O fundamentalismo é, ao contrário do que possa parecer, um sintoma da perda da alma.
O fundamentalismo insiste no fundamental (e não é isso que está em causa), mas esquece a harmonia, que também lhe dá extensão e profundidade.
Thomas Moore descreve o fundamentalismo «como uma defesa contra os sons harmónicos da vida, a riqueza e o politeísmo da imaginação».
A alma anseia pela profundidade, pela multiplicidade, por muitos níveis de sentido.
Quando se insiste sempre (e apenas) no mesmo, a alma fica asfixiada.
Para respirar, a alma suspira pelo múltiplo, pelo intenso, pelo imenso.
«A justiça é a saúde do Estado».
Assim escreveu (magistral e magnificamente) Platão.
A clivagem hoje não é de natureza ideológica. É cada vez mais geracional.
Pode haver mudanças de ciclos, mas o que mais se verifica é que os valores decaem e a ética fenece.
É certo que ninguém pode fugir à realidade. Mas hoje quase ninguém pode dizer que a realidade é desconhecida.
Só que os compromissos tendem a ser vaporosos, sem espessura nem densidade.
Ninguém se espante, pois, que a promessa de ontem seja desmentida hoje e contraditada amanhã.
Haverá uns ninhos de honradez neste mundo esmagado pelos interesses. Mas isso não chega a ser destaque informativo.
E como a realidade é cada vez mais aferida pela comunicação, as pessoas propendem a nivelar o que são pelo que vêem.
Até um dia.