A religião não é um mero fenómeno religioso. É um verdadeiro fenómeno humano.
A religião não é um mero fenómeno religioso. É um verdadeiro fenómeno humano.
Uma vez mais, Lamego respondeu com generosidade e abundância. Muitas foram as pessoas que, desde manhã cedo, apareceram na Escola Latino Coelho para dar sangue.
Em dia de Domingo, é uma bela forma de começar a celebrar a Eucaristia. Esta actualiza a oferta do sangue que Jesus fez na Cruz.
Um pouco de sangue nosso pode ajudar a salvar uma vida. Não custa muito. E é sumamente maravilhoso.
Que bom sentir a alegria das pessoas em dar sangue, em dar um pouco de si.
A transfiguração de Jesus é realidade e é apelo, apelo à nossa própria transfiguração.
Não é despiciendo notar que a transfiguração ocorre no âmbito da oração.
A oração transfigura, altera, felicita.
Deixemo-nos transfigurar. Por Cristo. Com Cristo. Em Cristo.
«Tão vasto espirito em tão estreita regra», terá dito Sophia de Mello Breyner acerca do grande Padre Manuel Antunes.
Era o mínimo que podíamos esperar dos cidadãos: largueza de espírito, ainda que os horizontes sejam estreitos.
Quem se lança numa candidatura já sabe que se expõe à crítica. O Dr. Fernando Nobre é o primeiro a saber disso.
Agora que se conteste a decisão de alguém se candidatar é que não se percebe muito bem.
Tanto se exalta a cidadania, mas quando aparece alguém desligado dos partidos, sruge logo uma onda de indignação.
Os partidos são importantes, mas a democracia não se esgota nos partidos.
Os partidos também alavancam a cidadania, também são parte da cidadania.
O gesto do Dr. Fernando Nobre é um contributo para a pluralidade. É mais uma opção que os portugueses têm diante de si.
Dizem que não tem experiência política. Mas o trabalho humanitário não fará parte da política?
Continuo a ressalvar que mantenho a independência. Não digo em quem voto. Mas saúdo quem se oferece à consideração dos portugueses, com uma mensagem de moderação e despojamento. Pessoas como o Dr. Fernando Nobre têm mais a perder do que a ganhar com esta incursão.
Ninguém está acima da crítica. Já houve quem me lembrasse que o Dr. Fernando Nobre é a favor da liberalização do aborto. Continuo sem confirmação oficial quanto a este dado. Ainda assim, recordo que outros políticos, que se dizem contra o aborto, acabam na prática por promulgar leis que o favorecem.
Era bom que realçássemos o bem que as pessoas fazem.
Ninguém é obrigado a apoiar ninguém. Mas não sufoquem as ideias antes de serem apresentadas. E, depois, cada um decida em consciência. E com a maior paz!
Primeiro o Haiti. Depois a Madeira. Agora o Chile. A natureza parece não dar tréguas e, impante, vai somando vítimas.
Um forte tremor de terra provocou pelo menos 76 mortes no Chile e originou um alerta de tsunami no Oceano Pacífico esta madrugada.
O abalo, que atingiu 8,8 na escala de Richter (maior que o do Haiti), foi sentido durante cerca de um minuto quando eram 03h34 no país sul-americano (06h34 em Portugal Continental).
Segundo os primeiros relatos, vários edifícios ruíram, houve cortes de energia e foram confirmadas 76 mortes, prevendo-se que o número oficial de vítimas vá disparar durante este sábado.
A presidente chilena Michelle Bachelet, que está prestes a ceder o lugar a Sebastian Piñera, dirigiu-se à população, apelando para que fiquem calmos apesar do «enorme terramoto».
O epicentro do terramoto localizou-se no Pacífico, 325 quilómetros a sudoeste de Santiago do Chile, mas a apenas 90 quilómetros de Concepción, a segunda cidade chilena, onde vivem mais de 200 mil pessoas.
Relatos no Twitter indicam que a cidade de Chillán já foi considerada uma zona de catástrofe.
O sismo que arrasou o Haiti a 12 de Janeiro, provocando mais de 100 mil mortos, chegou a apenas 7,0 na escala de Richter.
Orlando Zapata era ainda novo e morreu.
