1. As palavras têm uma origem, percorrem um caminho e constroem uma história.
Sucede que, não raramente e como notou Ludwig Wittgenstein, o seu significado é tomado não a partir da sua génese, mas a partir do uso que lhe é dado ao longo do tempo.
Católico tornou-se indicador de parcela. Designa uma parte dos crentes e dos cristãos: aqueles que seguem o Bispo de Roma.
Sucede que, etimologicamente, católico evoca não uma parte mas o todo.
O primeiro a empregar este conceito terá sido Aristóteles, na sua célebre Metafísica.
Aí defende que a verdade é católica. Está na totalidade. Hegel e von Balthasar repetiram este ensinamento nas suas obras.
Decompondo a palavra, verificamos que católico vem de kath olon, isto é, segundo o todo.
2. Importa ter presente que esta totalidade não pode ser vista apenas a partir da presença. Ela tem de incluir também (e cada vez mais) a participação e a abertura.
Concretizando, isto significa que a Igreja é católica não somente quando está em toda a terra.
Ela torna-se católica quando acolhe todas as perspectivas, todas as preocupações e todos os contributos.
Neste sentido, ser católico é mais do que pertencer a uma comunidade. É, acima de tudo, contribuir para uma fundamental unidade de todo o género humano.
Não se trata do nós diante do eles. Trata-se, no fundo, de uma consciência activa de pertença à comum humanidade.
Não está em risco a identidade. Ser católico é aceitar uma identificação. Mas, como bem adverte Timothy Radcliffe, não é uma identificação com base na exclusão.
Como pode defender a exclusão quem se apregoa discípulo de alguém que deu a vida por todos?
3. É preciso voltar às origens. Não para nelas estacionar, mas para delas voltar a partir.
Não basta uma alteração nas formas de agir. É necessária uma mudança de paradigma.
A Igreja tende a ver-se a partir de um centro (Roma). É importante que ela se reveja a partir da sua fonte (Jerusalém).
Na fonte, encontra-se o serviço, não o poder. A Igreja, como destaca Santos Sabugal, assenta num modelo fontal (Jesus, o Servo) e num modelo paradigmático (Maria, a Serva).
Na hora que passa, o serviço à paz desponta como a maior prioridade.
Daí a necessidade de um encontro verdadeiramente católico em Jerusalém.
4. Poderia começar por um encontro de católicos, de representantes de todas as comunidades, de todas as tendências, de todas as sensibilidades.
Deveria alargar-se, num segundo momento, a todos os cristãos, desbravando caminho para uma unidade sem uniformidade.
E, finalmente, tal encontro haveria de congregar todas as religiões.
A paz do mundo, como incansavelmente tem recordado Hans Küng, não se obtém sem a paz entre todas as religiões.
Ainda subsistem muitas clivagens entre os credos. Grande parte das guerras tem uma fractura de índole religiosa.
A cidade que o profeta entrevia como agregadora de todos os povos (cf. Is 2, 2-5) pode oferecer uma perspectiva holística que integre os pontos de vista demasiado atomísticos que teimam em cavar divisões.
Até agora, temos olhado o todo a partir das partes. Impõe-se que nos habituemos, a partir de agora, a contemplar as partes a partir do todo.
A verdade é integradora e, por isso, conciliadora e pacificante.
É no todo (e em todos) que a verdade nos visita. Insistir nos pontos de vista parciais, quando em causa está a totalidade, é perder tempo e desperdiçar oportunidades.
Para tal, é urgente acentuar as convergências e saber conviver com as diferenças.
Respeitando as diversas tradições, é bom que haja uma sobriedade no apelo a leis, normas e cânones.
Basta um mandamento, aquele que Jesus nos legou: «Amai-vos uns aos outros» (Jo 13, 14).
Haverá algo mais totalizante, mais universal e, portanto, mais católico que o amor?