1. Em horas difíceis, como são as que estamos a viver, é fundamental que não desperdicemos duas atitudes fundamentais: humildade e coragem.
Precisamos, antes de mais, de humildade para reconhecer a debilidade da nossa natureza e a fragilidade dos nossos percursos.
A humildade, de resto, nada retira à grandeza. Já dizia Séneca, na antiguidade, que «um homem grande, mesmo quando cai, continua a ser grande ».
Mais próximo de nós, Rabindranath Tagore avisava com profunda sapiência: «Quanto maiores somos em humildade, tanto mais próximos estamos da grandeza».
E Emanuel Lévinas advertiu-nos com enorme pertinência: «Mais alta que a grandeza é a humildade».
2. A vida ensina-nos que nem sempre há humildade na grandeza. Mas ela mostra-nos também que há sempre grandeza na humildade.
É que a humildade, irmã gémea da verdade, faz-nos ver o que somos, sem artifícios nem rebuscamentos.
Ela é, pois, aliada da transparência. Faz parte do edifício que alicerça uma conduta pautada pela autenticidade.
Jesus, quando aponta para o Seu ensinamento, não esquece a humildade, fazendo-a acompanhar da mansidão. «Aprendi de Mim, que sou manso e humilde de coração» (Mt 11, 29).
É sabido que Nietzsche não gostou deste perfil. Achava que se tratava da base de uma moral de fracos. Optou por uma deslumbramento próximo da arrogância.
Mas, infelizmente, não é só Nietzsche que tem dificuldade em deixar-se acolher pelo manto da humildade. As resistências proliferam igualmente entre os discípulos do próprio Jesus.
3. Nos últimos dias, voltamos a ouvir de falar de ataques contra a Igreja.
E não há dúvida de que fortes ataques têm sido desferidos. Não, porém, a partir de fora.
Mesmo que haja algum ataque a partir de fora, ele não se compara à gravidade dos ataques que a Igreja tem sofrido a partir de dentro.
Estes é que são os ataques mais hostis, mais prejudiciais e com efeitos mais devastadores.
Não são as notícias sobre determinados factos que maculam a Igreja de Cristo. São os factos que estão na origem das notícias que a infectam.
São eles que ofuscam o brilho da luz que lhe vem de Cristo. De fora vêm as interpelações. Mas é de dentro que estão a vir os maiores obstáculos.
Aliás, o próprio Papa é o primeiro a reconhecer o seu pesar e a não ocultar sequer a sua vergonha por aquilo que se tem passado.
Nunca é demais recordar, por outro lado, que, pouco tempo antes de ser eleito, Bento XVI denunciou com inusitado vigor: «Quanta porcaria existe na Igreja! A Igreja parece uma barca que mete água por todos os lados. As vestes e os rostos da Igreja estão sujos. E somos nós mesmos a sujá-los».
Não são os outros.
4. É claro que, como já Henri de Lubac notava, «a Igreja não é uma academia de sábios, nem um cenáculo de intelectuais sublimes, nem uma assembleia de super-homens».
Por isso mesmo, ela tem de ser humilde, de aceitar os seus erros e, sobretudo, de não pactuar com a desumanidade.
Ninguém é forte por negar a fraqueza. Como escreve Tommy Hellsten, «a humildade é a força que não nega a fraqueza».
Mais. Se pensarmos bem, «a verdadeira força nasce da fraqueza, pois exige uma confissão de fraqueza».
Daí que «a verdadeira força seja a humildade, que consiste em enfrentar a nossa fraqueza». Por aqui se vê como a humildade mora tão perto da coragem.
Há muitas lições que o fracasso encerra. A primeira é, sem dúvida, não encobrir a realidade por muito dolorosa que seja.
A segunda é ter mais cuidado no carácter, na rectidão. É certo que a vida nem sempre se apresenta em linha recta. Mas será que ela tem de ter tantas curvas?
Como é possível pregar uma coisa aos outros e passar o tempo a negá-la com tamanha descontracção?
A comunicação social exagera nas informações? Talvez.
Mas o pior mal não está no que aparece escrito. O pior mal está no que acontece.
É a realidade (e não a sua notícia) que dói…