Morreu porque acreditou, porque não pactuou e porque perseverou.
Morreu porque, à sua frente, há um poder inclemente, uma ditadura implacável.
Mas Zapata não morreu só por causa da inclemência do poder. Morreu também por causa do silêncio dos que, dizendo-se defensores da liberdade, se calam perante quem a esmaga.
Já o apóstolo Pedro dissera diante do tribunal: «Não podemos calar o que vimos e ouvimos».
E, mais proximamente, Sophia alertara-nos: «Vemos, ouvimos e lemos. Não podemos ignorar».
Defendo o silêncio como forma de escutar. Não defendo o silêncio como forma de calar a dor ou de branquear o mal.
«Tristeza não tem fim, felicidade sim».
Assim escreveram (melancólica e magnificamente) Tom Jobim e Vinicius de Moares.
Portugal está doente, é verdade. E não me reporto à míngua de dinheiro e à precariedade do trabalho.
A principal doença nem sequer é de natureza económica.
Falta dinheiro, mas, acima de tudo, falta confiança, falta verdade. Há demasiado ruído em volta da suspeita.
Parece que somos todos investigadores uns dos outros. Não falamos de ideias (muito menos de ideais), nem de causas, nem de valores. Falamos de lugares e de pessoas.
O clima cívico não está bom. Urge melhorar.
Como previsto, este sábado surge tingido de cinzento e fustigado por bátegas de chuva e estrépitos de vento.
Nestas alturas, recordo sempre uma bela frase de Miguel de Unamuno: «Quando Deus quiser chover na tua vida, deixa chover».
Esperemos que a chuva venha calma e que, no nosso interior, acolhamos a outra chuva: a chuva de Deus!
De forma assaz perspicaz, Henri de Lubac faz notar que «a Igreja não é uma academia de sábios, nem um cenáculo de intelectuais sublimes, nem uma assembleia de super-homens».
É precisamente o contrário. «Os coxos, os aleijados e os miseráveis de toda a espécie têm cabimento na Igreja, e a legião dos medíocres, que se sentem nela como em sua própria casa, são os que lhe dão o seu tom».
Há um dado que não tem sido muito referido. Mas é consolador (e muito comovente) saber que Timor-Leste, um país ainda a nascer e que acumula grandes dificuldades, deu um substancial contributo para ajudar a recuperação da Madeira.
É sempre assim: os pobres são os maiores ricos. A sua generosidade não tem limites. Dão o o que têm e o que não têm. Dão não o que sobeja, mas o que lhes falta.
Por isso é que são pobres? Por isso é que são ricos!
Faz hoje 13 anos que partiu para o Pai o meu Confessor, Conselheiro e querido Amigo senhor Cón. Acácio Vieira Branco.
Era um dos maiores especímenes de uma estirpe de sacerdotes com uma forte espiritualidade e que irradiava uma grande bondade.
Muitas saudades. Enorme gratidão.
Em 1953, Henri de Lubac escreveu a sua famosa Méditation sur l'Église. A determinada altura diz: «Esta Esposa mística, esta Igreja de coração escondido, é, ao mesmo tempo, um ser bem visível entre os demais seres do mundo. Pode-se menosprezá-la, mas não se pode ignorá-la.
Como todas as instituições humanas, também ela tem a sua fachada exterior. A nossa Igreja não é uma coisa nebulosa e imaterial. Não é uma entidade vaporosa. Embora seja um mistério que se vive na fé, não deixa de ser uma realidade que se vive neste mundo».
Às vezes, pomo-nos a pensar nas fragilidades da Igreja e inferimos que mais facilmente nos aproximamos de Cristo e de Deus fora dela.
Isso não é argumento, porém. Já dizia S. Cipriano que «ninguém pode ter Deus por Pai se não tiver a Igreja por Mãe».
E, de uma forma brilhante, Henri de Lubac previne-nos: «Não nos jactemos de que, situando-nos fora da Igreja, podemos permanecer na "sociedade de Cristo". Pelo contrário, devemos dizer a nós mesmos com Sto. Agostinho: "Para viver do Espírito de Cristo, é preciso viver no Seu Corpo"».
