O acontecimento de Deus nos acontecimentos dos homens. A atmosfera é sempre alimentada por uma surpreendente Theosfera.

Segunda-feira, 03 de Janeiro de 2011
1. Ainda ecoam, no nosso espírito, os votos que trocámos na viragem de 2010 para 2011.
 
Muitas foram as promessas que nos fizeram. Bastantes foram as promessas que nós mesmos fizemos.
 
No alvorecer de um ano novo, é muito forte o desejo de uma vida nova. Mas já estamos precavidos e é quase certo o resultado do embate que tal desejo vai ter na realidade.
 
Esta, com a sua incoercível inclemência, acaba por trucidar sempre os sonhos mais ousados e a vontade mais decidida.
 
No dia 2 de Janeiro (ou, talvez, hoje, dia 3, segunda-feira), já acordámos para os problemas habituais e para as dificuldades de sempre.
 
As expectativas são tão baixas que qualquer melhoria será apontada como um enorme êxito.
 
A sensação que dá é que todos estamos à espera do pior. Precisa-se, pois, de um suplemento de esperança.
 
E, neste particular, valerá a pena parafrasear a célebre recomendação de Kennedy: «Não perguntes apenas ao mundo o que pode fazer por ti; pergunta sobretudo a ti o que podes fazer pelo mundo».
 
 
2. O cenário não é entusiasmante e a tarefa não será fácil. Não são as promessas que, por si só, alteram a realidade.
 
Aliás, numa época dominada pelo efémero, as promessas depressa se esfumam. A esta altura, os votos de bom ano novo parecem já imolados pelas agruras do quotidiano.
 
As promessas tornaram-se uma espécie de balão de oxigénio que nos remetem para um mundo de ilusões que depressa se desfazem.
 
A vida tornou-se uma rotina em que cada fracasso gera propósitos de mudança. Que, rapidamente, verificamos que não se cumprem.
 
Dostoiévski bem alertava: «Prometer uma mudança, no fundo, resume-se a mentir, por mais respeitável que seja quem promete».
 
Talvez haja, aqui, algum excesso, mas não deixa de sobrar uma nesga de verdade.
 
Não basta prometer. É preciso, acima de tudo, realizar. O maior poder, como nos adverte José Antonio Marina, é precisamente este: tornar real o possível.
 
 
3. Sempre ouvi dizer que o demónio se alimenta de propósitos. No início de um ano, não faltarão.
 
Ninguém questiona que muitos deles são formulados com a melhor das intenções. Mas não podemos viver ao ritmo dos propósitos que nunca se realizam.
 
Sábia é, por isso, a recomendação de Santo Inácio de Loyola. Trata-se da recomendação dos três p’s.
 
Dizia o fundador da Companhia de Jesus que os propósitos devem ser poucos, pequenos e possíveis.
 
É que, se forem muitos, facilmente nos dispersamos. Se forem grandes, dificilmente os fixamos. E se não forem possíveis, instintivamente os pomos de lado.
 
Na verdade, somos muito ambiciosos na formulação de propósitos, quando devíamos ser mais ambiciosos na sua concretização.
 
Ainda me lembro do primeiro retiro em que participei e da cara de espanto do seu orientador quando leu o propósito que alguém tinha feito: «Prometo fazer tudo o que ouvi aqui»!
 
Há quem diga que o Islão mobiliza muita gente por causa da simplicidade da sua doutrina. O próprio Cristianismo, que, por vezes, se nos afigura tão complicado, também é luminosamente simples.
 
Jesus tudo resumiu numa única lei: a lei do amor. Amar a Deus sobre todas as coisas e amar o próximo como a nós mesmos é a súmula da mensagem e a chave do seguimento de Cristo.
 
Curiosamente, Sebastião da Gama percebeu isto muito bem quando escreveu: «Tenho muito que fazer? Não. Tenho muito que amar».
 
O Evangelho desponta, por vezes, como uma proposta muito bela, mas também como um caminho que teimamos em não trilhar.
 
