Por vezes, os olhos dos outros dizem mais sobre nós do que nós próprios. E, não raramente, até precisaremos desse olhar para recuperar a auto-estima perdida.
O ateu deve estar atento às justificações dos crentes. O crente deve estar atento às interrogações dos ateus.
Alain de Botton acaba de lançar «Religião para ateus» (ed. D. Quixote), apresentando a fé aos que, como ele, consideram não ter fé.
E nas religiões valoriza, desde logo, as respostas simples para problemas complicados.
É claro que, em nome da religião, também se mata. Mas as religiões «dizem-nos que podemos apertar a mão a um estranho».
Isto parece demasiado trivial, mas porventura é o gesto mais transcendente que praticar se pode.
Outro aspecto tem que ver com a ideia de comunidade.
Quando vamos a uma cidade, podemos ter um guia que nos fala de lugares novos.
Mas dificilmente entabulamos diálogo com desconhecidos.
Já «as comunidades religiosas têm anfitriões, alguém que apresenta desconhecidos e torna possível a comunidade».
No mundo hodierno, abundam edifícios para comprar tudo, mas faltam lugares «para fazer qualquer coisa dentro de nós próprios, na nossa alma».
É interessante notar como também um ateu fala de alma, da «nossa alma».
E mais notável ainda é verificar que aquilo que um ateu mais sublinha nas religiões é o Mistério, esse mistério tantas vezes ostracizado e vulgarizado em ambientes religiosos.
«Gosto de muitos conceitos religiosos, mesmo que não acredite neles».
De igual modo, «a ideia de que os seres humanos têm falhas é muito interessante. Trata-se de um óptimo ponto de partida para a vida social».
Será possível a um ateu imaginar Deus? Sim. «Como alguém que está presente, que olha por ti, que conhece a tua mente melhor do que tu mesmo. Admito que quem acredita tem esperança de que Deus o vai ajudar a encontrar o caminho. Porque Deus é amor e por isso nunca se está sozinho».
É certo que Botton não considera isto plausível. Mas, a haver Deus, é assim que O imagina. E, de facto, não está nada longe da verdade!