Pode acontecer que nos desiludam muitas coisas que fazem parte da contextura humana da Igreja. Se tal acontecer, saibamos que o que mais vale é a palavra e o silêncio amoroso. Estejamos seguros de que nunca a Igreja nos dá melhor Jesus Cristo como nestas ocasiões em que nos brinda com a oportunidade de sermos configurados à Sua Paixão.
Novamente Henri de Lubac: «A Igreja tem a única missão de tornar presente Jesus Cristo nos homens. Ela deve anunciá-Lo, mostrá-Lo e dá-Lo a todos. Tudo o resto não é mais que acrescento. Ela é, e será sempre, Igreja de Jesus Cristo. Mas é preciso que o que é em si mesma o seja também nos seus membros. O que ela é para nós, é fundamental que o seja também através de nós».
Creio na bondade que emerge do coração e que se aloja na alma.
Dê uma oportunidade ao melhor de si mesmo.
Não silencie o mal que vê nem o bem que avista.
A mensagem de Cristo é feita de denúncia e de anúncio.
O silêncio é para escutar, nunca para coagir, coarctar ou impedir.
A bondade não consiste em fechar os olhos ao mal. Pelo contrário, consiste na promoção do bem.
A bondade é irmã gémea da justiça e da paz.
Não posso calar a dor de tantos que pedem oração e que se encontram nos hospitais, em tratamentos ou operações.
Na cátedra da dor, estas pessoas ensinam-nos a olhar a vida a partir do fundo. Deus não lhes faltará.
Obrigado pela lição que nos oferecem.
Uma santa noite.
Como padre, aprendo sempre. Com o povo. Com Deus que fala através do bom povo de Deus.
Edifica-me sobremaneira ver pessoas, que trabalham numa escola, após um desgastante dia de trabalho, participar na Santa Missa com alegria, vibração, seriedade e oferecendo um ar de gente feliz, de gente salva. Tudo por estar na companhia de Deus.
A minha gratidão a toda a comunidade educativa do Colégio da Imaculada Conceição.
A tentação é dizer que já não dá para confiar em ninguém. A espiral da suspeita não pára de crescer. Nem as pessoas mais gradas nem as instituições mais veneráveis parecem incólumes..
É verdade que, ao longo da vida, todos acumulamos amarguras, desencontros, desilusões. Não é só a vida pública e a actividade política que nos desencantam. A vida pública e a actividade política acabam por ser o eco e a projecção do que palpita no quotidiano.
Mas é nestas alturas que mais resplandece o testemunho de pessoas de excepção. Nem todos são iguais.
Há quem (teimosamente?) persista na fidelidade e na bondade, no respeito pelos princípios, pelos ideais que perfilha, pelos valores que professa.
Não enveredemos pelo tremendismo. Ainda há bons exemplos no mundo. Não serão muitos. Mas, até por isso, devem ser estimados.
É crescente a sensibilidade das pessoas à oração, à espiritualidade.
Há uma revolução que Deus está a fazer em tantos corações.
Há gente nova que cultiva uma apetência muito grande, e sobretudo muito sincera, pela relação com Deus.
Que a Igreja possa acolher o que Deus está a semear.
Deus está no silêncio de tantos corações que sofrem a injustiça. E encontra-Se em tantos lábios que clamam pela justiça. O Homem, cada ser humano, é o mais sagrado santuário de Deus.
Há muitas nuvens debaixo do sol?
Há muito sol por cima das nuvens.
Não percamos a esperança. O sol voltará a brilhar. Em breve.
Com o advento da industrialização e a proliferação dos serviços, o mundo laboral começou a ter uma vida atribulada.
O trabalho visa a dignidade humana, mas, para muitos, visa apenas o lucro.
É claro que sem lucro não há trabalho. Não há como pagá-lo.
Mas sem trabalho também não há lucro. Não se vê como produzi-lo.
O grave é que, no meio de tudo isto, o ser humano não fica no lugar que merece: o primeiro.
Desemprego em massa, trabalho precário em série, tudo gera em revolta.
O operariado transforma-se num precariado.
Haverá uma saída?
Apesar de tudo, penso que sim. Desde que se pense, acima de tudo, no valor sagrado da pessoa humana.