 
4. No início de mais um ano, não prometamos fazer muita coisa. Sem dúvida que muito é preciso fazer. Mas seleccionemos uma coisa de cada vez.
 
Achamos que é necessário mudar muito lá fora, nas estruturas. E é verdade. Mas comecemos a mudança por nós.
 
Não é mais fácil, mas sempre será mais exequível, basicamente porque depende de nós.
 
O que nunca podemos presumir é que a mudança ocorre por inércia. Já, há séculos, dizia Francis Bacon que, por inércia, as coisas só pioram.
 
Se queremos que as coisas melhorem, temos de fazer alguma coisa. A começar pela nossa vida.
 
publicado por Theosfera às 11:15

Às vezes, parece que os violentos têm mais seguidores que os pacíficos.

 

Pensa bem. É muito provável que ao pacífico tentes responder com violência e que ao violento procures corresponder com uma violência ainda maior.

 

Dizes que já não és capaz de proceder de maneira diferente. Alguma vez, contudo, exercitaste o autodomínio? O controlo das tuas emoções e dos teus ímpetos? Ou, pelo contrário, não será que frequentemente fazes a apologia dos sentimentos à flor da pele?

 

Mas que fazer quando te provocam? Lembra-te da recomendação atribuída a S. Francisco. Nunca respondas ao ódio com ódio, mas com amor. Nunca respondas à ofensa com a ofensa, mas com o perdão.

 

Diante de alguém descontrolado, mantém pois o controlo. Não percas jamais a serenidade. Aliás, quando os nervos apertam, as palavras que proferimos vêm mais do nosso instinto do que da nossa racionalidade. E, regra geral, acabamos por nos arrepender do que dizemos.

 

Assim, quando alguém te abordar em estado de fúria, opta por manter os olhos no chão e a boca fechada. Até que a tempestade passe…

publicado por Theosfera às 10:25

Nesta altura de embate com uma realidade ainda mais inclemente, um verbo vem à mente: desistir, desistir de trabalhar e até — quem sabe? — desistir de viver.

 

Perante isto, o Dalai Lama adverte que «só existem dois dias no ano em que nada pode ser feito. Um chama-se ontem e o outro chama-se amanhã. Portanto, hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver».

 

É assim que, diante da tentação de desistir, há uma força que nos vai levando a resistir. Ainda que a tentação para desistir seja avassaladora, tenhamos presente que, como já Viriato nos exortava, «mais vale pertencer a uma minoria que resiste do que a uma maioria que desiste»!

 

No fundo, é possível fazer de cada dia uma teofania, uma revelação de Deus, já que, embora não pareça, sentimo-Lo sempre perto e até dentro de nós.

 

É Ele que nos faz, permanentemente, o apelo: não desistas, começa, volta a começar.

 

Xavier Zubiri dizia que, no fundo, «a vida é uma sucessão de começos». E, quanto aos problemas que aparecem, há que encará-los e não dramatizá-los pois, como referiu Kahlil Gibran, «só se chega à aurora pelo caminho da noite».

 

Se cairmos no caminho, a solução é voltarmo-nos a erguer. Foi Séneca que exarou a recomendação: «Se um grande homem cair, mesmo depois da queda, continua grande».

 

Não é a queda que torna o homem pequeno. É a desistência que o anula. Às vezes, e como intuía Aristóteles, «é no fundo de um buraco ou de um poço, que acontece descobrir-se as estrelas».

 

Por isso, Irmão, não comeces a desistir e nunca desistas de começar. Mesmo que te custe.

 

Aquilo que esperas vai acontecer. Não saberemos quando, mas vai acontecer. «A esperança espanta o próprio Deus», como dizia Péguy. Portanto, ela vai, uma vez mais, surpreender.

 

Mantém a fidelidade. Mesmo que todos pensam e digam o contrário. Deus é o critério. Não são as maiorias que decidem. É Ele. Não O deixes. Ele também não te abandonará!

 

Faz da realidade um sonho. Faz do teu sonho realidade. A vida é uma teofania permanente. Deus está sempre a visitar-nos. Em todas as situações.

