O acontecimento de Deus nos acontecimentos dos homens. A atmosfera é sempre alimentada por uma surpreendente Theosfera.

Segunda-feira, 28 de Fevereiro de 2011

As ideias feitas são ociosas. Toda a gente as repete sem, muitas vezes, pensar nelas.

 

Questionar as ideias feitas é, pois, um imperativo.

 

Malcolm Gladwell tem-se especializado em desmontar muitas dessas ideias feitas. Por exemplo, a importância das redes sociais, tão em voga e tão apressadamente idolatradas.

 

Aprecio quem tem a coragem da ousadia, quem procura outras águas para lá da corrente em que todos navegam.

 

Há sempre um outro lado que importa ter em conta.

 

Hoje, as coisas tendem a correr por vagas. O pensamento dominante facilmente degenera em pensamento único.

 

É a era dos estereótipos, das atitudes estilizadas.

 

Desde o falar ao vestir, repetimos modelos e imitamos supostos ídolos.

 

A diferença tem um preço. Mas vale a pena correr riscos para que cada um seja ele mesmo.

publicado por Theosfera às 23:35

1. Chamam-lhe acordo, mas é de desacordo o ambiente que se respira em torno dele.

 

Qualificam-no, depois, como acordo ortográfico e a dúvida surge a respeito do orto, isto é, do padrão que serve de referência para a nova grafia.

 

Eis, portanto, uma questão que nos aparece sob a égide da contradição e da indefinição.

 

Os termos que a enunciam têm sido, a cada passo, desmentidos pela realidade da discussão.

 

Poderá ter existido acordo entre as delegações dos países. Mas está longe de haver concordância na sociedade portuguesa.

 

Uma decisão desta magnitude devia ser precedida de um amplo debate até porque ela interfere, directamente, na vida das pessoas. São estas os falantes. São estas os escreventes. Porque não escutá-las?

 

Mas mesmo na comunidade científica a tónica está longe de ser a convergência.

 

Há profundas fracturas e notórias clivagens entre os diversos posicionamentos.

 

Há perspectivas válidas que deviam ser tidas em conta. Há contributos que mereciam ser incluídos. E há advertências que seria bom acolher.

 

 

2. Não há dúvida de que a língua é um instrumento maleável e um processo aberto.

 

É sensato estar atento às flutuações que se verificam e procurar os equilíbrios necessários.

 

As palavras têm uma origem e assumem uma direcção que é impossível descrever por antecipação.

 

O pêndulo vai, assim, oscilando entre a etimologia e a sonoridade. A tendência, como é sabido, aproxima-se do som. O primeiro impulso é para se escrever conforme se fala.

 

É então que a aprendizagem faz o seu trabalho e executa o seu papel.

 

A sonoridade é um elemento importante, mas não é o critério decisivo nem, muito menos, o critério único.

 

Este (delicado) jogo de equilíbrios permite que se vá fazendo adaptações sem que se desfigure o património linguístico.

 

É assim que, por exemplo, escrevemos farmácia e não pharmácia (porque a sonoridade é efe), mas continuamos a grafar hoje (embora o agá seja mudo).

 

Ou seja, a experiência mostra que as reformas na grafia têm consistido em adaptações. O que se está a passar, agora, é, talvez, mais do que isso. Em vez de uma adaptação, poderemos estar em vias de um desfiguramento.

 

E, nesse caso, é a identidade que está em causa.

 

 

3. É certo que, também aqui, valerá o dito de Pessoa: «Primeiro estranha-se, depois entranha-se».

 

Diante do facto consumado, não sobrarão muitas alternativas. E lá continuaremos a chamar língua portuguesa à nova grafia.

 

Mas quando o citado Pessoa diz que «a minha pátria é a língua portuguesa», é caso para perguntar se, a partir de agora, estaremos a falar da mesma entidade, isto é, da mesma língua que ele tão bem cultivou.

 

Tudo indica que a matriz da nossa língua se está a tropicalizar excessivamente.

 

Basta atentar neste pormenor, nada despiciendo e bastante significativo.

 

A palavra actor vai passar a ator, deixando cair o c. Ora, o espanhol, o francês e o inglês mantêm o referido c.

 

Isto significa que, em matéria linguística, estamos a distanciar-nos da Europa.

 

A norma já não é tanto a etimologia, mas a sonoridade. Só que aqui também o critério não é uniforme. Basta notar que o h mudo se mantém.

 

Daí que o orto de ortografia seja cada vez mais difuso. Mas é indiscutível que a matriz portuguesa da língua portuguesa está bastante obscurecida.

 

Aliás, quando se acentua a sonoridade como padrão, o problema já nem se coloca entre Portugal e outros países.

 

Mesmo em Portugal, há pronúncias muito diferentes e isso nunca pôs em risco o uso da mesma grafia.

 

 

4. E é aqui que deparamos com a questão da necessidade de um acordo deste género.

 

Será que era mesmo preciso uniformizar a escrita num espaço tão amplo?

 

Se um único país como a Espanha convive bem com várias grafias, porquê esta sofreguidão em impor a mesma escrita entre países tão diversos?

 

A diversidade é uma riqueza. A vontade de tudo regulamentar não ajuda muito.

 

Se há cada vez mais pessoas a ler livros em diversas línguas, haveria alguma dificuldade em ler ora o Português de Portugal ora o Português do Brasil?

publicado por Theosfera às 12:03

Muito se fala, por estes dias, de prémios e de óscares.

 

Confesso que me entedia o palco de vaidades em que tudo acaba por redundar.

 

Esta noite foi o desfile habitual de expectativas, contentamentos e frustrações.

 

O grande vencedor foi O Discurso do Rei.

 

É curioso que, no universo da imagem, seja o tema da palavra a triunfar.

 

Trata do bloqueio que sentia Jorge VI ao falar em público.

 

Era gago profundo.

 

É um tema que me interessa profundamente et pour cause. Procurarei ver na primeira oportunidade.

publicado por Theosfera às 10:56

Domingo, 27 de Fevereiro de 2011

O prioritário é a mensagem.

 

E a mensagem de Jesus está centrada no Reino de Deus e (coisa não despicienda) na sua justiça.

 

O Reino, como é sabido, não é uma grandeza territorial nem uma magnitude política.

 

O Reino é uma expressão que indicia a presença de Deus em cada pessoa.

 

Trata-se de uma presença implicativa. Acolher o Reino implica propor ao mundo os valores que ele veicula. À cabeça desses valores está a justiça.

 

Jesus, na Sua pregação, foi muito parcimonioso ao falar da Igreja.

 

O prioritário é a mensagem: o Reino de Deus e a justiça.

 

A Igreja é importante na medida em que servir de eco à presença e à mensagem de Jesus.

 

Não pode posicionar-se como um estorvo.

 

Daí que o centro da Igreja não esteja nela. A Igreja tem de se descentrar para se recentrar.

 

O centro da Igreja tem de ser o centro de Jesus: Deus e o Homem.

 

Não estreitemos o que Ele alargou.

publicado por Theosfera às 16:31

Sábado, 26 de Fevereiro de 2011

Desceram a imagem por causa das obras e começaram a aparecer exclamações de desencanto.

 

O belo é difícil de figurar e praticamente impossível de consensualizar. Daí a subtileza do surrealismo. Cada um alvitra a sua própria obra.

 

Há uma sageza profunda na doutrina iconoclasta.

 

O sagrado imagina-se mas não se reduz a imagens.

 

Sobressai sempre uma sensação de desconforto.

 

Fica sempre aquém a imagem da realidade imaginada.

 

É mais indicativa que demonstrativa. É uma espécie de vislumbre que apela a uma presença que se sente como ausência.

 

Acresce que a grande imagem do divino não passa em qualquer tela. Passeia-se em carne e osso, às vezes mais osso que carne.

 

A imagem de Deus é o Homem. Mas quem vê Deus no Homem?

publicado por Theosfera às 19:15

Sexta-feira, 25 de Fevereiro de 2011

Confesso que me impressionam o pessimismo iluminado e a contundência lúcida de Enrique Vila-Matas.

 

Há quem, em nome do pensamento positivo, evoque o que não se vê, o que provavelmente não existe.

 

O escritor catalão coloca o dedo numa ferida muito sensível.

 

Para ele, a literatura não passa por um bom momento. Discorre mesmo sobre o fim da literatura e dos verdadeiros escritores.

