A. Quando a missão acontece, o número de discípulos cresce
- Um belo quadro nos é — hoje — mostrado. O Livro dos Actos dos Apóstolos mostra-nos a grande vitalidade da Igreja nos seus começos. O «número dos discípulos ia aumentando» (Act 6, 1). Quando a missão acontece, o número dos discípulos cresce. E quando a missão é feita com paixão, há sempre uma resposta positiva à missão.
Ao mesmo tempo, é interessante notar a extrema agilidade da Igreja na forma de lidar com novas situações. Eis um poderoso sinal da acção do Espírito Santo e da fidelidade da Igreja a essa mesma acção. Como os cristãos se expandiam, os serviços também cresciam. O princípio era: para novas missões, novos missionários; para novos trabalhos, novos trabalhadores; para novos serviços, novos servidores.
- A agregação de sete colaboradores dos Apóstolos — conhecidos como «diáconos» — não nos permite conhecer somente o ministério dos diáconos; permite-nos reconhecer, desde logo, a profundidade do ministério dos Apóstolos.
Importa não perder de vista — como, aliás, recitamos no Credo — que a Igreja, além de una, santa e católica, é apostólica. Ela está alicerçada na missão dos Apóstolos. E foi precisamente para não se afastarem da sua missão que os Apóstolos resolveram escolher alguns colaboradores.
B. É a oração que gera a missão
3. Isto significa, antes de mais, que a missão não é exclusivo de ninguém, mas tarefa de todos. Ser cristão é igual a ser missionário. Foi o que, de resto, nos recordou o Concílio Vaticano II ao proclamar que «a Igreja é, por natureza, missionária».
Assim sendo, na Igreja não há activos de um lado e passivos do outro. Na Igreja, não há agentes de um lado e destinatários do outro. Na missão da Igreja, todos somos agentes e todos somos destinatários. Todos nós temos necessidade de ser evangelizados e todos nós temos o dever de evangelizar.
- Os Apóstolos chamaram outros porque não admitiam distanciar-se do seu ministério. E em que consistia o seu ministério? «Oração e serviço da Palavra». É o que nos chega através do versículo 4 deste capítulo 6 do Livro dos Actos dos Apóstolos. O ministério consiste, antes de mais e acima de tudo, na oração e no serviço do Palavra. Eis o que não pode jamais ser esquecido ou negligenciado. Sem oração, não há missão. Sem anúncio da Palavra, não se faz missão.
O próprio Livro dos Actos dos Apóstolos, a abrir o capítulo 13, atesta claramente que é a oração que gera a missão. É na oração que Deus suscita o envio. É na oração que Deus atrai alguns para que, através dos Seus enviados, possa atrair outros. A missão é atracção. É atracção a partir da oração. Por sua vez, esta atracção é para suscitar mais oração. Os que são atraídos por Deus são sempre por Deus acolhidos.
C. Novos serviços, novos servidores
5. Sem oração, a missão corre o risco de não passar de agitação. Sem oração, a missão não passa de aparência de missão. A missão não é para gerar impacto num determinado momento, mas para provocar efeito na totalidade da vida. A missão consiste numa contínua transformação. A missão visa sempre isto: centrar toda a nossa vida em Jesus Cristo.
É a partir deste centro que tudo faz sentido. É a partir de Cristo que conseguimos amar e servir os outros. É partir de Cristo que somos capazes de olhar para os mais distantes como próximos. É a partir de Cristo que estamos em condições de fazer de cada pessoa um irmão.
- O «serviço das mesas» (Act 6,2) era, sem dúvida, importante e, pelos vistos, tornou-se bastante urgente. Como os cristãos iam aumentando em número, também cresciam as necessidades de alguns dos novos membros. Certamente os Apóstolos começaram por atender, eles mesmos, a essas necessidades. Mas depressa notaram também que estavam a retirar tempo ao essencial da sua missão, isto é, à oração e ao anúncio da Palavra.
Foi neste contexto que convocaram uma espécie de «assembleia geral» dos cristãos para colocarem o problema e apresentarem a solução. A solução consistiu em propor à referida assembleia que, para o «serviço das mesas», escolhesse «sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria» (Act 6, 3). Era a esses «sete homens» que caberia coordenar o serviço da caridade, o apoio aos mais carenciados.
