Numa altura em que os nervos estão em franja e a tampa salta à mais pequena contrariedade, vale a pena olhar para a reacção do povo japonês à tragédia de que foi vítima.
Ali temos a adversidade máxima. Houve quem perdesse familiares, haveres, casas, tudo.
E eis que uma calma exasperante sela as imagens que correm mundo.
O jornalista perguntava, há dias, se não havia pilhagens.
Nem pilhagens, nem buzinadelas, nem sequer a impaciência que, no mínimo, seria de esperar.
Por muito menos, nós explodimos muito mais.
Pois com a terra a tremer, vemos, lívidos de espanto, o japonês que deixa a fila do autocarro e vai à farmácia comprar almofadas eléctricas para aquecer as outras pessoas que aguardavam transporte e que estavam geladas.
As estradas de Tóquio ficaram empilhadas de carros e, durante longos minutos, o trânsito fica completamente parado. Nada de exaltação, porém. Nem uma buzinadela. Ou, melhor, apenas uma. Era alguém que agradecia a outra pessoa por esta lhe dar dado prioridade num cruzamento.
Nos hipermercados, os clientes ajudam a apanhar os produtos que tombaram das prateleiras. Cada um só leva aquilo de que precisa para o dia. Cada um pensa nos outros. Na fila, todos esperam ordeiramente.
No primeiro comboio após o sismo, ninguém passou à frente de ninguém. Apesar de enorme, a a fila foi respeitada. E houve até um idoso que cedeu o seu lugar a uma grávida.
Uma velhinha abriu a padaria para dar pão. Um jovem ofereceu transporte na sua bicicleta.
Na central nuclear de Fukushima, cinquenta trabalhadores expõem-se à morte para salvar a vida dos seus concidadãos.
Se a adversidade é o grande teste, o povo japonês está a passá-lo com suma distinção.
Sabem manter maior compostura na desventura do que muitos na euforia.
O povo japonês merece o Nobel. Da paz, sem dúvida. E também da determinação, seguramente.