 

É claro que se escreve muito, hoje em dia.

 

Mas, no geral, a qualidade anda afastada.

 

Eu sei que isto fere muitos e desencanta alguns.

 

Mas partilho do essencial deste diagnóstico. «A situação actual da literatura não poderia ser mais lamentável».

 

Concretizando, «o pior defeito que os escritores têm é a vaidade. Há, no meio dos escritores, uma quantidade de gente de valor muito discutível, mas acham-se absurdamente importantes. Suspeito que há gente de maior nível intelectual noutros meios, como o científico. O convencimento e a vaidade deveriam ser banidos da literatura porque são sempre sentimentos estúpidos».

 

E vem uma regra de ouro: «Onde há humildade, há saber».

 

Sem humildade, não há procura. E a procura é a bússola que acede à sabedoria. Que é muito diferente da presunção.

 

Hoje tende a predominar o deslumbramento. O que aparece em muitos livros, jornais e sítios da net deixa muito a desejar. Não há muita qualidade. A rapidez de uma opinião quase ofusca, como denuncia José Manuel dos Santos, a lentidão de um pensamento.

 

É claro que há excepções. Mas, como sempre, servem apenas para confirmar a regra.

 

É a regra da mediania que prevalece. Que ocupa o espaço.

 

Até porque, volto a Vila-Matas, os leitores tornaram-se mais passivos que interessados.

publicado por Theosfera às 10:26

Há mais uma suspeita (sempre ela) a macular uma decisão de acaba de ser tomada.

 

Havia um programa, na Sic-Notícias, que colocava o dedo em algumas feridas.

 

Era conduzido por Mário Crespo e tinha como comentador principal Medina Carreira. Na última edição, juntou-se-lhes Henrique Neto.

 

Pode não se gostar do estilo, nomeadamente da contundência, mas há uma pertinência indiscutida no que é dito.

 

Soube-se que, entretanto, o programa foi suspenso. A justificação oficial é a necessidade de reestruturação.

 

Pode ser a realidade. Mas pode também tratar-se de um eufemismo. Até porque antecedentes não faltam.

 

Medina Carreira levava números e apontava factos. Henrique Neto levantou a nuvem acerca do que se passa nalguns bastidores.

 

Confesso que até nem aprecio por aí além este género de intervenção.

 

Mas a liberdade é um princípio.

 

Uma coisa é não ver quem não quer ver. Outra coisa é não poder ver quem pretende ver.

 

E será que é pior identificar os problemas do que provocar os problemas?

 

Estamos em recessão.

publicado por Theosfera às 10:17

Quinta-feira, 24 de Fevereiro de 2011

O sol escarafunchou a espessura das nuvens, as bátegas da chuva e até a estridência dos trovões e conseguiu aparecer.

 

Tem o sol modos discretos de agir e uma forma clara de estar.

 

O poeta via Deus na claridade do sol.

 

Mas confesso que já sinto nostalgia das manhãs cinzentas e das noites precoces.

 

Sem ventanias fortes, há um encanto sublime na neblina mansa, no frio sonolento, na chuva cadente.

 

Tudo é mensagem e aprumo.

publicado por Theosfera às 11:54

Há uma ausência crepuscular que, aqui e ali, percorre a alma das gentes.

 

Lamego parece já não tocar o passado que a teceu nem agarrar o futuro que sonhou.

 

O olhar dos lamecenses surge atravessado de uma melancolia lúgubre que até acaba por lhe emprestar algum encanto.

 

Não é a Bíblia que diz (vamos lá nós saber porquê) que a tristeza é melhor que o riso?

 

publicado por Theosfera às 10:57

Na neblina da informação, que nem sempre permite o acesso diáfano à realidade, os números começam a ser assustadores.

 

Fala-se já em dez mil mortos na Líbia.

 

É impossível antever o desfecho, mas creio ser possível meditar sobre os (ínvios) caminhos que estão a ser trilhados.

 

Há um líder que não separa o poder da existência. Para ele, sobreviver é mandar. Sem poder, não há vida.

 

Por isso é que ele diz que prefere morrer como mártir.

 

Não é seguramente por causa do povo, tanto mais que ele increpa rudemente os seus concidadãos apodando-os de «ratos»!

 

Trata-se dos extremos a que conduz uma autocracia desmedida.

 

O que tem de ser tem muita força. Força entremeada (infelizmente) com imenso sangue...

publicado por Theosfera às 10:50

Quarta-feira, 23 de Fevereiro de 2011

Há tantos que se apresentam com respostas seguras acerca do presente e até do futuro.

 

Parece que está tudo concebido, decidido, determinado.

 

Sucede que a vida não é só o lugar das respostas. É também - e bastante - o lugar das perguntas.

 

É fundamental pôr-se à espera. Colocar-se à escuta.

publicado por Theosfera às 11:40

Num mundo de desconfianças, já nem nos prenúncios de mudança se confia.

 

Prossegue o desfile de preconceitos acerca do que se passa na Tunísia e no Egipto.

 

É claro que a Líbia está tingida de sangue por causa da desmesura do apego ao poder do seu líder.

 

Mas dizer que há uma incompatibilidade entre a cultura islâmica e a democracia é algo que precisa ser provado.

 

A Indonésia e a Turquia têm predominância islâmica e são democracias.

 

Não são perfeitas, é certo. Mas sê-lo-ão as nossas?

 

A liberdade é um longo caminho cuja meta ainda ninguém atingiu.

publicado por Theosfera às 11:30

Terça-feira, 22 de Fevereiro de 2011

Há sempre qualquer coisa a ligar o grande e o pequeno, o macro e o micro, o mais impactante e o aparentemente irrelevante.

 

Enquanto as ruas da Líbia se transformam em campos de batalha pela liberdade, numa modesta casa de Lisboa travava-se uma dramática luta pela vida, pela sobrevivência, pela dignidade.

 

A quantas portas se bateram. Quantas portas se terão fechado. Até que os limites foram ultrapassados.

 

Estiveram casados 62 anos. Alguém poderá dizer que não houve amor neste casal?

 

Mas nem sempre o amor consegue o milagre de suportar o outro. Ela tinha 89 anos e estava com Alzheimer. Ele contava 85 e, pelos vistos, não aguentou mais.

 

Matou-a e matou-se.

 

A sociedade só soube depois da tragédia. Ao longo do drama, ninguém apareceu. Ou ninguém quis saber.

 

Nas ruas da Líbia ou numa simples habitação, o problema é, basicamente, o mesmo: o outro pode chegar a ser insuportável.

 

Como é possível?

publicado por Theosfera às 09:46

Segunda-feira, 21 de Fevereiro de 2011

Exilado num tempo que mal conheço e asilado num mundo em que dificilmente me reconheço, dou comigo, amiúde, a recordar tardes de domingo da minha adolescência.

 

Naquela altura, era a única altura em que se podia ouvir rádio. E ouvir rádio, nas tardes de domingo, era ouvir futebol.

 

Enquanto o olhar lobrigava horizontes rasgados pelo sol, os ouvidos colavam-se ao transístor.

 

Os relatos chegavam de um lado, mas os golos atropelavam-se de quase todos os lados.

 

Sendo os jogos quase todos à mesma hora (três da tarde), aqueles momentos tornavam-se uma torrente de vibração.

 

Eram domingos em que o diálogo se fazia a partir do que a imaginação figurava desde longe.

 

Eram domingos em que, parafraseando a composição de Eduardo Olímpio musicada por Paco Bandeira, «íamos ao campo e éramos felizes».

 

Também havia domingos com «piquenique e grafonola» e «o Benfica que vai pagá-las em Alvalade».

 

Eu achava graça a esta última parte, até porque raramente acontecia. Mas, pelo menos, os ouvidos ficavam um pouco extasiados.

 

Já agora, a parte mais bonita da canção era o remate: «Aos domingos há o canário que, na gaiola, canta a canção de mais um dia de liberdade».

 

Tudo isto vem a propósito de mais um jogo entre Sporting e Benfica (não digam Sporting contra Benfica), agendado para uma segunda à noite.

 

Haverá os seus motivos, mas nada que se compare àquelas partidas das tardes de domingo, em que nada acabava mal mesmo se nem tudo corresse bem.

