1. Já houve quem decretasse que a história tinha chegado ao «fim». Verdade seja dita que também não faltou quem considerasse que a mesma história estava somente a passar por mais um dos seus muitos «intervalos».
Hoje, salta à vista que Vergílio Ferreira estava mais certo que Francis Fukuyama. De facto, sentimos todos que «a história é feita de intervalos». E, ao mesmo tempo, notamos que aquilo que está a chegar ao fim não é a história; é um dos seus frequentes intervalos.
2. Há duas décadas, sabíamos que, como assinalava Alvin Toffler, éramos «a última geração de uma civilização velha e a primeira geração de uma civilização nova».
Se, entretanto, era difícil tipificar devidamente a civilização que decaía, tornava-se praticamente impossível descrever a civilização que começava a emergir.
Eis, porém, que a primeira década do século XXI dissipou todas as dúvidas. E esta segunda década do século XXI está a dar a resposta total.
3. Oswald Spengler falara, em 1917, sobre o declínio do ocidente. Mas foi em 2001, mais propriamente a 11 de Setembro, que acordámos (tragicamente!) para a sua assombrosa fragilidade. Já a crise económica, que nos invade desde 2008, parece torná-la irreversível.
Só que desta vez é nítido que não é apenas o ocidente que declina. É também o oriente que domina. O foco está sobretudo na China, que tem dinheiro, poder, ambição e gente. Tudo o que a ocidente parece escassear.
Para já, o mundo é pilotado por uma espécie de «Chimérica», um globo dominado pela sobriedade chinesa e pelo esbanjamento americano.
4. Há, contudo, quem, como Gilles Lipovetski, veja a globalização como uma extensão do ocidente, como uma espécie de «ocidente mundializado». A «cultura-mundo» será a cultura do ocidente estendida à escala planetária.
Assim sendo, não deixa de ser paradoxal verificar como o oriente se impõe quando se ocidentaliza. Ou seja, quando se descaracteriza.
Mas o paradoxo sempre foi a dominante da vida das pessoas e da história dos povos!
5. Seja como for, o que avulta é que estamos no limiar daquilo a que podemos chamar uma «civilização global», em que as decisões são cada vez mais comuns e os comportamentos se apresentam cada vez mais padronizados.
O oriente incorpora, cada vez mais rapidamente, o estilo de vida do ocidente. O ocidente recorre, cada vez mais urgentemente, à ajuda do oriente.
6. Simplificando, dir-se-ia que os PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha) dependem cada vez mais dos BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).
Os PIIGS sinalizam a decadência do ocidente. Os BRIC simbolizam a ascensão do oriente. Do oriente ocidentalizado!
7. É nítido que o oriente parece não hesitar em trocar a identidade pela liderança. O que nele se destacava era o seu fulgor espiritual, a sua visão holística da vida, a sua percepção transcendente da história. Em síntese, a sua mundividência unificadora.
É perturbador verificar que também a oriente se olha para o mundo não como uma comum humanidade, mas apenas (e cada vez mais) como um único mercado!
8. Que papel para a fé no meio de tudo isto?
É interessante registar que as grandes tradições religiosas nasceram a oriente. Hoje, parecem incapazes de transfigurar a paisagem lúgubre do próprio ocidente.
9. Também as religiões precisam de revisitar as suas origens para recuperar o seu fulgor. Para poderem ser uma verdadeira alternativa e não uma mera redundância.
Particularmente, oCristianismo tem uma palavra a dizer, uma missão a desempenhar e, acima ce tudo, uma esperança a propor.
10. Não é por acaso que ele começa em Jerusalém, uma cidade que fica entre o ocidente e o oriente.
Reúne, pois, todas as condições para oferecer as pontes que importa (re)lançar. E os laços que urge (re)fazer!