1. Na sua infatigável peregrinação pelo mundo, a esperança ainda não desistiu de chegar a todos os lugares nem de visitar todos os corações.
Todos a querem. No fundo, quem não quer ter esperança? Mas facilmente a trocamos pelo abatimento, pelo torpor, pela apatia, pela desesperança.
Todos passamos pela esperança e a esperança passa por todos. Mas quem repara nela? Quem lhe dá acolhimento? Afinal, onde vive a esperança hoje?
2. A esperança seduz, cativa, encanta, motiva, mas não encontra quem lhe dê guarida por muito tempo.
E o mais espantoso é notar que é quando ela se torna mais necessária que ela mais se afasta. Ou é afastada.
3. Nesta altura, todos parecemos órfãos de esperança. Sentimos que ela se ausentou de nós ou que nós nos ausentamos dela. E o mais preocupante é que a sua perda parece gerar perdas em cascata.
Ao perder a esperança, perdemos a capacidade de intervir, a vontade de mudar, a determinação em resistir. Ao perder a esperança, verificamos que começamos até a perder a fé.
4. É assim que este Ano da Fé tem de ser também um Ano da Esperança. Quando não se espera não se acredita. Quando não se acredita não se espera. A fé alimenta a esperança e a esperança ilumina a fé. A fé faz aterrar a esperança e a esperança faz voar a fé.
A esta luz, percebe-se que, juntamente com a Caridade, a Fé e a Esperança constituam um todo a que denominamos virtudes teologais.
5. O Advento evoca a longa espera e a prolongada esperança na chegada de Deus ao mundo.
Como se pode ver na Bíblia, a esperança não isenta de dor. A esperança é precisamente o que leva a não desistir na dor nem a soçobrar perante o aperto da dor.
6. Há momentos em que só parece ficar a esperança. Nessas alturas, há quem a veja como um expediente.
Há quem aponte a esperança como a atitude dos passivos, daqueles que não agem, que se resignam.
7. A esperança não é, porém, um analgésico ou um mero tranquilizante. A esperança é um despertador, um alerta.
A esperança, habitualmente, não está em sintonia com a evidência. Há muitas evidências que são desmentidas pela esperança.
8. É certo que a realidade tem muita força. Mas a esperança é o que nos leva a não abdicar de a transformar.
A esperança não é, por isso, própria dos pusilânimes. A esperança é a âncora dos sonhadores, dos lutadores, dos persistentes.
9. Há quem pretenda agir apenas quando tem garantias de êxito. O cálculo, para muitos, degolou a esperança. Outros, no pólo oposto, substituem-na pela mera ilusão.
Sucede que a esperança não é calculismo e é muito mais do que ilusão. A esperança é aventura, é exposição ao perigo.
A esperança não nos inibe da possibilidade de naufrágio. Mas nem essa possibilidade nos há-de obstruir. Só chega ao alto quem se dispõe ao risco da queda.
10. A esperança está, pois, em condições de tingir de azul estas noites de breu. A esperança costuma acenar-nos com maior intensidade nas horas de provação. É ela que nos faz ver que, como dizia Sto. Agostinho, «é quando parece que tudo acaba que tudo verdadeiramente começa».
É por isso que — alertava Vergílio Ferreira — «quando a situação é mais dura, a esperança tem de ser mais forte».
Daí que o Ano da Fé seja uma oportunidade para reaquecer a esperança. Que, tantas vezes, deixamos arrefecer!