 

O Sporting podia não ganhar, mas a amizade e a convivência venciam sempre. À volta de um pequeno rádio de pilhas.

publicado por Theosfera às 16:21

1. Não é por falta de bons textos que não temos melhores práticas.

 

Se pretendermos encontrar o discurso mais belo de sempre, muitos apontarão o Sermão da Montanha, indicando, especialmente, as Bem-Aventuranças.

 

 Ali estão, com efeito, as bases da maior revolução. Ali, a vida é vista ao contrário.

 

Para Jesus, felizes não são os ricos, os que vencem as guerras ou os que dominam as situações de modo controlador.

 

Para ele, felizes são os pobres, os construtores da paz e os puros de coração, que não poucos chamarão ingénuos.

 

De facto, o Sermão da Montanha, como reconhece Heiner Geibler, «virou do avesso tudo aquilo que era considerado válido no Estado e na sociedade já que pretendia criar uma ordem radicalmente nova na convivência entre os seres humanos».

 

Contrariando o Mestre a ordem vigente, é, no mínimo, estranho que a Igreja apareça, tantas vezes como suporte dessa mesma ordem.

 

Nesse caso, Jesus surge não apenas como subversivo para o mundo, mas também como um permanente incómodo para a própria Igreja.

 

 

2. É, pois, enorme a pertinência de um conhecido conto de Dostoievski.

 

O grande inquisidor andava a perseguir os hereges para (supostamente!) defender a doutrina de Jesus. Mas eis que o próprio Jesus lhe aparece, censurando o seu comportamento.

 

O inquisidor não foi de modas. Mandou prender Jesus, porque — imagine-se — achava que Ele estava a perturbar a Igreja!

 

Os ideais de Jesus eram bons, mas irrealizáveis. Os homens não eram capazes de construir um reino de amor com a liberdade que Deus lhes dera.

 

A liberdade deveria ser retirada aos seres humanos. A Igreja asseguraria pão para as pessoas, mas estas deveriam submeter-se à sua autoridade.

 

 

3. Decididamente, Jesus não caiu nas boas graças dos poderosos.

 

Hitler considerava a Sua mensagem um veneno pois vinha estragar «os maravilhosos instintos dos seres humanos».

 

Alguns círculos marxistas olhavam para o Sermão da Montanha como um obstáculo para as mudanças revolucionárias de cariz violento.

 

Tão revolucionário foi Jesus que até recusava os métodos habituais das revoluções. Jesus propugnava a mudança, mas rejeitava a violência. A paz era a regra. O amor tinha de ser a lei.

 

Não faltou também quem optasse pela simples troça. Bismark afirmou, várias vezes, que não é possível fazer um Estado com o Sermão da Montanha.

 

E até Martinho Lutero sustentou que o lugar do Sermão da Montanha não era a câmara municipal porque não se pode governar com ele!

 

É que, de novo segundo Bismark, sem a norma do Sermão da Montanha, é possível fazer política de forma mais aliviada, isto é, com menos escrúpulos!

 

 

4. Reconheçamos que o Sermão da Montanha incorpora um patamar de conduta de altíssima exigência.

 

Daí que subsista como um ideal, para muitos, inatingível. Mas não. O Sermão da Montanha é realizável. Mais, é inadiável. Ele é opção para todos e terá de ser prioridade para muitos.

 

A chave de interpretação poderá ser encontrada na parábola do bom samaritano (cf. Lc 10). Todos são convidados a estar próximos de quem está em dificuldade, de quem sofre a injustiça.

 

Esta proximidade samaritana não passa apenas pela ajuda imediata. Passa também (e bastante) pela mudança das estruturas.

 

 Há, com efeito, situações de injustiça, de abuso de poder, de opressão e de desumanização que contrariam frontalmente o amor ao próximo.

 

 Não basta identificar estas situações. É fundamental ajudar a transformá-las.

 

O Sermão da Montanha instaura um perfil de vida feliz e felicitante. Não somente para amanhã. Mas para hoje. Para agora. Para já.

 

Impossível é o que não existe para Deus. Nem para os que estão em Deus.

publicado por Theosfera às 11:56

Ao invés do que sucede nas ciências exactas, na história não há resultados garantidos. Há, sim, fórmulas testadas, experiências tentadas, caminhos percorridos, desfechos incertos.

 

Só no fim se sabe se o feito se torna per-feito ou se redunda em de-feito.

 

A multidão que, na Tunísia e no Egipto, depôs regimes autoritários está a sentir, na Líbia, a crueldade do autoritarismo.

 

Na Líbia, por agora, não é o ditador que sai. São as pessoas que morrem.

 

O número de vítimas, para já incerto, vai subindo.

 

De tudo quanto está a ocorrer no mundo árabe sobra uma certeza e solta-se uma inquietação.

 

Não é só a pobreza que desencadeia a revolta. Como bem refere Dani Rodrik, a Tunísia e o Egipto até tinham bons indicadores económicos.

 

Acontece que, acrescenta o professor de Harvard, «uma boa economia não significa necessariamente uma boa política».

 

O crescimento económico, já notara Samuel Huntington, reforça a consciência política e aumenta o padrão de exigência por parte das populações.

 

O povo está mais atento e torna-se mais interveniente. Ora, isto leva-nos à China.

 

A China está a passar por um surto de desenvolvimento económico ímpar. E, como é sabido, os protestos têm aumentado. Tianamnen é um símbolo e, porventura, uma viragem.

 

O poder acha que, através da economia, pode contentar o povo. Só que a experiência mostra que é sensato não contar com o progresso económico para quem quer que seja se perpetuar no poder.

 

Se esta vaga de explosão contestatária chegar à China, que acontecerá?

publicado por Theosfera às 10:37

A Suíça é um país rico e, não obstante, fixou um tecto para as reformas no sector público: 1700 euros.

 

As boas práticas não poderãoser transpostas?

publicado por Theosfera às 10:36

Domingo, 20 de Fevereiro de 2011

O sol começa a espreitar. Mas logo sobrevém a tempestade, que despeja água a rodos e faz voar ventanias sem fim.

 

O clima não é apenas uma realidade. É também uma metáfora.

 

Umas vezes, a tempestade vem depois da bonança. Outras vezes, é a bonança que se segue à tempestade.

publicado por Theosfera às 22:12

São vários os domingos em que nos são servidos, na mesa da Palavra da Eucaristia, excertos do Sermão da Montanha.

 

Ele abre, como é sabido, com o enunciado das Bem-Aventuranças e prossegue com uma série de apelos à mudança de vida.

 

Acontece que a beleza desta mensagem parece inversamente proporcional à nossa disponibilidade para a respectiva vivência.

 

O Sermão da Montanha ecoa no nosso coração, mas parece distante da nossa vida.

 

Muitas vezes, optamos por acrescentar uma torrente de conceitos sem que nos dediquemos a viver a mensagem de Jesus.

 

Mais, passamos grande parte do tempo a arranjar justificações para o seu incumprimento quando o normal seria procurar forças para a sua aplicação.

 

Pertinente é, por isso, o conto de Dostoievski, que nos apresenta o encontro entre o grande inquisidor e o próprio Jesus, que lhe aparece em Sevilha no decurso de uma perseguição aos hereges.

 

O inquisidor achava que Jesus estava a perturbar a Igreja! Por isso, mandou prendê-Lo, alegando que os homens não eram capazes de construir um reino de amor com a liberdade que Deus lhes dera.

 

A liberdade deveria ser retirada aos seres humanos. A Igreja asseguraria pão para as pessoas, mas estas deveriam submeter-se à sua autoridade.

 

Ou seja, Jesus era não só um problema para muitos interesses do mundo como estava a tornar-Se subversivo para a Sua própria Igreja.

 

A Sua mensagem era excelente, mas inaplicável.

 

E, de facto, o Sermão da Montanha, como reconhece Heiner Geibler, «virou do avesso tudo aquilo que era considerado válido no Estado e na sociedade já que pretendia criar uma ordem radicalmente nova na convivência entre os seres humanos».

 

Hitler achava tudo isto um «veneno» pois vinha estragar «os maravilhosos instintos dos seres humanos». Também o marxismo considerava o Sermão da Montanha um obstáculo para as mudanças revolucionárias de cariz violento. Jesus propuganava a mudança, mas rejeitava a violência. A paz era a regra. O amor tinha de ser a lei.

