1. Na paisagem cinzenta dos nossos dias, ainda há vislumbres de sol que prenunciam manhãs de esperança.
O Ano Europeu do Voluntariado tem, pelo menos, o condão de servir de alerta para tanto bem que é semeado nas estradas tumultuosas da vida.
É claro que tudo se queda por brevíssimas notas de rodapé, já que o sumo dos conteúdos informativos aponta noutro sentido.
Quem acompanha o quotidiano noticioso apercebe-se de que, como advertia o Padre Manuel Antunes, o negativo tem mais audiência que o positivo.
Como a realidade tende a ser aferida (unilateralmente) pelo que aparece na comunicação, a ideia que se tem é que este mundo não passa de uma selva.
Mas, embora haja uma parte de verdade nesta percepção, importa perceber que (ainda) resta muito de bom na alma das pessoas.
2. O nosso mundo não está tingido apenas pelo negrume da violência e da exploração. Está também adornado por gestos heróicos de amor, partilha e solidariedade.
É preciso ter presente que há muita gente que se priva do seu tempo e do seu descanso para se dedicar à arte mais nobre que existe: a arte de praticar o bem.
Trata-se de gente de todas as idades e de todas as condições sociais, de todos os quadrantes políticos e de todas as famílias religiosas.
Mostram que o bem não é selectivo nem condicionado. Mostram que o bem é para todos e é para sempre.
Não reclamam compensações nem ambicionam reconhecimentos. Onde há um perigo, eles encontram uma oportunidade, uma oportunidade de fazer o bem.
3. Nesta época, que muitos dizem desperdiçada, há muitos jovens, que alguns consideram perdidos, que ocupam as férias em acções de voluntariado.
E não falta também quem, ao longo do percurso escolar, desenvolva projectos de voluntariado. São formas de crescer na mais acutilante sabedoria: a da bondade.
Também é reconfortante ver profissionais que conseguem inventar tempo para ajudar quem mais precisa.
A experiência mostra, aliás, que as pessoas mais ocupadas são também as que conseguem ser mais disponíveis.
A sua alma é maior que a sua carga de trabalhos.
São pessoas que não se deixam devorar pelo tempo nem consumir pelo desgaste.
São pessoas que rejuvenescem com o passar dos anos.
São pessoas que transportam um sorriso ainda que alojem mágoas no fundo do seu ser.
4. Um ano como este serve, por isso e essencialmente, de abanão de muitas consciências que se mantêm adormecidas.
Se há projectos que merecem ser apoiados são os de voluntariado. Porque são eles que puxam pelo que de melhor subsiste no interior da pessoa. E porque são eles que, no fundo, revelam o mais importante do ser homem e do estar no mundo.
O ser humano nunca pode afirmar-se sem o outro ou contra o outro. O ser humano só pode afirmar-se com o outro, ao lado do outro, em favor do outro.
É por isso que, ao contrário do que dizia Sartre, o inferno não são os outros. O inferno, como advertiu o Abbé Pierre, é viver sem os outros.
5. O Ano Europeu do Voluntariado servirá, por isso, para sensibilizar e para mobilizar.
É importante que se conheça o que está a ser feito. É decisivo que cada um veja o que pode (ajudar a) fazer.
No voluntariado, há sempre lugar para mais um. Aqui, não prevalece a competição, mas a entreajuda.
No voluntariado, cada um luta não para ser o melhor, mas para dar o seu melhor.
É por isso que o voluntariado não é jamais um apêndice para quem nada tem para fazer ou para quem acha que já tudo fez.
O voluntariado pertence ao essencial da vida. Ele traz a sementeira de uma cultura diferente e a nascente de um mundo renovado.
No fundo, são as suas iniciativas que nos levam a acreditar que, afinal, o melhor continua a ser possível.