Como se a realidade já não fosse suficientemente dolorosa, ainda temos de suportar um repetido discurso oxidante.
Dissolvido o ruído e espremidas as palavras, nada se altera. Ou, melhor, tudo parece mudar. Para pior.
Cada interveniente dá a impressão de possuir a bússula que nos levará a Ítaca. Acontece que a austeridade que nos impõem assemelha-se, cada vez mais, aos sinuosos trabalhos de Sísifo. São trabalhos que agravam penas, mas que aparentam não valer a pena.
O acórdão do Tribunal Constitucional, invocando o princípio da equidade, tanto dá para repor os direitos (o que é improvável) como para estender os sacrifícios (o que se mostra iminente).
Há, no entanto, uma ressalva que ainda não vi comentada. Quando se alega que o fim dos cortes dos subsídios não ocorrerá em 2012, para não comprometer as metas do défice, abriu-se uma precedência e ter-se-á feito jurisprudência.
Cumprir as metas do défice voltará a ser uma prioridade em 2013 e nos anos seguintes. Voltará o Tribunal Constitucional a aceitar que os subsídios sejam cortados? O argumento será (fatalmente) invocado.
Também espanta que as múltiplas «excepções» ao fim dos referidos cortes não tenham sido escrutinadas. Essas «excepções», que faz com que quem ganha mais não tenha reduções, é que ferem (e muito) o princípio da equidade.
É sabido que a situação não é fácil e que a realidade é muito poderosa. Mas o povo já não aguenta mais!