Na música, não há lugar apenas para o sentimentalismo. Há lugar também (e bastante) para a ideia, para o ideal, para a intervenção.
Sérgio Godinho é alguém que consegue, como poucos, colocar ideias fortes em tons musicais que se pautam por uma envolvente suavidade.
É interventivo sem ser agressivo.
Não infantiliza o público com lugares comuns.
E é um resistente na coerência que não vacila.
Mais de 30 anos após Abril, é saudável (e provoca saudades) voltar a ouvir o desfile das grandes aspirações: a paz, o pão, a habitação, a saúde. E que só haverá liberdade a sério quando o povo receber o que o povo produz.
Os anos que se seguiram repuseram o pragmatismo dos interesses imediatos.
Daí que seja reconfortante para o espírito recuar até àquelas manhãs que despontaram há décadas e que expendiam sementes de esperança.
Admiro Sérgio Godinho pela forma como consegue musicar expressões, à partida, pouco propensas à musicalidade.
Nem a célebre expressão de Churchill escapou: «A democracia é o pior regime à excepção de todos os outros».
O Teatro Ribeiro Conceição encheu esta noite e sentia-se um ambiente de fraternidade feliz. Que ela não se apague.
Foi um concerto memorável.