1. Ainda nos seus começos, o Ano da Fé presenteia-nos, desde já, com duas certezas.
A primeira é que a Fé não há-de ser apenas para este ano. E a segunda é que este ano não pode ser apenas de fé.
2. A fé é para toda a vida e não somente para um ano na vida. E este ano, para revitalizar a fé, tem de nos ajudar a perceber que a fé nunca pode ficar só pela fé. A fé nunca é fé só na fé. A fé só é fé pelo amor. A fé será sempre fé no amor.
3. A fé não nos remete unicamente para a existência de Deus. A fé remete-nos sobretudo para o ser de Deus. E o ser de Deus é amor. Só amor. Nada mais que amor.
Para falar de Deus, Sto. Agostinho nunca saiu deste registo. Para ele (e para muitos com ele), o Pai é o amante, o Filho é o amado e o Espírito Santo é o amor.
4. Crer em Deus é muito mais do que acreditar que Deus existe.
Crer em Deus é acreditar que Deus ama, que Deus existe porque ama, que Deus existe para amar. Crer em Deus é acreditar que Deus é amor (cf. 1Jo 4, 8.16).
No fundo, crer em Deus é crer no amor. Consequentemente, crer é amar e amar é crer. Quem não crê raramente ama e quem não ama dificilmente crê.
Entende-se, assim, que a profissão de fé do povo eleito não seja introduzida pelo verbo crer, mas pelo verbo amar. «Amarás o Senhor, Teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças» (Deut 6, 4-9).
5. A fé reclama a totalidade do ser. Exige a razão, mas requer muito mais que a razão. Nem sempre a razão tem amor. Mas o amor acaba sempre por ter razão. O amor consegue ver mais do que a razão.
Pertinente foi Óscar Wilde quando escreveu que «o amor é mais sábio que a sabedoria».
6. S. Paulo reconhece — e proclama — que o lugar da fé é o amor (cf. Gál 5, 6). É por isso que, como lembrava Hans Urs von Balthasar, «só o amor é digno de fé». É o amor que torna credível a fé.
7. Enzo Bianchi avisa: «O crente não deveria levantar apenas o problema dos motivos do seu crer, mas também o problema dos seus frutos». E o maior fruto da fé é o amor.
Daí que este Ano da Fé tenha de ser também (e intensamente) o Ano do Amor. Como refere Pedro Laín Entralgo, a fé desagua necessariamente no amor: num amor constante e num amor instante.
É o amor que nos faz ver que cada homem está rodeado de «outros como ele» e não apenas de «outros para além dele».
8. Passa por aqui o maior legado daquele que Bartomeu Benassar denominou «o Deus humaníssimo de Jesus».
E o certo é que o amor fez mais pela difusão do Evangelho do que os maiores tratados de Teologia. Tertuliano, um dos escritores cristãos mais antigos, notava que os outros, olhando para os cristãos, diziam: «Vede como eles se amam»! Ou seja, vede como eles vivem o que crêem.
9. O amor é o ápice da fé. É pelo amor entre as pessoas que se autentica o amor a Deus. Como recorda Karl Rahner, «o amor para com o próximo é o modo concreto de pormos em prática o amor para com Deus».
10. No seu recente livro O triunfo do Cristianismo, o sociólogo da religião Rodney Stark pergunta: «Como foi possível que uma obscura seita judia se tenha tornado na maior religião do mundo?» E a resposta é inequívoca. O sucesso do Cristianismo deveu-se sobretudo à vivência do amor.
Daí que Juliano, ao abandonar a Igreja, tenha declarado que da religião cristã só queria conservar uma coisa: o amor!
E deste modo não estaria, afinal, a manter a fé?