À força de tanta insistência, talvez já nem nos apercebamos do óbvio. Como realça Esther Mucznik, «o poder político é mais permissivo a oportunistas e carreiristas do que a pessoas de carácter e princípios».
O problema é que não é só na política que isto se passa. Toda a vida cívica se ressente deste vício endémico, desta doença larvar.
As pessoas sérias, que as há (graças a Deus), são, frequentemente, tentadas a mudar de conduta ou a fazer cedências. Caso contrário, são prejudicadas. Admiro, pois, quem resiste. Quem não pactua com o aviltamento dos valores. São esses os grandes sinais de esperança.
Neste espírito, entendo ser meu dever expender a minha mágoa pelo facto de Lula da Silva, de visita a Cuba, ter silenciado a morte de um activista dos direitos humanos, preso desde 2003.
Toda a gente sabe que é complicado dissentir à frente dos homens do poder. Mas é essa coragem que faz a diferença. Toda a diferença.
A Madeira, que nesta altura parece um rio de lama, continua a ser um jardim. Um jardim de solidariedade, um jardim de partilha, um jardim de entreajuda.
Na vida, é difícil manter o equilíbrio. Há quem viva para o eterno à custa do temporal e há quem viva para o temporal à custa do eterno.
Faz bem, por isso, recuperar esta recomendação do grande Emmanuel Mounier: «Porque os que olham para o eterno perderam o sentido do temporal, não percamos nós no temporal reencontrado o sentido do eterno».
François Varillon adverte-nos acerca dos extremos: «Duas atitudes são igualmente irritantes: a que exclui da religião a interrogação e a inquietude; e a que cultiva sistematicamente uma e outra».
«Cumpre em relação aos outros aquilo que só a ti próprio prometeste».
Assim escreveu (acutilante e magnificamente) René Char.
Fica bem ser optimista. Mas fundamental é ser verdadeiro.
Que ganha alguém com um tumor dizer que está tudo bem?
Razão tinha, por isso, Voltaire quando verteu a mais engenhosa definição de optimismo: «É a mania de sustentar que tudo está bem quando tudo está mal».
Por vezes, há quem não queira ver a realidade tal como ela se apresenta, optando por ver-se a si próprio e aos seus desejos.
Um personagem criado por Voltaire (o Dr. Pangloss) esmerava-se neste empreendimento: «Todos quantos têm afirmado que tudo está bem têm dito asneiras: o que se deve dizer é que tudo está o melhor possível».
Para se corrigir um erro, o primeiro passo consiste em reconhecê-lo. Não há drama nenhum nisso.
Mário de Carvalho afirmou que »um pessimista é um optimista bem informado».
Temos de olhar para a vida como ela é. Só a partir daí há condições para transformar naquilo que gostaríamos que fosse.
Esconder a verdade faz sentido?
Não sei por que motivo a proximidade com Deus nos há-de afastar das pessoas e tornar-nos frios, desumanos.
Será que já pensamos que, em Cristo, Deus assumiu a humanidade?
Ser humano é o grande louvor que se pode prestar a Deus.
Orar é esperar. Rezar é dizer.
Há espaço para os dois momentos no encontro com Deus.
Antes de falar com Deus, urge deixar que Deus nos fale.
Daí o apelo, ínsito no Sermão da Montanha, para que entremos no quarto, no santuário interior.
Aí, podemos estar de qualquer maneira. Até podemos fechar os olhos. Não nos preocupemos com palavras. Elas virão.
Antes de sermos nós a rezar a Deus, é (por aasim dizer) que Deus nos reza a nós.
Deixemos que a Sua palavra ecoe em nós.
Não olhemos para o relógio. Não contemos o tempo.
Na oração, Deus é a paz para a nossa inquietação.
Desfrutemos de Deus. Do Seu amor. Da Sua bondade. Da Sua paz.
Deus mora em si. Maravilhoso!
Teve uma peregrinação longa de bem fazer que só parou aos 86 anos.
A D. Lourdes teve vários familiares no Seminário e um deles foi meu condiscípulo durante (creio) seis anos.
Era uma senhora que vivia para Deus e que destilava delicadeza por todas as artérias do seu ser.
