São tempos de excessos, estes. A qualquer coisa que nos ocupe antepomos facilmente (excessivamente?) o prefixo hiper.
Mesmo em tempo de crise, continuamos presos ao hiperconsumo e é por isso que não dispensamos o hipermercado.
Seduzidos pela hipertecnologia, tanto somos marcados pelo hipertexto como fascinados pelo hipercorpo.
Sentimo-nos ora hiperfelizes, ora hiperdesiludidos. Em suma, é tudo hiper, inclusive a decepção. Hiperdecepcionados é como nos encontramos muitas vezes.
Estamos, pois, não na pós-modernidade, mas em plena hipermodernidade.
A modernidade não chegou ao seu termo, mesmo que, em muitos sectores, provoque saturação. Há aspectos da modernidade (decorrentes sobretudo da revolução tecnológica) que estão a ser radicalizados.
Daí que Gilles Lipovetsky tenha proposto o conceito de hipermodernidade não como contestação da modernidade, mas como radicalização dos seus princípios designadamente o progresso técnico, a industrialização e a valorização do indivíduo.
O quadro da hipermodernidade, para o sociólogo de Grenoble, é «uma sociedade liberal, caracterizada pelo movimento, pela fluidez, pela flexibilidade; indiferente, como nunca antes se foi, aos grandes princípios estruturantes, que tiveram de se adaptar ao ritmo hipermoderno para não desaparecer».
Trata-se, portanto, de um ambiente que tende para a exacerbação e para o descontrolo. O consumo continua em alta bem como o desperdício.
Este afã é também pilotado pela quebra das referências. Escasseiam referências na política, na cultura e até na religião. «As pessoas não têm referenciais e, ao primeiro choque, caem num abismo de desamparo e frustrações».
Eis, assim, os principais ingredientes da sociedade da decepção, título de mais um livro de Lipovetsky. E tópico para percebermos o nosso estado de espírito perante o mundo e a vida.
Decepcionados, portanto. Que, apesar disso, a história não nos encontre tolhidos nem desmobilizados.
Uma decepção não é impedimento para uma transformação.