 

Não faltou quem optasse pela simples troça. Bismark afirmou, várias vezes, que não é possível fazer um Estado com o Sermão da Montanha. E até Martinho Lutero sustentou que o lugar do Sermão da Montanha não era a câmara municipal porque não se pode governar com ele!

 

É que, de novo segundo Bismark, sem a norma do Sermão da Montanha, é possível fazer política de forma mais aliviada, isto é, com menos escrúpulos!

 

Muitas vezes, a própria Igreja se inclinou a sugerir o Sermão da Montanha como opção apenas ao alcance dos monges, os únicos que poderiam alcançar a perfeição. Já os cristãos que vivem no mundo estariam fora do seu alcance.

 

É indiscutível que o Sermão da Montanha é incómodo para todos, desde logo para a Igreja. Nem sempre o compromisso com a pobreza, a justiça e a paz é notório. Nem sempre tem estado ao lado dos perseguidos. Não raramente, é conivente com os perseguidores e indiferente às perseguições.

 

O Sermão da Montanha subsiste como um ideal, para muitos, inatingível. Daí a tendência para ser colocado no puro domínio da retórica.

 

Mas não. O Sermão da Montanha é realizável. Mais, é inadiável. Tem de despontar como a prioridade para todos.

 

Como bem anota Heiner Geibler, a chave de interpretação do Sermão da Montanha encontra-se na parábola do bom samaritano (cf. Lc 10). Todos são convidados a estar próximos de quem está em dificuldade, de quem sofre a injustiça.

 

Esta proximidade samaritana não passa apenas pela ajuda imediata. Passa também (e bastante) pela mudança das estruturas.

 

Há, com efeito, situações de injustiça, de abuso de poder, de opressão e de desumanização que contrariam frontalmente o amor ao próximo.

 

Não basta identificar estas situações. É fundamental ajudar a transformá-las.

 

O Sermão da Montanha instaura um perfil de vida feliz e felicitante. Não somente para amanhã. Mas para hoje. Para agora. Para já.

 

O Sermão da Montanha não pertence ao irrealizável. Pode parecer irrealizado. Mas não é impossível.

 

Impossível é o que não existe para Deus.

publicado por Theosfera às 00:00

Sábado, 19 de Fevereiro de 2011

 «Uma pessoa só tem o direito de olhar outra de cima para baixo quando está a ajudá-la a levantar-se».

 Assim escreveu (notável e magnificamente) Gabriel Garcia Márquez. 

 

 

 

 

publicado por Theosfera às 21:22

Dói-me o facto e desgosta-me a notícia.

 

Se foi verdade, é claro que não foi correcta a atitude.

 

Um conhecido político terá passado à frente dos pacientes, num centro de saúde, para obter um atestado médico.

 

Mas daí até dar a notícia de um modo justiceiro, com a exibição de um telefonema para a directora do referido centro, vai uma grande distância.

 

Deve haver um certo pudor no tratamento destes casos.

 

Para tristeza já bastam os factos. A informação deve ser pautada por uma elevação discreta. Fazer espectáculo com o degradante só ajuda a degradar.

 

Uma reflexão é precisa.

publicado por Theosfera às 18:23

Seis da tarde e ainda há uma nesga de sol.

 

Mas, estranhamente, já tenho saudades do cinzento, da noite, do recolhimento, da reflexão, da obscuridade iluminadora.

 

 

publicado por Theosfera às 18:19

Os lucros aumentaram, os salários subiram e ainda houve um prémio monetário para cada trabalhador.

 

Aconteceu em Portugal, no país da crise.

 

Seria oportuno fazer um estudo acerca do que funciona bem entre nós.

 

E nem seria de todo despropositado pedir conselhos aos nossos melhores gestores. Ou até - quem sabe - que dessem um contributo na governação.

 

É certo que o princípio de Peter tem a sua influência, mas quem sabe gerir bem uma casa ou uma empresa está adornado da melhor credencial.

 

Ou para servir a coisa pública será obrigatório vir dos partidos?

 

Os partidos são importantes, mas não esgotam a totalidade das forças vivas de um povo.

publicado por Theosfera às 12:47

Era a primeira coisa que fazia quando o jornal me chegava às mãos.

 

Antes mesmo do jornal, ia logo ao suplemento. Era como uma leitura antes da leitura.

 

A crónica de José Manuel dos Santos nunca me desiludia e sempre me interpelava.

 

Como ele diz, falava pouco do que se fala muito e falava muito do que se fala pouco. Mas, fosse como fosse, fazia-o de uma maneira única, elegante, sem ser afectada.

 

Pelos vistos, este ritual vai ser interrompido. Interrompido, pois antevejo que não vão faltar propostas para que o autor continue a conviver connosco, seus fiéis leitores.

 

A liberdade é isto, é a possbilidade de se tomarem as decisões mais inesperadas e as medidas mais descabidas.

 

Às vezes, é preciso refrescar uma equipa. Só que José Manuel dos Santos destaca-se por isso mesmo: por ter uma escrita refrescante.

 

Há muita gente a escrever bem. Ninguém, porém, escreve como ele em Portugal.

 

Também há muita gente convencida e presumida. E, como é óbvio, não falta quem instrumentalize a escrita, fazendo dela uma via de acesso ao poder.

 

Será que só há lugar para a escrita política e para o comentário desportivo? Ou será crime ter qualidade?

 

O texto de hoje falava de despedida. Não pensava que fosse a do próprio autor.

 

Os leitores de um jornal são muito diferentes dos sócios de um clube. Como reagiriam os adeptos do Real se Ronaldo fosse dispensado?

 

Mas há que aceitar a realidade. Mesmo que não se compreenda muito do que nela ocorre.

 

As manhãs de sábado não vão ser iguais. Pode ser que outras manhãs se tornem diferentes.

publicado por Theosfera às 11:42

Depois do choque de civilizações, o conflito de interpretações.

 

Continuam a ouvir-se os desconfiados da revolução, quase a pender para a nostalgia das ditaduras.

 

Pelos vistos, há quem olhe mais para os seus conceitos do que para a realidade.

 

Husserl convidou-nos a deixarmo-nos envolver pelas coisas mesmas.

 

As coisas podem correr mal no Cairo. Mas será que, antes, corriam bem?

 

Deixemos que o povo celebre a liberdade. E demos tempo para que se alicerce a democracia.

 

 

publicado por Theosfera às 11:38

O exemplo - disse Albert Schweitzer - não é a melhor maneira de convencer os outros; é a única.

 

Eis um pensamento que devia estar gravado em muitos gabinetes ministeriais.

 

Os despedimentos aumentam, a cada dia. Os sacrifícios crescem, a cada instante.

 

Parece que o preço pela crise é para ser pago na base.

 

Porque é que, no topo, não se dá o exemplo?

 

Não será possível haver governos mais pequenos? Não será viável baixar nos salários dos gestores públicos?

 

As palavras não valem quando os exemplos não convencem.

publicado por Theosfera às 11:33

É muito doloroso ler notícias destas. Na Espanha, uma irmã foi afastada do seu convento porque tinha uma página no facebook muito visitada.

 

Haverá, possivelmente, outros motivos para esta decisão. O nosso conhecimento nunca se circunscreve ao que é visto. Depende sempre, muito mais, daquilo que não é visto.

 

Seja como for, palpita-me que a inveja terá feito o seu caminho e ditado a sua (implacável) sentença.

 

Há quem não suporte a autonomia nem tolere o êxito.

 

A irmã foi ao centro de emprego. Mas não pôde inscrever-se porque não descontara para a segurança social.

 

Aos 51 anos, ainda há muito caminho pela frente. Mas já não será cedo para começar caminhos que se julgariam iniciados.

 

Os direitos humanos deviam ser letra sagrada em toda a parte.

publicado por Theosfera às 11:26

Sexta-feira, 18 de Fevereiro de 2011

Quando os salários dos funcionários têm de baixar, o problema é a crise.

 

Quando os vencimentos dos gestores têm de se manter, a justificação são os objectivos e os resultados.

 

Será que esta justificação não se aplica aos funcionários? Se os que ganham muito precisam de muito para atingir objectivos e alcançar resultados, os que ganham (muito) menos não necessitarão de um pouco de reforço?

 

Ou a crise não chega para sensibilizar os mais abastados? 

 

Como entender isto? Como viver assim?