Pessoalmente, ficava comovido porque, todos os anos, pelo Natal e no meu aniversário, me telefonava. Nunca se esquecia. As suas palavras ressumavam uma nobreza de sentimentos próprios de um coração nobre e de uma alma de eleição.
A grandeza de uma pessoa vê-se em pequenos gestos. Que, afinal, não são pequenos. Têm a medida de quem os pratica. São, por isso, grandes também.
Apesar da intempérie deste dia, a Igreja de Britiande estava cheia. Ali, D. Lourdes esteve muitas vezes: em oração, na catequese, em tantas missões.
Vi lágrimas no rosto dos familiares. O esgar de todos permitia adivinhar uma emoção incontida.
Obrigado, D. Lourdes. Deus já a tem com Ele. Que a sua bondade nos toque a todos.
Parece um erro matemático, mas é uma verdade teológica. Como disse sabiamente Nicolas Afanassieff, «um mais um é igual a um».
Quer isto dizer basicamente que
Prossegue aquele teólogo: «Cada Igreja local manifesta toda a plenitude da Igreja de Deus, porque é Igreja de Deus e não parte dela. Pode haver pluralidade de manifestações da Igreja de Deus, mas a Igreja permanece uma e única, porque é sempre igual a si mesma. A pluralidade das Igrejas locais não destrói a unidade da Igreja de Deus, tal como a pluralidade das assembleias eucarísticas não destrói a unidade da Eucaristia no tempo e no espaço».
O que põe em causa a comunhão é quando um mais um não é igual a um.
É quando um mais um é igual a dois, ou seja, quando não estou em comunhão com o outro.
É quando, mesmo quando estou com o outro, não estou com o outro
A unidade não é conexa com uniformidade. Como diz Walter Kasper, a unidade é sempre sinfónica e polifónica.
«Toda a infelicidade dos homens provém da esperança».
Assim escreveu (atenta e magnificamente) Albert Camus.
Ser homem significa pertencer à humanidade. Como dizia John Donne, «ninguém é uma ilha; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; a morte de qualquer homem diminui-me porque faço parte do género humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti».
«É quando parece que tudo acaba que tudo verdadeiramente começa».
Assim escreveu (luminosa e magnificamente) Santo Agostinho.
Diz Deus, pelo profeta, que quer fazer algo novo connosco, para nós.
Transportamos esta novidade há séculos.
Não insistamos, pois, na redundância, na repetição.
Não servimos a humanidade repetindo comportamentos, mas empreendendo na alternativa.
Será possível conhecer Deus? Tarefa árdua, esta.
Dizia o Pseudo-Dionísio que, «relativamente a Deus, só as negações são verdadeiras; as afirmações são insuficientes».
Não basta, portanto, ter um cérebro dotado. É fundamental possuir um coração disponível. Daí a advertência de Olegario González de Cardedal acerca da necessidade de, no trabalho teológico, aliar a simplicidade de coração à complexidade da inteligência.
No fundo e como alerta González-Faus, «conhecer a Deus é coisa só de um coração limpo pela misericórdia. A misericórdia entrelaça-se com a pureza do coração».
Neste sentido e segundo este teólogo, «Deus e o dinheiro são incompatíveis porque Deus é um Deus de misericórdia e o dinheiro é um deus imisericordioso».
Amar é imitar. Amar Jesus é imitar Jesus. É imitar Jesus eucaristicamente real, eclesialmente presente e humanamente entranhado em nós. Olhemos para o Santo Padre. Jesus está ali. Empenhemo-nos em ir por aí.
Para Charles de Foucauld, é possível imitar Jesus de três formas: pela pregação, pelo deserto e por...Nazaré. Esta última foi a via escolhida pelo Irmão Universal. Em que consiste? Na reprodução da vida de Jesus em Nazaré ao longo dos trinta anos de vida oculta. Trata-se, então, de uma via feita de:
- imitação;
- obediência;
- contemplação (isolamento, recolhimento, oração, prece);
- sacrifício;
- glorificação de Deus.
Eis uma proposta interessante a seguir neste tempo santo da Quaresma.
O deserto não é só local físico. É também (e bastante) um lugar teológico (locus theologicus). E um lugar teológico de singular relevância e primeira grandeza.
