A. De Deus não vem a morte
- Nada fazemos para nascer e, em princípio, fazemos tudo para não morrer. É por isso que a morte dói, é por isso que a morte mói. Dir-se-ia que a morte começa a doer muito antes de acontecer. No fundo, a morte começa a doer desde sempre. E as perguntas sobre a morte nunca deixam de (nos) moer.
Porquê morrer? Porquê a morte? A explicação biológica, embora irrenunciável, não nos satisfaz. Sabemos, de facto, que os seres vivos têm princípio, meio e fim. Tudo tem um prazo de validade. Até as estrelas morrem. Se até o espaço que nos abriga é finito, como é que nós haveríamos de ser infinitos? Apesar de tudo, a inquietação não pára e as perguntas sucedem-se.
- Os textos deste Domingo não entram em questões científicas nem pretendem resolver problemas metafísicos. Mas pressupõem que as pessoas se interrogassem e questionassem o próprio Deus. Daí que o Livro da Sabedoria deixe bem claro que «não foi Deus quem fez a morte»(Sab 1, 13). Pelo contrário, olhando para o Evangelho, Deus é a única saída para a morte.
Sem Deus, vivemos para morrer. Em Deus, morremos para viver. Sem Deus, até em vida se morre. Em Deus, até na morte se vive.
B. De Deus (só) vem a vida
3. A Primeira Leitura garante que Deus dá o ser a todas as coisas e «o que nasce no mundo destina-se ao bem»(Sab 1, 14), não ao mal. Para o autor sagrado, Deus criou «o homem para ser incorruptível», fazendo-o «à imagem do que Ele é em Si mesmo»(Sab 2, 23).
A morte vem de outro lado, de outra proveniência, não de Deus. Não é a morte que agrada a Deus, não é com a morte que se louva a Deus, não é matando (mesmo que se mate em nome de Deus) que se rende homenagem a Deus. É preciso proclamar que Deus é o autor — e doador — da vida. Deus cria a vida e restaura a vida, quando esta está em perigo de se apagar. Dá e restaura a vida quando a vida está perdida, como testemunha o Evangelho deste Domingo.
- Como resposta à Primeira Leitura, o Salmo 30 exalta Deus, reconhecendo que Ele nos faz reviver quando já descíamos à cova. (cf. Sal 30, 3). Trata-se de um salmo que exprime a experiência de Deus como alguém que quer a vida das pessoas. Em Jesus ressuscitado, esta oração encontra toda a sua verdade. Ou seja, para todos os que acreditam em Cristo, a morte não é o fim. Jesus ressuscitado não nos faz evitar a morte, mas ensina-nos — e ajuda-nos — a vencer a morte.
Neste sentido, salta à vista que todo este 13º Domingo celebra a vida mais forte que a morte, celebra Deus como alguém entranhadamente apaixonado pela vida. Não há dúvida de que a morte é forte, tremendamente forte. Só que a vida é ainda mais forte. Não parece, mas nem tudo é como parece. E, mesmo não parecendo, a vida é muito mais forte que a morte. Convém, no entanto, perceber que a vida mais forte que a morte é a vida com Deus, a vida com Deus em Jesus Cristo.
C. Jesus é o Deus que restaura a vida
5. Jesus andou pelo mundo a oferecer a vida: devolvendo a vida a quem a perdera e melhorando a vida de quem estava em dificuldade. A ressurreição da filha de Jairo e a cura da mulher com hemorragia são um misto de realidade e sinal. Mostram a preocupação de Jesus pelas pessoas e constituem sinal da presença de Jesus junto das pessoas.
Jesus é a nossa ressurreição, Jesus é o sentido para a nossa vida. Ele é o Médico e o medicamento. Ele é a cura e o Curador. Em suma, Ele é a salvação e o Salvador. Na Sua vida, encontramos a nossa vida. Ele dá a Sua vida para que nós tenhamos sempre vida, para que nós tenhamos melhor vida.