 

Já estamos em recessão.

publicado por Theosfera às 22:07

Naquele tempo, quando éramos crianças, recordo que o nosso sonho era termos idade, muita idade.

 

Motivo? Os idosos eram respeitados, admirados. Eram as referências do saber. Era-lhes reconhecida a autoridade da experiência.

 

Toda a gente lhes pedia conselhos. As suas recomendações eram tidas por preciosidades imperecíveis.

 

Ser idoso não era só estar mais perto da eternidade. Era, acima de tudo, estar mais próximo da verdade do tempo.

 

Quando se vê, hoje em dia, como se descartam as pessoas com idade, como as deixamos envelhecer na solidão, como nem damos conta da sua morte, não é preciso mais nada para aferirmos o estado da nossa sociedade.

 

Estamos em recessão.

 

Para quê negar as evidências?

publicado por Theosfera às 20:46

Não se acredita em ninguém, hoje em dia.

 

Acredita-se em tudo, hoje em dia.

 

A facilidade com que se acredita em tudo quanto é veiculado é directamente proporcional à facilidade com não se acredita em ninguém.

 

É uma contradição insanante.

 

Tornámo-nos demasiado crédulos em relação aos rumores e excessivamente cépticos em relação às pessoas.

 

Nem sequer reparamos que os boatos são veiculados por pessoas.

 

Que se passa, então?

 

Os rumores atingem pessoas. Muitas vezes, denigrem o seu carácter e fazem implodir a sua honra.

 

Ao darmos crédito ao rumor, estamos a dar crédito ao seu autor e a colaborar na desestruturação de muitas vidas.

 

Facilmente, fazemos o papel de juízes implacáveis e dizemos não acreditar em ninguém.

 

Só que, por incrível que pareça, estamos a acreditar em quem levanta os rumores.

 

Afinal, ao dizer que não acreditamos em ninguém, estamos a acreditar em alguém. Em alguém que fez com deixássemos de acreditar em alguém.

 

Tudo isto é deveras estranho e desolador.

 

É por isso que tem razão quem asseverou que os insultos dizem pouco de quem é insultado e dizem muito de quem insulta.

 

Há factos que, a serem verdadeiros, deviam ser tratados com decoro e pruridos de discreção.

 

Nota: Esta reflexão foi suscitada por algo que os meus olhos viram à hora de almoço na tv. Uma associação que acolhe crianças foi acusada por alguns dos seus funcionários. A informação pode ser dada. Com sobriedade. Bastava dizer algo do género: há uma acusação a decorrer relativamente a determinada colectividade. Parece-me que julgar é para os juízes. Não é para mais ninguém. Nem para jornalistas. Não sei onde está a verdade. Alguém terá de averiguar. Mas trazer tudo isto para a praça pública não resolve nada e pode complicar muito.

publicado por Theosfera às 15:08

Sporting e Benfica não são apenas dois clubes. São também dois perfis, dois retratos, duas formas distintas de lidar com a adversidade.

 

A imagem do país espelha-se nestes dois emblemas.

 

Há uns anos, falava-se das dívidas destas duas entidades.

 

O modo de resolver o problema foi diferente.

 

O Benfica optou pelo crescimento desportivo. Gerou receitas. Porventura, as dívidas existem, mas as perspectivas são animadoras. O risco foi compensado.

 

Já o Sporting enveredou pela via do cuidado. Não entrou em grandes gastos. O prioritário era ir diminuindo o défice.

 

Não houve investimento na equipa de futebol. O orçamento foi sendo reduzido, mas as dívidas mantêm-se. O receio acaba por penalizar.

 

Os resultados não surgem. Os adeptos não aparecem. Os gastos, ainda que menores, continuam a alimentar o défice.

 

Portugal precisava de uma solução à Benfica, de apostar no crescimento e de não ficar apenas com medo do défice. É que, daqui a pouco, já não há como sobrecarregar mais os contribuintes.

 

Só o estímulo ao crescimento pode superar as dificuldades.

 

O perigo é grande. Mas a experiência é feita disso mesmo: de perigo e de perícia.

 

Já só falta a perícia.

publicado por Theosfera às 11:42

Confesso alguma perplexidade por determinadas reacções ante a situação que se desenha no mundo árabe.

 

Parece haver quem esteja mais preocupado agora, com a instauração da liberdade, do que com o que se passava antes, sob o domínio da ditadura e da opressão.

 

Há quem esteja dominado por um determinismo pouco menos que assolapado. E não falta mesmo quem decrete que as coisas só podem piorar.

 

É certo que pior é sempre possível. E, a propósito, não fica mal citar esta história deliciosa da antiguidade: «Em Siracusa, no tempo em que toda a gente desejava a morte de Dionísio, uma certa velhinha constantemente rezava para que não lhe acontecesse mal e ele vivesse mais tempo do que ela. Quando o tirano soube disto, perguntou-lhe a razão. E ela respondeu: “Quando eu era rapariga nós tínhamos um tirano muito cruel e eu desejava a sua morte. Quando ele foi morto, sucedeu-lhe um que era um pouco mais cruel que ele. Eu também estava ansiosa por ver o fim do seu domínio, mas então tivemos um terceiro tirano, ainda mais cruel. Este és tu. Por isso, se tu fores levado, um pior vai suceder-te no teu lugar».

 

Muitas vezes, é assim. Só que há um limite. E, segundo o povo, tão verdade é «não há bem que nunca acabe» como «não há mal que sempre dure».

 

Estaline foi pior que Lenine. A ditadura soviética parecia invencível. Mas já terminou.

 

A desordem em Portugal deu origem a um regime autoritário que aparentava ser interminável. Mas também foi vencido.

 

Nenhum regime é eterno. O importante é que se caminhe no sentido da justiça e da paz.

 

Uma vez mais, verto o meu humilde apelo. Deixemos, primeiro, falar os factos. Depois, então, falemos nós.

publicado por Theosfera às 11:02

Quinta-feira, 17 de Fevereiro de 2011

É sabido que o politicamente correcto é uma tentação que menoriza a singularidade de cada um. Mas a pulsão pelo politicamente incorrecto também pode fazer esmorecer a apreensão da realidade.

 

Há quem goste de ser diferente. Mas, a montante e a jusante disso, encontra-se a necessidade de ser autêntico.

 

Dei comigo, hoje, a ler textos que se demarcam do consenso (praticamente) planetário em torno da revolução do Egipto. E, com um zelo inopinado, não falta mesmo quem aponte virtudes ao deposto ditador.

 

Antecipa-se já o fracasso inevitável do futuro do Egipto.

 

Andamos cheios de pressa. Porquê não esperar pelo decurso dos factos? Porquê julgar antes de apreender?

 

É certo que tudo pode correr mal. Mas porque não aguardar pelos acontecimentos? Será que o bem não pode ocorrer?

publicado por Theosfera às 15:43

Dizem que tudo na vida tem um preço.

 

O problema é que só alguns é que o pagam: as vítimas.

 

Os outros são os que as fazem pagar.

publicado por Theosfera às 14:08

Há um certo entorpecimento nos espíritos.

 

As coisas já são complicadas. Mas, como se isso não bastasse, há uma insistência obsessiva na sua amplificação.

 

As coisas, independetemente de serem positivas ou negativas, devem ser conhecidas. Mas daí até não se falar de mais nada vai uma grande distância.

 

Não sei se a realidade é o espelho da nossa alma ou se é a nossa alma o espelho da realidade.

 

Só sei que o panorama não é animador.

 

Há quem, ao falar ou ao escrever, vomite ódio e espirre violência.

 

Tropeçamos, a cada passo, com expressões de agressividade que até nos espantam.

 

Há tanto de bom que devia assomar à superfície.

 

Não poupemos no bem. A bondade é para ser usada. Sem constrangimento. 

publicado por Theosfera às 14:01

A vida está sempre a desmentir alguns estereótipos. Não quer dizer que estes não tenham pertinência, mas há sempre situações que escapam ao expectável.

 

Ninguém nega que a política precisa de pessoas habilitadas, mas o Brasil conseguiu tornar-se uma potência com um torneiro mecânico à sua frente. A propósito, veja-se este vídeo.

 

 

 

Aliás, pelos padrões actuais, as pessoas que mais interferiram na História da humanidade dificilmente teriam acesso à Universidade: Sócrates, Buda, Confúcio e Jesus.