João viveu no deserto. Jesus esteve no deserto. Muita gente procurou o deserto. Não como fuga. Mas como apelo. Como aviso. Como terapia. Como profecia. Como acto de coragem.
O deserto é aridez. Mas é sobretudo teste. Teste à resistência. Teste à persistência. Teste à fidelidade. Não se pode ser fiel apenas quando o ambiente é favorável. Fiel é preciso ser sempre.
Tudo isto continua a ser actual, pertinente. Se não podemos ir ao deserto, urge fazer deserto. Todos os dias. O momento inicial é determinante. Começar o dia por um encontro profundo com Deus é essencial. Mais de uma hora era excelente, mas é difícil. Mesmo uma hora de contemplação não é fácil. Mas viver um dia de missão sem, pelo menos, uma hora de oração é um risco muito grande.
Só quem mergulha em Deus se habilita a mergulhar no Homem, na Vida, no Mundo.
«Maldito o que não gritasse no deserto, pelo receio de não ser ouvido por ninguém».
Assim escreveu (excessiva mas magnificamente) Balzac
Todas as perguntas se podem fazer.
O problema é que nem todas as respostas conseguimos dar.
As imagens que nos chegam da Madeira deixam-nos completamente descompensados, sem palavras.
Mais de 30 mortos, dezenas de feridos, muitos desalojados e, porventura, desaparecidos.
Em tão pouco tempo, a natureza revestiu-se de um vigor impante e desatou a levar tudo na frente.
Como nos sentimos tão pequenos diante de um cenário tão dantesco. A esta hora, nenhuma palavra servirá de conforto.
Que Deus receba os que morreram e que ofereça ânimo a quem sobrevive em condições tão adversas.
Foi Teilhard de Chardin um dos espíritos mais brilhantes que a última centúria conheceu.
Embora não se possa concordar com tudo (mas também nada nos une tanto como as nossas discordâncias, como asseverava Unamuno), tudo em Teilhard merece atenção. Era um homem sério, inteligente, transparente.
Se perguntarmos a Teilhard, o que é preciso para ser feliz, ouviremos: «Para ser feliz, é preciso reagir contra a tendência para o menor esforço, que nos leva a ficar quietos ou, então, a procurar na agitação exterior a renovação das nossas vidas. É no trabalho pela nossa perfeição interior que a felicidade nos espera».
Senhor,
dou-Te o meu silêncio.
Dá-me a Tua Palavra.
«Nas dificuldades, Deus dá-nos sempre algum sinal».
Assim escreveu (crente e magnificamente) António Jesus Cunha.
Eis-nos que continuamos a debater, em Igreja, o problema da comunicação.
Nada de traumático, diga-se. A problematicidade é conatural à condição humana. Ela está ínsita na viatoriedade própria da trajectória no tempo.
Mas há qualquer coisa de paradoxal. Não há, seguramente, outra instituição que tenha tanta gente a lidar com a comunicação.
São centenas os jornais que possuímos, as rádios que temos, as homilias que fazemos. É bom não esquecer que, todos os domingos, são cerca de dois milhões de pessoas que nos ouvem em todo o país.
E, no entanto, a mensagem parece que não chega, parece que não passa. Aura Miguel pôs, recentemente, o dedo na ferida: «Falta uma certa agilidade na forma de a Igreja comunicar».
Julgo que o punctum saliens não está na habilidade de manobrar as palavras ou numa qualquer arte retórica, cénica ou representativa.
Isto terá o seu lugar, mas tudo se decide a montante: na autenticidade, na convicção.
É preciso não ter medo de assumir o que transportamos, o que acreditamos. É preciso dizer, sem vaidade e sem vergonha, o que nos move. E é fundamental fazê-lo de forma estruturada, directa, consistente. Sem grandes adornos. Urge mais coração, mais vibração, mais pathos.
«Se fores teólogo, rezarás verdadeiramente; se rezares verdadeiramente, serás teólogo».
Assim escreveu (orante e magnificamente) Evágrio de Ponto.
Sempre apreciei Pedro Barroso. Sempre achei que era um cantor (ou um cantautor) injustamente inapreciado.
Daí a atenção que dou ao seu diagnóstico: «Vivemos dias cinzentos. Dá vontade de voltar, outra vez, à canção de intervenção».
