Eu sei que não têm nada a ver. Mas também é certo que os extremos estão sempre a tocar-se.
Há dois estilos de música que me dizem muito, imenso: a música de que eu gostava antes de aprender (anos 60-70) e a música que aprendi a gostar (toda a clássica, sobretudo Bach).
Uma é a recordação de um tempo. Outra é, simplesmente, intemporal.
Ambas ecoam em todos os momentos da minha vida.
Passamos o tempo a fazer o que nos mandam.
Era bom que passássemos a vida a fazer o que devemos.
Cada vez me convenço mais de que é quase impossível haver uma sintonia entre os dois níveis.
A ordem é estimável, sobretudo quando é justa, o que raramente se verifica. Mas o imperativo da consciência é que desponta como decisivo.
«Há poucos homens sós, isto é, felizes!».
Não haverá uma verdade muito subtil (e soberanamente profunda) neste pensamento de Bernanos?
Há quem faça tudo para estar no lado certo da vida, achando que o lado certo é o lado de cima.
É esse, de facto, o lado do poder, da fama, dos interesses.
Só que não é de cima que se vêem as estrelas. No fundo, o lado certo é o lado de baixo.
É em baixo que se colocam os alicerces. É em baixo que se encontra a raiz. E é em baixo que, como diz Dietrich Bonhoeffer, estão «os marginalizados, os maltratados, os oprimidos, numa palavra, os que sofrem».
De cima só se pode cair. É a partir de baixo que se cresce.
A Bíblia diz que o amor é tão forte como a morte. Mas, pelos vistos, até em vida se pode acabar com ele.
Diz um estudo publicado no Reino Unido que os casamentos acabam porque já não há amor.
Quero acreditar que, mesmo quando um casamento acaba (e há que respeitar a decisão, muitas vezes, dramática das pessoas), o amor pode permanecer.
Não consigo crer que alguém possa sentir ódio por alguém. Continuo a pensar que é o amor que prevalece entre as pessoas. Mesmo quando se entende que não há condições para estar em conjunto.
Terminar um relacionamento pode não ser exactamente o mesmo que terminar o amor.
Aprendemos que o amor é eterno. E S. Paulo assegura que, quando tudo acabar, o amor subsistirá.
Só que, na prática, tudo isto é muito complexo. Mas não há dúvida de que o nosso tempo é excitante. Desde logo, pelas perguntas que levanta e pelas inquietações que coloca.
Nunca julguemos ninguém. Até porque, frequentemente, é por amor que se tomam as opções mais dolorosas.
«A verdade que necessita de prova é apenas meia verdade».
Assim escreveu (subtil e magnificamente) Kahil Gibran.
Não acredito muito na contestação pelo afrontamento e pelos gritos.
Por estranho que pareça, às vezes têm mais impacto a dissidência pelo silêncio e a discrepância pela distância.
Há silêncios que «gritam» mais que certas palavras. E há ausências que podem ser mais notadas que determinadas presenças.
«Aquilo que não nos mata torna-nos mais fortes».
Assim escreveu (magistral e magnificamente) Nietzsche.
Toda a actividade, hoje em dia, é de desgaste rápido. Nem governar escapa à tendência geral.
Em pouco tempo, o actual Governo está a perder apoios. Os reparos já não vêm só de fora. Começam igualmente a surgir de dentro. Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes, Rui Rio, Ferreira Leite e até Rui Machete engrossam o coro das críticas.
O estado de graça também já terá sido perdido. Mas esse já nós o perdemos há muito.
Nada é de graça. Nada é oferecido. Tudo se compra, tudo se vende: a habitação, a saúde, a educação, o poder!
«O castigo por não quereres participar na política é acabares governado por pessoas piores do que tu».
Assim escreveu (pertinente e magnificamente) Platão.