 

Poucos contestam a necessidade de governos fortes, estáveis. Pois a Bélgica está quase há um ano sem governo e apresenta indicadores de progresso invejáveis.

 

É claro que existe um governo em funções, mas com os constrangimentos inerentes. O povo nem parece muito preocupado. Há iniciativas um pouco histriónicas para denunciar o facto que mais parecem celebrações bem-humoradas. A «revolução das batatas fritas» é a mais recente realização.

 

Aliás, a Itália tornou-se uma potência económica com governos que duravam escassos meses. Curiosamente, a estabilidade foi conseguida sobretudo por obra de uma personalidade excêntrica como Berlusconi, um sobrevivente que enfrenta todos os cânones.

 

Cada vez me persuado mais de que a vida está sempre a desafiar a lógica. Mas nem sempre as excepções se concretizam. Por isso é que são excepções.

publicado por Theosfera às 10:14

Quarta-feira, 16 de Fevereiro de 2011

Por isso, não desistamos nunca!

publicado por Theosfera às 22:57

Dizia o grande mestre Manuel Gonçalves da Costa que a história do mundo se podia estudar à luz das fomes.

 

Sempre me impressiou esta acepção, que recebe, aliás, acrescidos estímulos de acuidade.

 

O célebre livro Geografia da Fome, de Josué de Castro, também alertara para a preponderância deste factor. 

 

Dados recentes atestam que a subida exponencial do preço dos alimentos está na base da sublevação que atravessa o mundo árabe.

 

Onde não há pão, todos ralham. E só o povo tem razão.

publicado por Theosfera às 11:22

Terça-feira, 15 de Fevereiro de 2011

1. Há imagens da Praça Tahrir que ficarão, para sempre, retidas na nossa memória.

 

Trata-se de imagens que nos colheram de surpresa e que, por isso, dispensam legendas e nos isentam de comentários. 

 

Quem imaginaria, no início do ano, que muçulmanos aparecessem de mãos dadas com cristãos? Que o Crescente fosse visto ao lado da Cruz?

 

Afinal, nem sempre é o esperado que ocorre. O inesperado também nos pode visitar.

 

A história não é uma obra concluída nem um circuito fechado. Como bem lembrou Xavier Zubiri, ela é um sistema aberto, um sistema aberto de possibilidades.

 

Umas vezes, funciona como obturação. Outras vezes, como é o caso do Egipto, aparece como iluminação.

 

O século XXI, que começara a 11 de Setembro de 2001 sob a égide da decadência, recomeçou a 11 de Fevereiro de 2011 sob os auspícios da esperança.

 

Até agora, a revolução do Egipto não esticou para os extremos. Foi desencadeada pela palavra e decidida pela persistência.

 

Para já, está a conseguir, coisa não desprezível, dois objectivos nada fáceis: derrubar uma ditadura e afastar o radicalismo.

 

 

2. Esta proximidade entre cristãos e muçulmanos parece desmentir todo um passado recente. Faz reviver, porém, tempos antigos: os tempos do começo.

 

É bom que se saiba que, nos inícios, moderação e respeito eram o clima reinante entre os membros destas duas religiões.

 

Ao conquistar Jerusalém, Omar garantiu segurança aos cristãos bem como às suas propriedades, igrejas e crucifixos.

 

Em meados do século VII, um patriarca oriental reconhecia que os muçulmanos «não atacavam a fé cristã; antes, pelo contrário, favoreciam a nossa religião, honravam os nossos padres e concediam benefícios a igrejas e mosteiros».

 

No século IX, Teodósio anotava a subsistência da mesma atmosfera: «Os muçulmanos têm uma grande boa vontade para connosco. Deixam-nos construir as nossas igrejas e observar sem dificuldades os nossos costumes».

 

Infelizmente, tudo se alterou com as cruzadas. Sob o pretexto de recuperar os Lugares Santos, foram cometidas atrocidades sem fim.

 

Rezam as crónicas que, em Julho de 1099, os cavalos escorregavam em poças de sangue. O ar estava infectado com o cheiro de corpos em decomposição.

 

David Hume classificou as cruzadas como «o maior sinal da loucura humana que alguma vez acontecera».

 

Isto deixou marcas de parte a parte. De resto, nenhuma religião tem o exclusivo da violência nem o monopólio do discurso da paz.

 

 

3. É por isso que ainda será cedo decretar que o 11 de Setembro está extinto. A violência é sempre uma ameaça que paira.

 

Mas creio ser possível afirmar que o 11 de Fevereiro constitui o nascimento de uma nova era.

 

É notório que o mundo não estava preparado para lidar com o impacto do 11 de Setembro. Estará habilitado para encarar o que se abriu a 11 de Fevereiro?

 

Daqui a dez anos, que balanço será feito? Irá o 11 de Fevereiro superar, de vez, o 11 de Setembro?

A força da persistência terá capacidade para vencer a persistência da força?

 

Estejamos atentos. Mas palpita-me que o Egipto está a posicionar-se como um precioso laboratório do que pode ser o futuro próximo.

 

Tentemos calar os preconceitos. Não consintamos que eles cativem a realidade.

 

Deixemos, primeiro, falar os factos. Depois, então, falemos nós.

publicado por Theosfera às 21:00

Fez, no seu quarto, um tríptico na parede, com um presépio, uma cruz e uma grande imagem de Cristo ressuscitado.

 

Todas as noites, passa bastante tempo só a olhar para aquele quadro, pedindo a simplicidade do presépio, a coragem da cruz e a alegria da ressurreição.

 

Ali, sente-se bem. Só que a realidade, no dia seguinte, é tão diferente, tão dura!...

 

publicado por Theosfera às 11:48

A situação é complexa, mas os dados são claros.

 

Há razões para a preocupação, mas não há motivos para espanto.

 

Com os impostos a subir e os salários a descer, que seria de esperar?

 

Hoje, sabe-se que há pessoas a cortar nos medicamentos e outras compram-nos a prestações.

 

Isto fere. Isto dói. Até quando?

 

Temos de resolver o problema do Estado, certo. Mas se com a (putativa) resolução desse problema, acabamos por agravar os problemas das pessoas, é sinal de que não percebemos o essencial.

 

O Estado é para as pessoas ou as pessoas são para o Estado?

 

Muitos não sabem como superar o impasse. Mas os que pensam que sabem também não têm ajudado a vencê-lo.

 

Melhores dias virão, seguramente.

 

Mas a geração sem remuneração, de que fala a célebre música dos Deolinda, não é apenas a geração dos trinta anos. É a também a geração dos cinquenta, dos sessenta, dos setenta, dos oitenta e noventa anos.

 

São muitos os idosos, que tanto trabalharam, e que, agora, nem para medicamentos têm haveres. 

publicado por Theosfera às 10:40

A vontade mantém-se optimista, mas, por mais que tente, a inteligência continua pessimista.

 

Aliás, já Arthur Schopenhauer aludia ao optimismo da vontade e ao pessimismo da inteligência.

 

Estamos, todos, empenhados na construção de um mundo melhor. E deste desígnio não é lícito fugir.

 

Só que os factos, com a sua teimosia, não parecem ajudar.

 

As coisas não são respeitadas. A vida não é defendida.

 

Os assaltos multiplicam-se. Os atentados aumentam.

 

A comunicação social acordou, agora, para uma realidade que já existe há muito e que tem contado com a nossa comatosa indiferença.

 

Há idosos sozinhos nas suas casas.

 

Por lá (sobre)vivem. Durante meses. Durante anos.

 

Por lá morrem e permanecem mortos. Durante meses. Durante anos.

 

Este mundo não me agrada nada.

publicado por Theosfera às 09:44

A China é já a segunda economia mundial.

 

Eis um facto e uma ironia.

 

É que a China que se impõe na economia é uma China que mimetiza o seu principal rival, os Estados Unidos da América.

 

A China está a enviar milhares e milhares de estudantes para as universidades americanas.

 

A China que vence não é uma China que se distingue; é uma China que imita.

 

As ironias que a história tece.

publicado por Theosfera às 09:39

Segunda-feira, 14 de Fevereiro de 2011

A Alemanha e a Inglaterra (secundadas pela França) desataram a increpar o multiculturalismo. Como se o problema chegasse de fora.

 

Não. O problema não está nas culturas diferentes. A convivência já era problemática há muito nos povos, nas famílias.