- Jesus é, pois, sumamente generoso. Como reconhece S. Paulo, Ele, que era rico, fez-Se pobre por nossa causa, para nos enriquecer pela Sua pobreza (cf. 2Cor 8, 9). Não é a riqueza que nos torna ricos. Há certas riquezas que só empobrecem. Pelo contrário, há uma pobreza que enriquece. Trata-se da pobreza que parte de cada um e reparte com os outros. Trata-se da pobreza que não sobrecarrega, mas alivia. Trata-se da pobreza que percebe que aquilo que sobra a alguns faz falta a muitos. Trata-se, portanto, de uma pobreza que nos humaniza porque nos fraterniza: faz de nós mais humanos porque mais irmãos. Paulo faz um apelo à justa distribuição de bens pensando no exemplo de Jesus, que passou a vida a semear o Bem.
- D. O caminho é tocar Deus em Jesus
- 7. Jesus não foge das pessoas. Jesus anda de margem para margem (cf. Mc 5, 21), sempre sensível às pessoas que estão nas margens, às pessoas que são marginalizadas. Até à beira-mar, Ele é procurado pelas pessoas (cf. Mc 5, 21). Nesta altura do ano, muita gente já se encontra também à beira-mar. Mesmo à beira-mar, é importante procurar Jesus. Férias boas não são «férias de Deus», mas «férias com Deus».
Mesmo à beira-mar, coloquemos nas mãos de Jesus os nossos problemas como fez Jairo e como fez a mulher com hemorragias. Esta mulher tocou em Jesus. Hoje nós podemos tocar em Jesus: na Palavra, no Pão e em cada Irmão.
- Jesus é Deus que Se deixa tocar. «Sê curada», diz Jesus à mulher (cf. Mc 5, 34). Esta palavra é também um elogio da fé: «Foi a tua fé que te salvou»(Mc 5, 34). A cura, isto é, a mudança de vida, é uma consequência da fé, que é surge assim como fonte de felicidade.
É a fé nos faz recomeçar depois de tudo parecer terminar. É a fé que nos faz levantar depois de cair. O que Jesus diz à filha de Jairo também é dito a cada um de nós: «Levanta-te»(Mc 5, 41). É uma palavra que evoca a ressurreição, o novo surgir da vida, o amor divino que nos coloca de pé. A única condição que Jesus nos põe é a mesma que pôs ao pai desta menina: «Basta que tenhas fé»(Mc 5, 36). A fé é o bastante, mesmo que a nossa fé nunca seja bastante. Basta que tenhamos fé e que confiemos, e que nos entreguemos e que nos levantemos!
E. Ninguém fica sem resposta
9. Há um pormenor curioso a ligar estas duas beneficiárias dos milagres de Jesus: o número 12. Com efeito, a mulher tinha hemorragias há 12 anos e a menina tinha morrido quando tinha 12 anos, isto é, a idade em que se devia tornar mulher. Para o povo de Israel, o percurso destas duas mulheres era sinal de um fracasso. Uma, ao perder o seu sangue, estava a perder o princípio de vida segundo a mentalidade semítica. A outra perdia a vida, precisamente na idade em que se preparava para a transmitir. De facto, era tradição em Israel casar-se muito cedo. Jesus, ao curar as duas mulheres, permite-lhes assumir a sua vocação de mães.
Por conseguinte, estas duas mulheres representam a Igreja, na sua vocação maternal de dar — e de alimentar — a vida em Cristo. Se repararmos, existem neste texto alusões aos santos mistérios da Igreja: Jairo pede a Jesus para impor as mãos, a fim de salvar a sua filha (cf. Mc 5, 23). Como sabemos, toda a preparação para o Baptismo está sinalizada pela imposição das mãos. Por sua vez, ao levantar a jovem, Jesus toma-a pela mão (cf. Mc 5, 41). Também o diácono fazia sair da água o baptizado, tomando-o pela mão, para que fosse desperto para a vida em Deus. Em seguida, Jesus pede que se dê de comer a esta jovem ressuscitada da morte (cf. Mc 5, 43). Trata-se de uma referência à Eucaristia que se segue ao Baptismo.
- Em conclusão: deixemo-nos guiar sempre pela fé. Na fé, abramos o coração a Jesus e não tenhamos medo sequer em tocar Jesus. Às vezes, é preciso suplicar como Jairo. Outras vezes, pode ser mais recomendável não dizer nada como a mulher com hemorragias. Em qualquer caso, o importante é confiar naquele que veio para nos levantar, para nos curar, enfim, para salvar a nossa humanidade ferida.
Ninguém fica sem resposta. Jesus está atento à situação concreta das pessoas. Nada Lhe passa despercebido. Cada um de nós tem um lugar reservado no Seu coração!