 

Porque não fazer, então, da terra uma única (e imensa) filadélfia, ou seja, um povo de amigos e de irmãos?

publicado por Theosfera às 10:20

1. Está ainda o ano a dar os seus primeiros (e tímidos) passos e já não falta quem prenuncie tempestade. 

  

Não há praticamente político nem comentador que, qual Cassandra dos tempos modernos, não nos prepare para o agravamento da crise.

 

Não espanta, pois, que o ambiente seja soturno e que se propenda a ver problemas onde até podem estar a germinar possibilidades.

 

Ter noção das dificuldades não é, em si, dramático. O importante é que não fiquemos desmobilizados ou alçados pelo desespero.

 

Não sei se por influência do ambiente político e do clima económico e social, começam a aparecer vozes a alertar também para a crise da Igreja.

 

Nos últimos dias, houve até quem a descrevesse como sendo uma das maiores crises dos últimos séculos.

 

 

2. Há uma tendência crescente, em muitas pessoas, para desligar a relação com Deus e a relação com a Igreja.

 

Longe, muito longe, aparenta estar, por conseguinte, a afirmação de S. Cipriano, segundo a qual «ninguém pode ter a Deus por pai se não tiver a Igreja por mãe».

 

O certo é que não falta quem sinta Deus como pai e, apesar disso, não consiga sentir a Igreja como mãe.

 

Quer queiramos quer não, existe um número cada vez maior de seres humanos que não prescinde de Deus e que, ao mesmo tempo, se afasta da Igreja.

 

Neste contexto, não partilho do diagnóstico dos que dizem que a sociedade está a distanciar-se de Deus.

 

Ainda recentemente, por alturas do Natal, se voltaram a ouvir vozes eclesiásticas a increpar uma laicidade que obscurece o sagrado. Com todo o respeito, não me parece que seja assim.

 

É óbvio que já não estamos em tempos de cristandade. Mas também já superamos a época secularista, que alguns (apressadamente) qualificaram como, irremediavelmente, pós-religiosa.

 

Poderemos é estar no limiar de uma era que poderão denominar pós-eclesiástica. No entanto, julgo ser mais adequado acolhê-la como sendo uma era de apelo à refundação da própria Igreja.

 

 

3. Em si mesma, a laicidade não impede ninguém de cultivar uma relação com Deus.

 

Pelo contrário e a avaliar por certas reacções a determinadas intervenções, o que muitos lastimam é que a Igreja não se mostre mais próxima de Jesus.

 

É claro que a sobrevivência da Igreja não está em causa. Mas pode estar em jogo a sua relevância.

 

As pessoas são livres de chegar a Deus pelas vias que consideram mais convenientes. O que nos deve fazer meditar é haver muitos que acham que a Igreja não é uma dessas vias.

 

Isto não deve conduzir-nos a uma trincheira nem tão-pouco nos há-de levar a um olhar pessimista e zangado sobre o mundo.

 

O mais sensato é optar pela via da conversão, da mudança, da humildade.

 

Muitos afastam-se da Igreja porque entendem que a Igreja está a afastar-se de Jesus.

  

Nos tempos de cristandade, havia perguntas que nem sequer eram formuladas. Nos tempos que correm, há inquietações que as pessoas exigem ver correspondidas.

 

 

4. Os maiores representantes da Igreja não podem ser vistos como os que mandam, mas como os que servem.

 

Em Jesus, Deus entra na nossa história não pela via da opulência, mas pela via da humildade.

 

Divino, com feito, não é o grande caber no grande. Isso qualquer humano consegue. Divino é o infinitamente grande caber no infinitamente pequeno.

 

Vale a pena recordar, a este propósito, a máxima de Hölderlin: «Não ser abarcado pelo máximo, mas deixar-se abarcar pelo mínimo, isso é que é divino».

 

De facto, Deus inverte o máximo e o mínimo, o maior e o menor, o grande e o pequeno.

 

O máximo é o que parece mínimo. O maior é o que se apresenta como menor. O verdadeiramente grande é o que nos surge como aparentemente pequeno.

publicado por Theosfera às 00:00

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