O jornalista perguntava há dias: alguém se recorda de um grande discurso nos últimos trinta anos?
O cronista responde que se recorda apenas de dois e, ainda por cima, feitos pela mesma pessoa.
Acrescentava alguém que estava com medo de reler os discursos de Salazar pois temia tornar-se salazarista. Tudo por causa da qualidade supina dos seus discursos.
Dizem, aliás, que, à sua cabeceira, figuravam os sermões do Padre António Vieira, um genial manuseador da palavra. E, nessa medida, considerado o imperador da lingua portuguesa.
E é aqui que tocamos o punctum saliens do problema.
Todos nós transportamos o nosso húmus, a circunstância que nos forma, o ambiente em que crescemos.
O ensino, desde há décadas, propõe o conhecimento num plano meramente instrumental. As competências são sobrevalorizadas em detrimento dos conteúdos e da forma.
As imagens do parlamento e os textos da comunicação social documentam um empobrecimento crescente na arte de falar e de escrever.
O professor, tido como um mestre, já não é visto como alguém que ensina a discorrer. A avaliação, não raramente, consiste em identificar situações ou em escolher possibilidades.
A construção do texto, que certifica a elaboração de um pensamento, ressente-se cada vez mais.
Nesta itinerância pela estrada do tempo, há que não perder de vista aquilo que vamos perdendo. É ocioso estacionar apenas nos ganhos...