Há quem defenda que devemos calar as dores, afogar os males, ignorar as mágoas e silenciar as injustiças. Confesso que eu mesmo já cheguei a pensar assim.
Admiro quem, por estoicismo ou por ascese, é capaz de guardar tudo (incluindo as piores afrontas) no seu íntimo.
Não haverá uma regra universal, mas, se absolutizássemos este princípio, nenhuma doença seria curada e nenhum mal seria combatido.
Por outro lado, se Ellie Wisel pensasse deste modo, ter-nos-ia privado de obras como Noite, Dia, Amanhecer ou O esquecido, autênticas denúncias da chacina perpretada por Hitler.
Se Miep Gies, que acaba de falecer, também pensasse assim, não nos teria legado o extraordinário diário de Anne Frank, outro repositório vivo da tragédia nazi.
Aliás, se os primeiros cristãos também enveredassem por este caminho, não nos teriam deixado as actas dos mártires.
E, à cabeça de tudo, temos os Evangelhos, que não escondem os horrores por que passou o Filho de Deus.
Por muito nobre que seja, o silêncio, por vezes, é aliado da injustiça. E à colação acaba por vir sempre o alerta de Shibi Ebadin: «Se não podeis vencer uma injustiça, pelo menos contai-a a todos».
Não caiamos nunca no oitavo pecado mortal, aquele que, porventura, mais nos tenta hoje em dia: o pecado da indiferença.