 

Não se trata, pois, da dificuldade de coexistência entre culturas. A coexistência está difícil entre pessoas.

 

É uma opção preguiçosa estigmatizar as outras culturas. O punctum saliens de toda esta questão encontra-se no factor humano. 

 

É claro que situações novas desencadeiam desafios novos. Mas não é pela exclusão que os problemas se resolvem. É sempre pelo acolhimento, pela integração.

 

O mundo tornou-se uma aldeia. Todos nos tornámos vizinhos. É importante que não se formem guetos.

publicado por Theosfera às 22:58

Quem olha para o Egipto pressente uma certa revivescência dos tempos clássicos.

 

Tudo se discute na praça, à guisa das antigas ágora gregas e dos célebres fora romanos.

 

O exército tenta desmobilizar, mas as pessoas voltam e as palavras soltam-se.

 

A Praça Tahrir é um marco, um símbolo. O marco de uma espera. O símbolo de uma esperança.

publicado por Theosfera às 22:54

O poder quer o Egipto à imagem do Irão. O povo deseja o Irão à imagem do Egipto.

 

As ruas de Teerão também se vão enchendo e, diante do presidente iraniano, o chefe de Estado da Turquia disse que as aspirações populares devem ser atendidas.

 

Mas dá para ver que a evolução da situação não vai ser igual. Os escolhos são maiores. As imagens deixam antever uma forte oposição das forças de segurança.

 

O papel das forças armadas é sempre decisivo. Na Tunísia e no Egipto, colocaram-se ao lado do povo. No Irão, dá para ver que, pelo menos para já, será diferente. E muito mais difícil.

 

Uma coisa é certa. O mundo árabe está a despertar. A mobilizar-se.

publicado por Theosfera às 22:46

É o dia litúrgico de S. Cirilo e S. Metódio, co-padroeiros da Europa.

 

Desempenharam um papel extraordinário na difusão do Evangelho e na configuração da cultura no segmento oriental da Europa. Inculturaram o Evangelho e evangelizaram a cultura.

 

Deram tudo: o talento, o tempo, a vida, o ser. Foi possível há séculos. Será impossível hoje?

publicado por Theosfera às 08:59

Habitualmente, prestamos pouca atenção à oração (chamada colecta) que se recita antes da Liturgia da Palavra.

 

Mas ela é muito importante e bastante significativa. Ambienta-nos à celebração, mas impulsiona-nos igualmente à vivência. A uma vivência em conformidade com a celebração.

 

Na oração colecta da Missa deste Domingo, reconhecia-se que «Deus está presente nos corações rectos e sinceros».

 

A conduta é fundamental. Não são os discursos que convencem. Ou, então, convencem quando estão respaldados por uma conduta limpa, sincera.

 

Sincero quer dizer (etimologicamente) sem cera, ou seja, sem artifícios. A autenticidade é decisiva.

 

As pessoas que se afastam da Igreja não o fazem por qualquer divergência doutrinal. Afastam-se sobretudo por causa da incoerêncoa testemunhal.

 

Jesus, hoje, era causticante no Evangelho. Advertia-nos para a tentação da posse, para o perigo de querer agradar e repetia: Felizes os pobres, os que choram, os que são perseguidos e caluniados por Sua causa.

 

Qual é a nossa causa?

 

Voltando à oração colecta de hoje, ela termina com um pedido: que vivamos de tal modo que possamos ser Sua morada, morada de Deus.

 

Deus está na rectidão, na sinceridade. Definitivamente!

publicado por Theosfera às 08:42

Domingo, 13 de Fevereiro de 2011

Ainda a viver a euforia da libertação, o Egipto está a passar pelo risco de um novo cativeiro. De um duplo cativeiro, aliás.

 

A revolução egípcia, com efeito, está a ser cativada, na hora que passa, pela questão do poder e pela questão da interpretação.

 

Tudo previsível, diga-se.

 

Afastado Mubarak, o país e o mundo querem saber quem manda. Devia ser quem serve, mas o poder como serviço ainda está longe em toda a parte.

 

Já houve quem notasse que, nesta epopeia, ainda não emergiu um líder incontestado.

 

ElBaradei tem sido, argutamente, modesto e a Irmandade Muçulmana procura (deliberadamente?) exorcizar qualquer protagonismo liderante.

 

Isto até pode ser positivo. É sinal de que a situação não está resolvida e de que o futuro permanece em aberto.

 

A transição será um teste fundamental. Há alguma impaciência. O presidente saiu, mas a estrutura permanece.

 

De certa forma, é compreensível. Mas há quem anele por mais celeridade. A constituição foi suspensa, o parlamento foi dissolvido e o processo eleitoral parece garantido.

 

Hoje, houve indicadores preocupantes com a troca de tiros entre o exército e a polícia. Esperamos que não haja continuidade e que a normalidade seja restabelecida.

 

Alguém tem de assegurar a transição e, em princípio, o exército parece gozar de boa reputação entre o povo.

 

Mas não é só do poder que se querem apropriar. É também da interpretação dos factos.

 

As reacções de regozijo envolvem sectores ideologicamente contrários. Tão contentes parecem estar os Estados Unidos como o Irão.

 

Os acontecimentos aparentam estar a ser capturados por alguns preconceitos, esquecendo que algo novo terá emergido.

 

Não falta quem esteja à espera (uns com entusiasmo, outros com receio) de uma revolução islâmica do género da do Irão de 1979.

 

Sendo um país onde o Islão é dominante, muitos estavam à espera de um maior radicalismo.

 

É preciso dizer que o Islão está longe de ser um fenómeno uniforme e que, na sua génese, propugna a sã convivência.

 

Basta ler os textos e olhar para vários períodos do passado. A forma, por exemplo, como respeitaram os cristãos ao chegarem e Jerusalém é elucidativa.

 

Tudo isto só mostra que a história não é um sistema fechado. Ela está em aberto. E nem sempre as surpresas são más.

 

Tentemos calar os preconceitos. Não consintamos que eles capturem a realidade.

 

Deixemos falar os factos. Depois, falemos nós.

 

 

publicado por Theosfera às 23:55

Está visto que Portugal depende muito da Alemanha, o motor da Europa.

 

Foi assim já, aliás, quando entrámos na então CEE. E assim continua a ser hoje.

 

Há, porém, uma sensação diferente. Outrora, prevalecia a sensação de parceria. Actualmente, tende a predominar a sensação de (quase) submissão.

 

Portugal estará diferente, embora se mantenha dependente. Mas a Alemanha também não é igual, ainda que permaneça liderante.

 

Com Helmut Kohl, tínhamos uma Alemanha europeia.

 

Angela Merkel parece querer modelar uma Europa alemã.

 

Há coisas do passado que não ficavam nada mal no presente...

publicado por Theosfera às 23:53

... não olhes apenas para as alturas. Deus não está só no alto.

 

Olha também para baixo. Olha para o lado. Olha para o fundo.

 

Entra na profundidade do teu ser. E está atento à profundidade do teu semelhante.

 

Deus está aí. Em forma de paz.

publicado por Theosfera às 22:48

Fica, por vezes, no ar a impressão de que a humildade é um ornamento retórico que fica sempre bem em qualquer discurso. E fica. Mas fica muito melhor na vida.

 

As pessoas têm uma ânsia muito grande (e muito legítima) de proximidade.

 

As pessoas querem ver sinais de humildade.

 

É que, como lembrava Paulo VI, o mundo acredita muito mais em testemunhas do que em mestres.

 

Testemunhas da humildade são, cada vez mais, necessárias.

 

É bom falar da humildade. É fundamental ver a humildade de que (tanto e tão bem) se fala.

publicado por Theosfera às 19:12

Há quem fique preocupado com a discordância, quando o mais preocupante é o afastamento.

 

A discordância dentro da Igreja não é, em si mesma, um problema. Até pode ser sinal de vitalidade. Mas há uma tremenda dificuldade, dentro da Igreja, em conviver com a discordância, com a sã pluralidade.

 

Problema grave é o afastamento. É o afastamento em relação a Jesus. E este afastamento pode envolver a própria Igreja, designadamente as suas estruturas.

 

Habitualmente, olhamos para as palavras, para os conceitos. Era bom que olhássemos também (e sobretudo) para os sinais, para o estilo de vida.

 

Confesso que despertou a minha atenção a perplexidade do poeta José Miguel Silva diante de uma certa iconografia: «Vês (nas igrejas) os santos vestidos como príncipes, quando toda a mensagem cristã defende o oposto».