Ontem já era tarde. Ouçamos, de novo, Vergílio Ferreira: «Quando a situação é mais dura, a esperança tem de ser mais forte».
Tudo por Ti, Senhor.
Nada para mim, meu Deus.
Adoro-Te.
A alegria és Tu.
Fora de Ti é o tédio.
Longe de Ti é o vazio, o nada.
Neste dia de recolhimento orante, não esqueci tantos que me têm ungido com o precioso dom da amizade.
Como esquecer quem nunca esquece?
É o mínimo pelo máximo.
O mínimo que posso fazer é a oferta da minha pobre oração pelo máximo que, para mim, é a vossa devotada estima
«A amizade é algo grande, mas começa com coisas pequenas».
Assim escreveu (oportuna e magnificamente) Carlo Maria Martini.
«Imaginai o mundo como uma circunferência em cujo centro está Deus, e cujos raios são as diferentes experiências de vida dos homens. Se todos aqueles que se querem aproximar de Deus se dirigirem para o centro, ao mesmo tempo que se estão a aproximar de Deus estão a aproximar-se dos outros. Quanto mais se aproximarem de Deus, mais se aproximam dos outros. E quanto mais se aproximarem dos outros, mais se aproximam de Deus».
Assim escreveu (tocante e magnificamente) Doroteu de Gaza
Ficamos extasiados diante de um quadro, embevecidos diante de uma paisagem, deslumbrados diante de um monumento, arrebatados diante de um livro.
Partilho de todos estes sentimentos. Compreendo a alegria dos autores de todas estas obras.
Urge, porém, prestar atenção à obra mais bela que existe à face da terra.
Sabe qual é? Cada pessoa.
Educar um ser humano é a melhor construção em que se pode participar.
Cada pessoa é um campo aberto, um terreno arável e um alfobre fecundo. De certa forma, não somos pessoas; tornamo-nos pessoas.
Porque é que, tantas vezes, nos desumanizamos. Porque é que, frequentemente, o crescimento de uma pessoa é visto como um crescimento em desumanidade?
Olhemos para cada pessoa como a obra mais bela que Deus compôs e que colocou à nossa frente, ao nosso lado.
Demos uma oportunidade ao melhor de nós mesmos!
Todos somos homens. Sejamos todos humanos!
Deus habita na humanidade de cada homem, de cada pessoa!
Deus é o maior investidor na nossa humanidade, na nossa humanidade feliz. A prova? Aceitou, em Jesus Cristo, morrer por nós.
Haverá maior sinal de confiança, maior prova de amor?
É a Igreja, antes de mais e acima de tudo, o lugar do amor (locus amoris).
Diz Karl Rahner: «O cristão, ao conceber a Igreja como a tangibilidade histórica da presença de Deus, experimenta-a como o lugar do amor, do amor para com Deus e para com o próximo. Ambos os amores, quando levados a sério, são experimentados na vida humana como o que é dado, como algo que o Homem não pode produzir por si mesmo».
A vida actual permite-nos estar em toda a parte sem sair do mesmo lugar.
Podemos, no fundo, ser peregrinos sem que nos tornemos viajantes. Mesmo dentro de nós próprios, sentimo-nos nómadas.
Somos contemporâneos de todos os acontecimentos, participantes de uma mesma história.
Em cada pessoa, tocamos a humanidade. Em cada sítio, palpitamos o mundo.
Razão tinha, pois, Miguel Torga: «Universal é o local sem os muros».
Ainda que que alguns pensem erguê-los, o sonho acaba sempre por derrubá-los!
O problema não é a distância que nos separa dos lugares. É a distância que nos pode afastar das pessoas.
Pensar a Igreja é pensar o amor, a esperança, a possibilidade de começar constantemente depois de cair continuamente.
Pensar a Igreja é ter a disponibilidade para nunca desistir nem jamais desacreditar.
Pensar a Igreja é confiar no Espírito que a conduz e inspira.
Pensar a Igreja é andar, caminhar, trilhar os passos desta aventura que se chama simplesmente viver: viver para Deus, viver com os outros!
Isto pode acontecer inclusive quando estamos fisicamente sós. Quanto mais sós, menos sozinhos! Amar é mesmo ultrapassar-se!