D. O ministério mergulhado do mistério
7. A proposta teve boa aceitação. E foi assim que, para a nova missão sócio-caritativa, foram escolhidos Estêvão, Filipe, Prócoro, Nicanor, Tímon, Pármenas e Nicolau (cf. Act 6, 5). Do primeiro é dito que se tratava de um «homem cheio de fé e do Espírito Santo»; do último é referida a sua proveniência: Antioquia. Mas, curiosamente, estes sete homens não se dedicaram apenas ao «serviço das mesas». Até eles se destacaram também pela pregação da Palavra, como se pode conferir pelo caso de Santo Estêvão, que deu o sangue por causa do seu testemunho de Cristo (cf. Act 6, 8-7, 60).
Como acabámos de ouvir, «os Apóstolos oraram e impuseram as mãos sobre eles» (Act 6, 6). É, claramente, uma forma de ordenação. Pela oração e imposição das mãos, estes sete homens foram ordenados — isto é, receberam a ordem — para realizar a missão. É, pois, o mistério de Deus que gera o ministério entre os homens.
- É preciso mergulhar no mistério para bem realizar o ministério. O mistério não é o que se esconde (isso é o enigma); mistério é o que se revela. O mistério revelado na Igreja é o amor do Pai, do Filho e do Espírito Santo. O mistério da Igreja é a Santíssima Trindade. É este mistério que suscita muitas formas de ministério. Foi assim no princípio e há-de ser assim até ao fim. Na Igreja, o mistério é a essência e o ministério é a consequência. O ministério nasce do mistério, vive do mistério e encaminha para o mistério.
Fora do mistério, não temos acção; teremos apenas activismo. E o activismo é espiritualmente paralisante. O ministério apostólico remete sempre para o mistério. Daí a necessidade que os Apóstolos sentiram de se entregarem totalmente — sublinhe-se o «totalmente» — à oração e ao serviço da Palavra (cf. Act 6, 4). É sobretudo na oração e no serviço da Palavra que resplandece o mistério onde assenta todo o ministério.
E. Servir é o caminho de Jesus; servir é o Caminho que é Jesus
9. Em homenagem ao número de colaboradores dos Apóstolos na Igreja de Jerusalém, houve um tempo em que os diáconos nas igrejas locais eram sempre sete. A designação «diáconos» impôs-se por causa da natureza da sua missão. Eram «diáconos» porque exerciam a «diaconia», ou seja, o serviço. No fundo, está aqui a natureza de todo o ministério: servir, estar ao serviço. É por isso que, ainda hoje, o diaconado é o primeiro grau do Sacramento da Ordem. É uma forma de vincar, de forma expressiva e impressiva, que todo o ministério é serviço. E, nesta medida, a diaconia subsiste sempre, mesmo para lá do diaconado.
A importância dos diáconos era tal que, na Igreja de Roma, eles eram os principais cooperadores do Bispo, isto é, do Papa. E, como é sabido, muitas vezes, era o primeiro dos diáconos de Roma a ser eleito Papa. Havia, aqui, uma lógica interna muito forte. É natural que o «servo dos servos de Deus» fosse escolhido entre os que, mais de perto, colaboravam com o seu serviço.
- Está aqui o caminho de Jesus, está aqui o caminho que é Jesus. No Evangelho, Ele apresenta-Se como «o Caminho» (Jo 14, 6). Ora, o caminho de Jesus é servir, como Ele próprio alertou: «Eu estou no meio de vós como quem serve» (Lc 22, 27). A esta luz, o nosso caminho com Jesus não pode ser outro senão servir: «Como Eu fiz [adverte Jesus], fazei vós também» (Jo 13, 15). Se nós somos discípulos de Jesus e se o discípulo deve ser como o seu mestre (cf. Mt 10, 24), é pelo serviço que nos identificamos com o Servidor.
Como Jesus é a transparência do Pai — «quem Me vê, vê o Pai» (Jo 14, 9) —, cada um de nós é chamado a ser a transparência de Jesus. E é sempre pelo serviço — e pelo amor — que estaremos perto do Senhor!