 

Pois é. Jesus foi pobre. Convida a um estilo de vida pautado pela pobreza e sobriedade.

 

Muitas vezes, andamos empenhados em apontar a Sua doutrina. Esta é importante. Mas o decisivo é a Sua conduta. É viver como Ele viveu.

 

Não critico ninguém. Mas há coisas (como esta) que ferem um pouco.

 

É certo que Jesus está em toda a parte. Mas não era propriamente em palácios que costumava ser visto.

 

Não propugno um miserabilismo eclesiástico. Mas penso nas palavras de Paulo para quem Jesus nos enriqueceu com a Sua...pobreza!

 

Entre a ostentação e Jesus o casamento não é feliz, a relação não é estreita.

 

Se há dinheiro para investimentos destes (e 2 milhões e 400 mil euros é, sem dúvida, muito dinheiro), quem nega que seria mais bem aplicado na coroa da missão que é alimentar quem tem fome?

 

Porventura, isso até será feito. Mas poderia ser intensificado. E, além dos actos, os sinais são eloquentes.

 

A Igreja é chamada não apenas a estar junto dos pobres, mas também a fazer-se pobre.

 

E se, para um cristão, Jesus é a lei, então há qualquer coisa (muita coisa) que é preciso mudar. Com serenidade. Mas também com alguma urgência.

publicado por Theosfera às 18:44

As notícias têm este efeito multiplicador.

 

O caso da senhora que esteve morta nove anos destapou a sensibilidade para este tipo de ocorrências.

 

Mas dois idosos foram descobertos sem vida.

 

Há cerca de 390 mil idosos sós. No nosso país. Na nossa aldeia. No nosso mundo.

 

Eis uma prioridade para o Estado. Eis um imperativo para nós.

publicado por Theosfera às 18:42

Jesus não é a destruição do já realizado, mas também não é a mera continuidade do já feito.

 

Ele é a renovação perene e a novidade total.

 

O Sermão da Montanha apresenta-nos várias antíteses em que ressalta, com supina clareza, a superação da Lei. Mesmo da Lei que se presumia de inspiração divina como era o caso da Torah.

 

É por isso que a fidelidade a Jesus não é fossilizável. Em Jesus ninguém estagna.

 

A Sua presença acompanha-nos em cada momento.

 

A história, numa perspectiva jesuânica e numa ambiência crística, não é apenas uma ciência. É, acima de tudo, uma construção.

 

A preocupação do cristão não pode ser, pois, manter a ordem instituída. O imperativo do cristão tem de ser sempre transformar.

 

Há um certo conservadorismo que não se coaduna com o espírito de Jesus.

 

Se Jesus fosse um conservador, os fariseus deixavam-No seguramente tranquilo.

 

É por tudo isto que Jesus não é somente a resposta às nossas perguntas. Ele é, sobretudo, a pergunta que desinstala as nossas respostas.

 

Jesus não está no previsível. Ele pulveriza os nossos arquétipos.

 

Ele é o critério para nós. Nenhum de nós é critério para Ele.

 

As Igrejas procuram ser o eco de Jesus? Ou resignam-se a ser a ressonância da ordem vigente?

publicado por Theosfera às 12:50

Sábado, 12 de Fevereiro de 2011

Há uma mescla de espanto e de incerteza no olhar do mundo sobre o Egipto.

 

A incerteza relaciona-se com o futuro mais próximo.

 

O olhar dirige-se para o Egipto, mas o pensamento ainda está condicionado pelo Irão.

 

Para já, da Irmandade Muçulmana as palavras são encorajadoras.

 

O que dizem resume-se a isto: queremos que a lei islâmica seja respeitada, mas não defendemos que o Egipto seja uma república islâmica.

 

Eis uma laicidade positiva e, acima de tudo, uma janela de esperança.

publicado por Theosfera às 13:17

Não houve atentados. A revolução do Egipto foi feita pela palavra, pela voz, pela persistência. E, coisa não desprezível, conseguiu dois objectivos nada fáceis: derrubar uma ditadura e afastar o radicalismo.

 

Parece-me ainda cedo para afirmar que o 11 de Setembro está extinto.

 

Mas creio ser possível reconhecer que o 11 de Fevereiro constitui o nascimento de uma nova era.

 

O século que começara a 11 de Setembro de 2001 recomeçou a 11 de Fevereiro de 2011.

 

A onda de surpresa é semelhante.

 

Poucos achariam que pudesse haver um atentado como o do 11 de Setembro. E praticamente ninguém pensava que pudesse existir uma revolução como a de 11 de Fevereiro.

 

É, aliás, curioso notar que o Egipto está no epicentro dos dois momentos. Como é sabido, o número dois da Al-Qaeda, e tido como cérebro da operação do 11 de Setembro, era egípcio.

 

A história não é o cumprimento de um guião. Ela é, como bem notou Zubiri, um sistema aberto de possibilidades. Umas vezes, obscurece a nossa alma. Outra vezes, ilumina-nos com a esperança.

 

É notório que o mundo não estava preparado para lidar com o impacto do 11 de Setembro. Estará habilitado para encarar o que se abriu a 11 de Fevereiro?

 

Para já, as vozes fundamentalistas estão caladas. Tudo indica que o Egipto vai enveredar pela democracia. E há sinais de que o mundo árabe poderá seguir o mesmo caminho.

 

Houve mortes em tudo isto, mas, ao contrário do que estávamos habituados, não se ouviram bombas nem se cometeram atentados.

 

Daqui a dez anos, que balanço será feito? Irá o 11 de Fevereiro superar, de vez, o 11 de Setembro?

 

A força da persistência tem capacidade para vencer a persistência da força.

 

O Egipto está a colocar-se como um precioso laboratório do que pode ser o futuro próximo.

publicado por Theosfera às 12:53

Há sempre um momento em que as pessoas se cansam de ser súbditos e querem passar a ser cidadãos.

 

Já agora, mubarak significa parabéns.

 

Mubarak deixou o Egipto.

 

O Egipto está de mubarak.

 

publicado por Theosfera às 12:06

Não esqueça esta data.

 

Uma nova era começou?

publicado por Theosfera às 11:06

Sexta-feira, 11 de Fevereiro de 2011

Está confirmado. Mubarak afastou-se. Não de motu proprio, mas pela persistência do povo. 

 

É grande o contentamento no Egipto. É enorme o alívio no mundo livre.

 

A celebração é (mais que) justificada. A festa é (mais que) merecida.

 

Mas este não é o fim. Talvez seja o fim do princípio.

 

Para já, o poder ainda está nas mãos do exército. O centro da decisão, porém, encontra-se no povo.

 

As imagens são parecidas com as que nós vivemos em Portugal a 25 de Abril de 1974.

 

Mas subsiste uma pequena diferença. Aqui, a revolução foi feita pelas forças armadas. O povo saiu quando a revolução estava praticamente concluída. No Egipto, foi o povo que fez a revolução, que cercou o regime, que não deu margem para alternativas quando se dispôs a tudo, até a morrer.

 

É uma lição para o mundo. Para já, não se viram bandeiras de Israel ou dos Estados Unidos queimadas.

 

Chegados ao fim do princípio, os egípcios e o mundo em geral estarão atentos aos próximos passos.

 

Há duas áreas que serão decisivas: uma interna e outra externa.

 

Internamente, espera-se que a situação avance para uma democracia. Externamente, aguarda-se que a relação com Israel se mantenha estável.

 

O que se passar no Médio Oriente é vital para a humanidade.

 

Está a fazer-se história no Egipto. Este é um incentivo para todos os que acreditam na liberdade e nos direitos humanos.

 

Como dizia Zubiri, a história é um sistema aberto de possibilidades. Umas vezes, funciona como obturação. Outras vezes, como é o caso, aparece como iluminação.

 

Não foi a violência que fez cair o regime. Foi a persistência.

 

Mubarak pensou, talvez, que a sua intervenção de ontem, onde reafirmara a vontade de não se recandidatar, iria dispersar a multidão concentrada na (já famosa) Praça Tahir. Equivocou-se. Nem o exército o terá apoiado. 

 

Finalmente, a força da razão impôs-se sobre a razão da força.

 

Hoje é um dia feliz.

publicado por Theosfera às 18:49

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