, que é Pai, quis que, na terra, o Seu Filho também tivesse Mãe.
Foi, pois, pela Mãe que Deus mais nos mostrou a Sua paternidade. Fica, então, claro que a paternidade divina não é masculina nem feminina. Mas no mundo a paternidade de Deus torna-se presente pelo pai e pela mãe. Era por isso que o teólogo Jürgen Moltmann nos falava da «paternidade maternal de Deus». E foi por isso que, para espanto de muitos, o saudoso Papa João Paulo I, a 10 de Setembro de 1978, não hesitou em dizer que «Deus é Pai e, ainda mais, Mãe»!
B. Há tanto de Deus no amor de Mãe
3. Deus é Pai, é o Pai que nos ama com um amor de Mãe. Ao Pai agradeçamos sempre o dom da nossa Mãe. Não foi, aliás, a nossa Mãe a primeira a falar-nos de Deus Pai? Olhemos para a nossa Mãe e vejamos como é imenso o amor de Deus Pai. O amor materno é um amor divino, é um amor que vem de Deus.
Almeida Garrett assim o notou quando escreveu: «O mais puro do fogo dos céus» ateia na Mãe «essa chama de luz cristalina:/ é a luz divina/Que nunca mudou,/É luz... é a Beleza/Em toda a pureza/Que Deus criou».Há, na verdade, tanto de Deus no amor da Mãe. Como bem percebeu Carlos Drummond de Andrade, «Mãe não tem limite,/é tempo sem hora,/luz que não apaga/quando sopra o vento/e a chuva desaba,/veludo escondido/na pele enrugada».
- Se não há nada mais belo do que ser mãe, não há coisa mais gratificante do que ter mãe. Nem todos podem ser mãe, mas todos deveriam saber o que significa ter mãe. É por tal motivo que o mais triste é perder a mãe. Só que a mãe nunca se perde. Nem a morte faz perder a mãe. Aqui, no tempo, ou além, na eternidade, mãe nunca deixa de ser mãe!
Mãe é amor que nunca passa, mesmo depois de tudo passar. É ao amor da Mãe que se regressa quando todas as promessas de amor cessam. O amor de Mãe é o amor da vida, é o amor para a vida. Razão tem quem escreveu aquele epitáfio que se encontra, em forma de verso, no cemitério da minha terra natal: «Minha Mãe era uma santa/por quem sempre rezarei/pois amor igual ao dela/ nunca mais encontrarei»! Mãe! Não estraguemos obra tão bela e, até ao fim, mostremos o nosso amor por ela!
C. Há quem não saiba ser mãe e há quem não saiba ter mãe
- Infelizmente, há quem não saiba ser mãe e há quem não saiba ter mãe. Como é possível que, como aconteceu no passado dia 9 de Abril, uma mãe tenha matado — à facada — o seu filho logo após o nascimento? Merecerá esta mulher o nome de mãe? E como é admissível, como sucedeu no pretérito dia 22 (também) de Abril, que um filho tenha assassinado — à pancada — a sua idosa mãe? Merecerá este indivíduo o nome de filho?
Poderá haver muitas explicações, mas jamais encontraremos uma única justificação. Só numa sociedade superlativamente doentia é que uma mãe mata o filho e um filho mata a mãe. Só uma sociedade que esqueceu Deus — e o Seu amor — é capaz de assistir a actos tão tresloucados. Não estraguemos o que há de mais belo na vida: o amor da mãe pelo seu filho e o amor do filho pela sua mãe.
- Aprendamos com Deus o amor pelos filhos e amor pelos pais. Neste mês de Maio — que rima com Mãe —, aprendamos, com Maria e com Jesus, a encher as nossas famílias com raios de luz.
Muitos se lembrarão, neste dia, de que têm mãe. Mas quantos não esquecem, nos outros dias, a sua mãe? Uma mãe é capaz de cuidar de muitos filhos e, por vezes, muitos filhos não cuidam de uma mãe. Uma mãe pode não ter muitos lugares em casa, mas tem sempre imensos lugares no seu coração.
D. O maior depósito do amor de Deus no mundo
- No Dia da Mãe — que é também Dia do Pai —, é importante que todos aprendamos a ser filhos. Este não é um dia para ser comprimido em 24 horas. O Dia da Mãe é um dia esticado, uma manhã dilatada, uma primavera estendida. Este é um dia em que o sol nunca se põe. Este é o dia que nunca anoitece. Mãe nunca adormece. Mesmo a dormir, ela dorme como mãe. Daí que os gestos de gratidão sejam sempre um mínimo diante do máximo: diante do máximo de doação, do máximo de amor.
Mãe é a mão que nos livra da queda. Mãe é o colo que nos ampara na fraqueza. Mãe é a luz que nos indica o caminho e nos acompanha na estrada. Mãe é como um eco de Deus no mundo. Dizer «obrigado» é dizer pouco para lhe agradecer tanto. Mas talvez seja tudo o que nos resta para lhe dizer. Não lho digamos, contudo, só com os lábios. Digamos «obrigado» à nossa Mãe com a nossa vida, com a nossa presença, com o nosso auxílio, com o nosso reconhecimento, com a nossa oração.
- Que melhor exegese do que a Mãe para compreender o que nos é dito no Evangelho deste Sexto Domingo da Páscoa? Mãe é escola de amor, de um amor que «vem de Deus», como nos testemunha São João (1Jo 4, 7). Que encontramos nós na Mãe senão amor? Este amor é um espelho de Deus que «é amor» (1Jo 4, 8). Deus, além de enviar ao mundo o Seu Filho (cf. 1Jo 4, 9), enviou ao mundo as mães para os Seus filhos.
As mães são o primeiro — e seguramente o maior — depósito do amor de Deus no mundo. As mães amam com um amor que não pode ser delas. O amor de Mãe só pode vir de Deus. É nas mães que mais vemos realizada a afirmação de Jesus: «Não há maior prova de amor do que dar a vida» (Jo 15, 13). Se amarmos como as mães costumam amar, estaremos certamente a aprender a amar como Cristo nos amou (cf. Jo 15, 12).
E. As mães são um «Evangelho vivo»
- Só o amor aproxima de Deus. Deus é amor e, por tal motivo, o amor é divino. É por isso que, na pauta para o juízo final, Jesus propõe, como critério supremo, não o amor da ciência, mas a ciência do amor (cf. Mt 25).
Os cristãos da primeira hora eram conhecidos pelo empenho que punham na vivência do «mandamento novo do amor». Que os cristãos desta nossa hora não esqueçam o mandamento que nunca deixa de ser novo. Anunciemos a todos o Deus do amor. E depositemos em cada pessoa um pouco do incomensurável amor de Deus.
- Um pouco de amor nunca é pouco. Um pouco de amor é sempre muito. Em Deus, o amor é tudo e para sempre. É assim, aliás, que as mães se comportam para com os filhos. As mães são as «profissionais do amor». Mesmo quando não se sentem amadas, elas nunca deixam de amar. Nem a ingratidão apaga o amor no seu coração.
É por isso que as mães são um «Evangelho vivo». Não deixemos, então, de ler — e meditar — o «Evangelho segundo as mães». Vivamos o Evangelho olhando para as mães, a começar por Maria, modelo de todas as mães. Foi na Sua carne que Jesus Cristo Se fez carne. Que na nossa vida deixemos que Jesus Se faça vida. Hoje. Amanhã. E sempre!